Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Acreditar no céu. – Reflexão de José Antonio Pagola. Muito boa!


“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados!". (Mt 5, 1-12)

Festa de Todos os Santos.

Hoje trago para o blo Indagações-Zapytania uma excelente reflexão, que tem como pano de fundo o texto bíblico Mt 5, 1-12  (As Bem-Aventuranças). É de autoria do padre e teólogo espanhol José Antonio Pagola.
O texto foi publicado na no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Muito atual. Vale a pena ler e refletir!
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IHU - Notícias
Sexta, 30 de outubro de 2015

Acreditar no céu

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus segundo Mateus 5, 1-12 que corresponde a Solenidade de Todos os Santos, ciclo B do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto.

Eis o texto

Nesta festa cristã de «Todos os Santos», quero dizer como entendo e trato de viver alguns aspectos da minha fé na vida eterna. Quem conhece e segue Jesus Cristo, entender-me-á.

Acreditar no céu é para mim resistir-me a aceitar que a vida de todos e de cada um de nós é apenas um pequeno parêntesis entre dois imensos vazios. Apoiando-me em Jesus, intuio, pressinto, desejo e creio que Deus está a conduzir para a sua verdadeira plenitude o desejo de vida, de justiça e de paz que se encerra na criação e no coração da humanidade.

Acreditar no céu é para mim rebelar-me com todas as minhas forças a que essa imensa maioria de homens, mulheres e crianças, que só conheceram nesta vida miséria, fome, humilhação e sofrimentos, fique enterrada para sempre no esquecimento. Confiando em Jesus, creio numa vida onde já não haverá pobreza nem dor, ninguém estará triste, ninguém terá que chorar. Por fim poderei ver os que vêm nas barcas chegarem à sua verdadeira pátria.

Acreditar no céu é para mim aproximar-me com esperança a tantas pessoas sem saúde, doentes crônicos, inválidos físicos e psíquicos, pessoas afundadas na depressão e na angústia, cansadas de viver e de lutar. Seguindo Jesus, creio que um dia conhecerão o que é viver com paz e saúde total. Escutarão as palavras do Pai: Entra para sempre no gozo do teu Senhor.

Não me resigno a que Deus seja para sempre um «Deus oculto», de quem não podemos conhecer jamais o Seu olhar, a Sua ternura e os Seus abraços. Não posso imaginar não me encontrar nunca com Jesus. Não me resigno a que tantos esforços por um mundo mais humano e ditoso se percam no vazio. Quero que um dia os últimos sejam os primeiros e que as prostitutas nos precedam. Quero conhecer aos verdadeiros santos de todas as religiões e de todos os ateísmos, os que viveram amando no anonimato e sem esperar nada.

Um dia poderemos escutar estas incríveis palavras que o Apocalipse coloca na boca de Deus: «Ao que tem sede, Eu lhe darei de beber gratuitamente da fonte da vida». Grátis! Sem o merecer. Assim saciará Deus a sede de vida que há em nós.




quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Na era da Discriminação Digital. – Artigo de Rafael Evangelista. É bom saber!


O artigo Na era da Discriminação Digital, de Rafael Evangelista*, é interessante e certamente pode servir de ajuda a quem quiser conhecer e/ou entender melhor o que existe por trás do uso da internet e da participação de redes sociais - fenômeno que hoje cada vez mais está incorporado na vida dos homens e das mulheres no mundo contemporâneo. Trata-se da questão da possível vigilância pessoal, que abre caminho até para a discriminação. Isso mesmo: mais uma premeditada e refinada forma de praticar a discriminação.

Podemos indagar: Como isso acontece? Será que é real? De que se trata, na verdade?

O texto foi publicado no Portal OUTRASPALAVRAS no mês de junho de 2015.
Para contribuir um pouco na sua divulgação, trago-o para o blog Indagações-Zapytania.

Vale a pena ler!


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Como sistema financeiro usa Facebook e outras redes para negar ou encarecer empréstimos a quem tem amigos pobres, usa remédios psiquiátricos ou comete outros “desvios”.


