“Jesus então disse: “Vim a este
mundo para fazer uma discriminação: os que não veem vejam, e os que veem se
tornem cegos". (Jo 9, 39)
Abaixo, uma reflexão muito concreta e relevante,
que tem como pano de fundo o texto bíblico Jo 9, 1-41 (Jesus cura o cego de nascença). É de autoria do padre
e teólogo espanhol José Antonio Pagola. Foi publicada na no site do Instituto
Humanitas Unisinos (IHU).
Vale a pena ler!
WCejnóg
IHU
– ADITAL
20
Março 2020
Olhos
novos
A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o
Evangelho de Jesus Cristo segundo João 9,1-41 que corresponde ao Quarto Domingo
de Quaresma, ciclo A do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto.
Eis o texto
O relato do cego de Siloé está estruturado a partir
de uma chave de forte contraste. Os fariseus acreditam que sabem tudo. Não
duvidam de nada. Impõem a sua verdade. Chegam, inclusive, a expulsar da
sinagoga o pobre cego: “Este homem
não é o enviado de Deus, pois não guarda o sábado.” (...) “Nós sabemos que este
homem é pecador”. (Jo 9, 16;24)
“Então, eles o cobriram de injúrias e lhe disseram: ‘Tu que és discípulo
dele! Nós somos discípulos de Moisés. Sabemos que Deus falou a Moisés, mas
deste não sabemos de onde ele é’. (...) ‘Tu nasceste todo em pecado e nos
ensinas?...’. E expulsaram-no." (Jo 9, 28-29;34)
Pelo contrário, o mendigo curado por Jesus não sabe nada. Apenas conta a sua experiência a quem o queira escutar: “Só sei que era cego e agora vejo”. “Esse homem trabalhou os meus olhos e comecei a ver”. O relato termina com esta advertência final de Jesus: “Eu vim para que os que não veem, vejam, e os que veem fiquem cegos”.
A Jesus dá-lhe medo uma religião defendida por
escribas seguros e arrogantes, que manejam autoritariamente a Palavra de
Deus para impô-la, usá-la como arma ou inclusivamente excomungar a quem
sente de maneira diferente. Teme os doutores da lei, mais preocupados em
“guardar o sábado” do que em “curar” mendigos doentes. Parece-lhe uma tragédia,
uma religião com “guias cegos” e diz abertamente: “Se um cego guia outro cego,
os dois cairão no buraco”.
Teólogos, pregadores, catequistas e educadores, que pretendem “guiar” outros sem ter-se deixado iluminar por Jesus,
não devemos ouvir a sua interpelação? Vamos continuar a repetir incansavelmente
as nossas doutrinas sem viver uma experiência pessoal de encontro com Jesus que
nos abra os olhos e o coração?
A nossa Igreja, hoje, não necessita de pregadores
que encham as igrejas de palavras, mas de testemunhas que contagiem, mesmo que
de forma humilde, com a sua pequena experiência do evangelho. Não necessitamos
de fanáticos que defendam “verdades” de forma autoritária e com linguagem
vazia, cheios de clichês e frases feitas.
Necessitamos de crentes de verdade, atentos à
vida e sensíveis aos problemas das pessoas, buscadores de Deus capazes de
escutar e acompanhar com respeito a tantos homens e mulheres que sofrem,
procuram e não conseguem viver de uma maneira mais humana ou mais crente.
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