Artigo
Na era de Discriminação Digital

03/06/2015

Por Rafael Evangelista

Depois das revelações de Edward Snowden, ficou fácil demonstrar como as redes sociais e os serviços remotos na web (como os webmails e os aplicativos de escritório) podem ser utilizados como instrumentos de vigilância pessoal. Mas exemplificar os usos econômicos dessa máquina de vigilância é tarefa mais ingrata. Os dados pessoais e as informações produzidas pelos usuários em suas respectivas interações são usados para alimentar a força econômica das empresas, numa relação que não é transparente e que contém injustiças ainda difíceis de serem concretamente mapeadas, seja pelos movimentos sociais ou pelos pesquisadores da área.


A crescente e promíscua relação entre as empresas de finanças e as grandes companhias de tecnologia de informação e informática do Vale do Silício, na Califórnia, ajudam a deixar essa exploração mais clara. Estão surgindo com força empresas embrionárias (startups) que usam informações dos usuários obtidas nas redes sociais para elaborarem um número, um índice, que determinaria a capacidade de pagamento de um possível tomador de empréstimo. Com isso, as empresas teriam mais segurança sobre quem poderia dar calote e, em tese, poderiam oferecer taxas de juros menores para aqueles que fossem bem avaliados. Na prática, o que vem acontecendo são práticas discriminatórias justamente contra aqueles que mais precisam, os grupos sociais historicamente mais fragilizados: imigrantes, negros, mães solteiras, moradores de bairros pobres etc.

Uma reportagem recente da revista estadunidense The Nation entrevista vítimas do chamada “digital redlining”. O termo  redlining refere-se à linha vermelha imaginária feita pelos bancos em determinados bairros pobres, para marcar populações dentro de uma área geográfica e para as quais são praticadas taxas de juros mais altas. Essa exclusão e discriminação agora foi importada para o mundo digital, sendo desenhada não mais sobre um mapa, mas por um robô que integra dados importados, entre outros, de redes sociais. Este reúne a grande massa de dados de redes como o Facebook para determinar juros mais altos para certas pessoas.


Para o pobre, que mais precisa do empréstimo, não se trata de simplesmente estar fora das redes. Essa opção pode ser ainda pior, pois o sistema acaba entendendo a falta de dados como algo suspeito e aplicando as maiores tarifas ou negando transações.

Projetos como o Internet.org, voltados às populações mais pobres, colocam ainda mais pressão sobre as pessoas, forçando sua entrada na rede social e o compartilhamento de informações com as companhias. O Internet.org fornece acesso à internet gratuito, porém limitado a um conjunto de sites, sendo o principal deles o Facebook.

Uma das empresas parceiras do projeto é a Lenddo. O usuário que nela se cadastra e baixa o aplicativo no celular tem acesso a compras online, empréstimos e serviços de colocação profissional. Em troca, permite que suas atividades sejam monitoradas — ações como a interação ou amizade com certas pessoas — e que a partir desse monitoramento seja produzido um LenddoScore, um número que reflete o quanto o usuário é “confiável”.  A Lenddo já é oficialmente usada por financeiras das Filipinas para produzir perfis de pessoas que estão fora do sistema bancário. Também dá informações para que telefônicas neguem o acesso a planos de celular pós pagos e fornece informações a empregadores em busca de referências para possíveis trabalhadores.

As populações dos países periféricos, onde o Internet.org já atua, são particularmente vulneráveis, pois o sistema jurídico dá poucas garantias aos cidadãos quanto a abusos e discriminações. Quênia, Gana, Colômbia, Índia, Bangladesh, além das Filipinas, já estão nessa lista. Mas mesmos nos países ricos a complexidade técnica desses instrumentos de predição usando dados de navegação na internet torna difícil comprovar que, por exemplo, o fato de alguém buscar remédios psiquiátricos foi o fator preponderante para ter um financiamento negado.

A Lenddo é apenas um exemplo. Outras empresas de natureza semelhante já atuam, inclusive nos países ricos. Em um dos casos citados pela Nation, uma estudante em dívida com empréstimos educacionais torna-se alvo de crédito predatório a partir de dados coletados em sua atividade online.

A internet, ao mesmo tempo que ofereceu grandes oportunidades para a expansão da criatividade e da liberdade de comunicação, tornou-se um lugar propício para novas estratégias de revitalização do capitalismo, agora baseado na exploração informacional. Vamos passando de um sistema em que o mau pagador era punido para uma estrutura em que o castigo vem antes, pelo cálculo probabilístico do delito futuro. A desigualdade de forças, a assimetria no controle da infra-estrutura tecnológica, o grande poder econômico derivado do controle de grandes bancos de dados das populações são um terreno fértil para o aumento da exclusão e do controle.

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* Rafael Evangelista Doutor em antropologia social e professor do Mestrado em Divulgação Científica e Cultural do IEL-Unicamp.






Fonte: 
OutrasPalavras



sábado, 24 de outubro de 2015

Uzdrowić się ze ślepoty. – Trafna refleksja. Autor: José Antonio Pagola.


"Zatrzymawszy się tedy Jezus kazał przywołać go do siebie. I wołali niewidomego mówiąc: Bądź dobrej myśli, chodź, woła cię. A on, zrzuciwszy swój płaszcz, zerwał się i przybiegł do Jezusa.
Powiedział do niego Jezus: Co chcesz, żebym ci uczynił? A niewidomy odrzekł: Nauczycielu, żebym przejrzał.  Wtedy rzekł mu Jezus: Idź, uzdrowiła cię twoja wiara. I zaraz przejrzał, i ruszył za Nim w drogę."  (Mk 10, 49-52).

Poniżej,  krótka ale bardzo aktualna refleksja,  której tłem jest biblijny tekst Mk 10,  46-52 (Jezus uzdrawia niewidomego Bartymeusza).
Jej autorem jest hiszpański teolog José Antonio Pagola.
Tekst został opublikowany na internetowej stronie Instytutu Unisinos Humanitas (IHU).

Warto przeczytać!
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(Tłumaczenie z języka portugalskiego)


Refleksja

Co robić, kiedy wiara już wygasa w  naszych sercach? Jesteśmy w stanie zareagować?  Jak wyjść  z obojętności?  Ewangelista Marek opisuje uzdrowienie niewidomego Bartymeusza  właśnie w celu zachęcenia  swoich czytelników do działania, które może przemienić ich życie.

Nie trudno nam rozpoznać sie, patrząc na  figurę Bartymeusza. Czasami żyjemy jak "niewidomi", bez oczu, by móc patrzeć na życie  tak jak Jezus. "Siedzący",  zainstalowani w konwencjonalnej religii, bez sił, by iść Jego śladami. Zagubieni, "na uboczu drogi", która wiedzie do Jezusa, i nie mając Go jako przewodnika  naszych chrześcijańskich wspólnot.

Co możemy zrobić?  Pomimo swej ślepoty, Bartymeusz "uprzytamnia sobie", że Jezus może wejść w jego życie. Nie może przegapić okazji i zaczyna krzyczeć raz po raz: ". Zmiłuj się nade mną".  Początek zawsze jest taki:  otworzyć się na jakąkolwiek możliwość lub doświadczenie, które może uzdrowić nasze życie.

Niewidomy nie umie recytować modlitw wypracowanych  przez innych. Umie tylko krzyczeć i prosić o współczucie, ponieważ czuje się źle. Ten pokorny i szczery krzyk, wychodzący z głębi serca, może być dla nas początkiem nowego życia. Jezus nie przejdzie obok obojetny.

Niewidomy nadal siedzi na ziemi, z dala od Jezusa, ale uważnie słucha tego, co mówią Jego posłańcy: "Odwagi, chodź, bo Jezus cię woła".

Najpierw, zapala się w nim mały płomyk  nadzieji. Następnie, słysząc skierowane do niego wezwanie, żeby  się podniósł,  reaguje.  Wreszcie,  już nie czuje się samotny: Jezus go woła. Ten fakt wszystko zmienia.

Bartymeusz daje trzy kroki, które zmienią jego życie. "Porzuca płaszcz", gdyż on utrudnia mu spotkanie się z Jezusem. Wkrótce jednak, pomimo że jeszcze porusza się w ciemności, "podrywa się" zdecydowanie.  W ten sposób "przybiega" do Jezusa. To jest to, czego potrzebujemy,  czego potrzebuje wielu z nas:  uwolnić się od łańcuchów, które krępują naszą wiarę;  podjąć wreszcie decyzję bez odkładania jej na później; i stanąć przed Jezusem z prostym i nowym zaufaniem.

Kiedy Jezus pyta go, czego on od Niego chce, niewidomy nie ma wątpliwości. Wie bardzo dobrze, czego potrzebuje: "Nauczycielu,  żebym przejrzał." To jest najbardziej istotne. Kiedy zaczna się widzieć rzeczy w nowy sposób, życie się przemienia. 

Kiedy wspólnotę chrześcijańską ogarnia światło Jezusa, wtedy ma  miejsce nawrócenie.



Źródło: IHU - Notícias


sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Curar-nos da cegueira. – Reflexão de José Antonio Pagola. Excelente!



«Jesus parou e disse: "Chamai-o" Chamaram o cego, dizendo-lhe: "Coragem! Levanta-te, ele te chama." Lançando fora a capa, o cego ergueu-se dum salto e foi ter com ele.
Jesus, tomando a palavra, perguntou-lhe: "Que queres que te faça?” “Rabôni”, respondeu-lhe o cego, “que eu veja!”.
Jesus disse-lhe: “Vai, a tua fé te salvou." No mesmo instante, ele recuperou a vista e foi seguindo Jesus pelo caminho.» (Mc 10, 49-52)

Abaixo, uma curta reflexão, muito concreta e atual, que tem como pano de fundo o texto bíblico Mc 10, 46-52  (Jesus cura o cego Bartimeu).
É de autoria do padre e teólogo espanhol José Antonio Pagola.
O texto foi publicado na no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Não deixe de  ler!
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IHU – Notícias

Curar-nos da cegueira

 

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus segundo Marcos 10,46-52 que corresponde ao 30° Domingo do Tempo Comum, ciclo B do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto.

Eis o texto

Que podemos fazer quando a fé se vai apagando dos nossos corações?  É possível reagir? Poderemos sair da indiferença? Marcos narra a cura do cego Bartimeu para animar os seus leitores a viver um processo que pode mudar suas vidas.

Não é difícil reconhecer-nos na figura de Bartimeu. Vivemos por vezes como «cegos», sem olhos para ver a vida como Jesus. «Sentados», instalados numa religião convencional, sem forças para seguir os seus passos. Desencaminhados, «à beira do caminho» que leva até Jesus, sem o ter como guia das nossas comunidades cristãs.

Que podemos fazer? Apesar da sua cegueira, Bartimeu «toma conhecimento» que, pela sua vida, ia passar Jesus. Não pode deixar escapar a oportunidade e começa a gritar uma e outra vez: «tem piedade de mim». Isto é sempre o início: abrir-se a qualquer chamada ou experiência que nos convida a curar nossa vida.

O cego não sabe recitar orações feitas por outros. Só sabe gritar e pedir compaixão porque se sente mal. Este grito humilde e sincero, repetido desde o fundo do coração, pode ser para nós o início de uma vida nova. Jesus não passará ao largo.

O cego continua no chão, longe de Jesus, mas escuta atentamente o que lhe dizem os Seus enviados: «Coragem, levante-se, porque Jesus está chamando você.» Primeiro, anima-se abrindo um pequeno resquício à esperança. Logo, escuta a chamada de levantar-se e reage. Por fim, já não se sente só: Jesus chama-o. Isto muda tudo.

Bartimeu dá três passos que vão mudar a sua vida. «Larga o manto» porque o estorva para se encontrar com Jesus. Logo, apesar de, todavia, se mover entre trevas, «dá um pulo» decidido. Desta forma «aproxima-se» de Jesus. É o que necessitamos muitos de nós: libertar-nos de correntes que afogam a nossa fé; tomar, por fim, uma decisão sem deixar para mais tarde; e colocar-nos diante Jesus com confiança simples e nova.

Quando Jesus lhe pergunta o que quer dele, o cego não tem dúvidas. Sabe muito bem o que necessita: «Mestre, que eu possa ver de novo». É o mais importante. Quando se começa a ver as coisas de uma nova forma, a sua vida transforma-se. Quando uma comunidade recebe a luz de Jesus, converte-se.



terça-feira, 20 de outubro de 2015

Uma nova lógica. – Reportagem de Micheline Alves. Muito interessante!



Não poucas vezes já se falou sobre o economista Muhammad Yunus, conhecido no mundo todo como “o banqueiro dos pobres”, e sobre a sua iniciativa foram públicados vários artigos ao longo dos últimos anos. Obviamente, isso não quer dizer que todo mundo já ouviu falar dele, ou conhece a sua obra.

Por achar essa matéria bem interessante, útil e digna de ser relembrada e compartilhada, trago-a hoje para o blog Indagações-Zapytania.  As ideias analisadas e debatidas no texto merecem destaque.

Essa reportagem foi publicada em julho deste ano (2015) no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).

Não deixe de  ler!
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IHU - Notícias
Segunda, 27 de julho de 2015

Uma nova lógica

O economista Muhammad Yunus é conhecido no mundo todo como “o banqueiro dos pobres”. Por meio do Grameen Bank, que ele fundou em 1983 em Bangladesh, Yunus espalhou em escala internacional o conceito do microcrédito: empréstimos feitos, sem garantias ou papéis, a gente pobre que nunca antes teve acesso ao sistema bancário. Tal fomento ao empreendedorismo, sobretudo entre mulheres, e seus resultados efetivos lhe renderam, entre outros prêmios, o Nobel da Paz em 2006. Também transformaram  Yunus em um dos oradores mais requisitados do planeta, inclusive em eventos lotados de empresários e banqueiros que ele critica sem censura.

A reportagem é de Micheline Alves, publicada pelo revista Trip, 21-07-2015.




Reportagem


Há dois meses ele esteve no Brasil para promover a Yunus Negócios Sociais, braço brasileiro da Yunus Social Business Global Initiatives, espécie de incubadora de negócios sociais – como são chamadas empresas criadas para resolver problemas sociais, e não exatamente gerar lucro para acionistas. Durante a passagem por São Paulo, ele falou à Trip sobre essa trajetória e sua crença de que esse tipo de negócio é um modo eficaz de repensar o sistema econômico vigente – do qual critica a concentração de renda em níveis absurdos e a própria lógica de que as pessoas precisam passar a vida procurando emprego. “O ser humano não nasceu para isso”, diz ele, um defensor pioneiro da ideia, tão em voga hoje, de que é melhor seguir o próprio caminho do que ser um funcionário.

Em Daca, capital e maior cidade de Bangladesh, Yunus mora com a mulher e a filha mais nova (a mais velha, que acaba de lhe dar o primeiro neto, vive em Nova York) no mesmo conjunto de prédios onde está a sede do Grameen Group, com suas mais de 50 empresas. Em boa parte do tempo, viaja pelo mundo com palestras e consultorias que lhe dão uma rotina atribulada, da qual diz não se cansar, mesmo aos 75 anos de idade. “Eu gosto disso. Sem essa rotina eu estaria terrivelmente entediado. Não sei o que fazer comigo mesmo quando não estou ocupado.”

A seguir, oito trechos da conversa que deixam claro que, para Yunus, o que falta ao mundo é olhar mais para o próximo e trabalhar pela prosperidade coletiva. Uma visão mais amorosa, pode-se dizer.

Um novo capitalismo

“Há 85 pessoas no mundo que têm mais da metade de toda a riqueza do planeta. Já a metade mais pobre da população mundial detém menos de 1% desses recursos. Que mundo é esse?

Minha luta tem sido contra essa estrutura. As pessoas não podem fazer nada além de tocar o barco como foi concebido. Luto por uma nova máquina, por alternativas, por um movimento contrário. A estrutura que existe não vai resolver nosso problema. A disparidade de renda só piora, a riqueza se concentra em pouquíssimas mãos.

Conheço empresa que ficou cem vezes maior em sete anos, e o número de funcionários só diminui. Inclusive por causa de tecnologia, eficiência. O que vai acontecer com todas essas pessoas sem trabalho?  Se a Europa, a parte mais próspera do mundo, vive isso, o que acontece em economias menores? Temos que redesenhar o sistema capitalista. Tudo o que dizem é ‘faça dinheiro, seja feliz’. Mas aí você ganha us$ 1 bilhão e não faz nada pelos outros. Para que serve us$ 1 bilhão? ‘Ah, dei emprego a muita gente.’ Sim, e pegou a riqueza para você. Concentração é tudo o que você produziu.”

Emprego: esqueça essa ideia

“Uma questão essencial está na ideia de emprego. Quem disse que nascemos para procurar emprego? A escola? Os professores? Os livros? Sua religião? Seus pais? Alguém colocou isso na cabeça das pessoas. O sistema educacional repete: ‘você tem que trabalhar duro’. Seres humanos não nasceram pra isso. O ser humano é cheio de poder criativo, mas o sistema o reduz a mero trabalhador, capaz de fazer trabalhos repetitivos. Isso é vergonhoso, está errado. As pessoas precisam crescer sabendo que é uma opção se tornar empregado, mas que existe a possibilidade de ser empreendedor, seguir o próprio caminho. É arriscado, incerto, há frustrações, mas é bem mais estimulante. Arrumar emprego é o que é seguro, garantido. Mas sua vida será limitada ao que decidirem por você.

Teoria versus realidade

“Meu pai era um pequeno comerciante. Admirava a educação, mas não pôde ir além do oitavo ano na escola. Minha mãe foi até o quarto ano. Somos sete irmãos e duas irmãs, e todos decidimos por conta própria o que fazer. Oportunidades surgiram, empregos me foram oferecidos, e eu não aceitei. O único emprego que tive foi o de professor – porque eu queria ensinar. Não me empolgou a possibilidade de carreira, salário, mas o espaço para pensar, criar.   E, quando chegou a hora, comecei o negócio do microcrédito.

O isolamento da universidade sempre me irritou. Qual a utilidade do conhecimento se ele não chega às pessoas? Em Bangladesh, tínhamos pessoas morrendo de fome. Faz sentido ensinar teorias tão bonitas, das quais somos tão orgulhosos, e elas não terem o menor significado na vida de quem não pode comer? Há muitas maneiras de morrer, mas a fome é uma das mais dolorosas. Lidar com teorias econômicas diante de pessoas morrendo assim era uma piada.”

Contra os bancos

“Fico furioso com agiotagem. Como um ser humano pode ser tão cruel com outro? Vi situações dramáticas de pessoas devendo dinheiro. Então comecei a emprestar, para que parassem de procurar exploradores. Eram quantias mínimas – o primeiro empréstimo foi de us$ 27. O problema é que meu dinheiro foi acabando. Fui a uma agência bancária no próprio campus da universidade onde eu lecionava e pedi ajuda ao gerente. A resposta: ‘Isso é problema seu’. Começou aí meu confronto com bancos. Ouvi explicações absurdas sobre por que não dar crédito a gente pobre. Até que entendi: eu deveria ter um banco. Um banco que fizesse um bom trabalho pelas pessoas.

Foi o que inventei em 1983: o Grameen Bank. Diziam que era um fenômeno local, que só funcionaria em Bangladesh. Fomos à Malásia, a convite de pessoas de lá, e deu certo. Disseram: ‘é um fenômeno de países muçulmanos’. Fomos às Filipinas, país católico. Passaram a dizer: ‘é um fenômeno asiático’. Explicações e mais explicações vieram, sempre para proteger a ideia de que o sistema continua certo – e você apenas inventou algo que não vale para o mundo. Em 2006 vem o prêmio Nobel. Nem assim o sistema muda.”

Desenvolvimento?

“Na crise de 2008, eu estava em Nova York. Vendo as notícias sobre o colapso, os escândalos, lembrei daquele gerente que procurei e pensei: quem merece crédito, afinal? Quem está dando calote? Os pobres a quem empresto dinheiro me devolvem cada centavo. Temos oito agências em Nova York, com 30 mil clientes, e nenhuma inadimplência. Então, por que continuar teimando? Por que ensinar na universidade o que é sistema bancário sem se perguntar por que mais da metade da população do planeta não tem nada a ver com bancos? Construir rodovias é medida de desenvolvimento? Para mim, não existe desenvolvimento se pessoas têm uma única muda de roupa. Ou se só fazem uma refeição ao dia.”

Resolvendo problemas

“Em determinada época, percebi que crianças de muitas famílias não conseguiam enxergar à noite. Vi isso em diferentes lugares: crianças que não veem nada depois que o sol se põe. Médicos me disseram: ‘Isso é uma doença chamada cegueira noturna, causada por falta de vitamina A. Se tomarem comprimidos ou tiverem alimentação rica em vegetais, voltam a enxergar’. Voltei a algumas famílias e expliquei a importância de comer vegetais. ‘Ah, não é simples encontrar vegetais’, diziam. Tive a ideia de vender pequenos pacotes de sementes, a 1 centavo. Gradualmente, foram comprando e plantando. O Grameen Group  passou a ter um negócio de  sementes. Em sete anos, nos tornamos o maior vendedor de sementes do país. E a cegueira noturna foi erradicada. É essa a ideia do negócio social."

Isso é negócio, sim

“Muita gente diz que isso não é um negócio de verdade. Se não tem lucro, não é negócio. De onde vem essa definição? É negócio, sim. É decisão minha não ter lucro. Se a teoria não se encaixa no que eu criei, não sou eu quem está errado; é a teoria. O capitalismo é uma ideia maravilhosa, porque dá opções. O problema está na ideia de que é preciso maximizar lucros e que só isso é aceitável como negócio. Não somos robôs fazedores de dinheiro. A vida não pode ser reduzida a uma busca egoísta como essa. Outra lógica é possível e há empresas interessadas.

O chairman da Danone me procurou dizendo que queria resgatar os ideais de seu pai – e não apenas tocar uma corporação mais preocupada com o valor das ações. Nasceu aí um negócio social: um iogurte muito barato, com os nutrientes de que uma criança precisa diariamente, vendido de porta em porta, por gente que não tinha trabalho em Bangladesh. A Danone não terá lucro com isso: apenas recupera o que foi investido e nada mais. Você pode não morrer de amores por esse modelo – e eu quero discussão, quero ouvir críticas. Mas não pode simplesmente dizer ‘não funciona’ ou ‘não é real’.”

Novas gerações

“Tenho falado muito, em diferentes países, a convite de empresários, banqueiros. Então creio que estejam prestando atenção ao que eu digo. Se me odiassem, me manteriam longe. Não odeio os banqueiros, as pessoas, apenas digo: ‘Não é possível continuar agindo assim’. E estão entendendo. Talvez ainda haja uma diferença entre a imagem pública e o que pensam. Muitos chegam em casa e são criticados pelos filhos. Porque as novas gerações estão espalhando essas mensagens. Viajo muito, é uma rotina corrida, mas a energia das pessoas, particularmente as mais jovens, me renova.

Quando vejo essa gente respondendo ao que digo, se inspirando, querendo fazer alguma coisa, tudo faz sentido. Quando estou longe de casa, no Brasil, na Colômbia, no Chile ou na China, e vejo que as pessoas conhecem o que eu disse, o que eu fiz, esqueço as horas de sono perdidas, o jetlag. São sementes sendo espalhadas, que um dia vão germinar. Algumas podem se tornar árvores gigantes. Quem sabe?”



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Foto:  Google






Muhammad Yunus,  (Chittagong, 28 /06/ 1940), é um economista e banqueiro bengali.    (...)  Em 2006 foi laureado com o Nobel da Paz. É autor do livro Banker to the poor  ( O banqueiro dos pobres). Pretende acabar com a pobreza através do banco que fundou, do qual é presidente e o governo de Bangladesh é o principal acionista, o Grameen Bank, que oferece ativamente microcrédito para milhões de famílias. Yunus afirma que é impossível ter paz com pobreza.
Muhammad Yunus formou-se em Economia em Bangladesh, doutorou-se nos Estados Unidos e foi professor na Universidade de Dhaka. Em1976, constatou as dificuldades de pessoas carentes em obter empréstimos na aldeia de Jobra, num Bangladesh empobrecido  e recém-separado do Paquistão. Por não poderem dar garantias, os bancos recusavam-lhes as pequenas quantias que permitiriam comprar materiais para trabalhar e vender, e os usurários taxavam os empréstimos com juros altos. Yunus acredita que todo ser humano possui instintos de sobrevivência e auto-preservação, uma prova disto são os milhões de pobres que existem no mundo, onde mesmo miseráveis, conseguem contornar ao máximo sua situação. Sendo assim, a forma mais efetiva de ajudar estas pessoas é incentivar o que elas já tem, seu instinto. Quando confere recursos para estas pessoas, por pouco que seja, consegue melhorar sua condição de vida utilizando-se do seu já senso de sobrevivência.
Muhammad Yunus criou então o Banco Grameen, que empresta sem garantias nem papéis, sendo, sobretudo, procurado por mulheres: elas são 97% dos 6,6 milhões de beneficiários. A taxa de recuperação é de 98,85%. (...)   In: Wikipedia