Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

sábado, 27 de outubro de 2018

“Com olhos novos”. – Reflexão de José Antonio Pagola. Muito atual!




"O que você quer que eu lhe faça? ", perguntou-lhe Jesus. O cego respondeu: "Mestre, eu quero ver! "
"Vá", disse Jesus, "a sua fé o curou". Imediatamente ele recuperou a visão e seguia a Jesus pelo caminho.”   (Mc 10, 51-52)

A reflexão que trago hoje para o blog Indagações-Zapytania, do padre e teólogo espanhol José Antônio Pagola, é muito concreta e atual. Tem como pano de fundo o texto bíblico Mc 10, 46-52  (O cego Bartimeu).
Foi publicada no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).

Muito boa.  Não deixe de ler.
WCejnog

IHU – ADITAL
26 outubro 2018

Com olhos novos

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 10, 46-52, que corresponde ao 30° Domingo do Tempo Comum, ciclo B, do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto. 

Eis o texto

A cura do cego Bartimeu está narrada por Marcos para urgir as comunidades cristãs a sair da sua cegueira e mediocridade. Só assim seguirão Jesus pelo caminho do Evangelho. O relato é de uma surpreendente atualidade para a Igreja dos nossos dias.

Bartimeu é “um mendigo cego sentado junto ao caminho”. A sua vida sempre é de noite. Ouviu falar de Jesus, mas não conhece o Seu rosto. Não pode segui-Lo. Está junto ao caminho por onde caminha Jesus, mas está fora. Não é esta a nossa situação. Cristãos cegos sentados junto ao caminho, incapazes de seguir Jesus?

Entre nós é de noite. Desconhecemos Jesus. Falta-nos luz para seguir o Seu caminho. Ignoramos para onde se encaminha a Igreja. Não sabemos sequer que futuro desejamos para ela. Instalados numa religião que não consegue converter-nos em seguidores de Jesus, vivemos junto ao Evangelho, mas fora. Que podemos fazer?

Apesar da sua cegueira, Bartimeu capta que Jesus está a passar próximo Dele. Não hesita um instante. Algo lhe diz que em Jesus está a sua salvação: “Jesus, Filho de David, tem compaixão de mim!”. Este grito repetido com fé vai desencadear a sua cura.

Hoje se ouve na Igreja queixas e lamentos, críticas, protestos e mútuas desqualificações. Não se escuta a oração humilde e confiada do cego. Esquecemo-nos que só Jesus pode salvar esta Igreja. Não percebemos a Sua presença próxima. Só acreditamos em nós.

O cego não vê, mas sabe escutar a voz de Jesus, que lhe chega através dos Seus enviados: “Ânimo, levanta-te, que te chama!”. Este é o clima que necessitamos criar na Igreja. Animar-nos mutuamente a reagir. Não seguir instalados numa religião convencional. Voltar a Jesus, que nos está chamando. Este é o primeiro objetivo pastoral.

O cego reage de forma admirável: solta o manto que lhe impede levantar-se, dá um salto no meio da obscuridade e aproxima-se de Jesus. Do seu coração apenas brota uma petição: “Mestre, que recupere a vista”. Se os seus olhos se abrem, tudo mudará. O relato conclui dizendo que o cego recuperou a vista e “o seguia pelo caminho”.

Esta é a cura que necessitamos hoje os cristãos. O salto qualitativo que pode mudar a Igreja. Se muda o nosso modo de olhar Jesus, se lemos o Seu Evangelho com olhos novos, se captamos a originalidade da Sua mensagem e nos apaixonamos com o Seu projeto de um mundo mais humano, a força de Jesus irá arrastar-nos. As nossas comunidades conhecerão a alegria de viver seguindo-O de perto.




sábado, 20 de outubro de 2018

“O Messias e o Espírito Santo”. – Artigo de Clarisse Gurgel. Vale a pena ler!



Hoje trago para blog Indagações-Zapytania o artigo“ O Messias e o Espírito Santo” , de Clarise Gurgel (Professora do departamento de Estudos Políticos da UniRio). Acho muito acertadas todas as colocações e penso que possam ajudar bastante a quem procura entender melhor a situação política no Brasil.
O texto  foi publicado recentemente (16/10/2018) na Carta Capital.
Não deixe de ler!
WCejnóg







por Clarisse Gurgel 
publicado 16/10/2018

O Messias e o Espírito Santo

É possível ser contra o PT, o PSDB, sem ser a favor de matar quem pensa diferente. Aqueles que têm autoridade, não precisam de autoritarismo. Alguns não se atentam para o fato de que o Espírito Santo desagregou-se, pois a humanidade se foi.


(inShare  - Alexandre Schneider / AFP)
  
Nós, seres humanos, somos tomados frequentemente por angústias. Elas são sentimentos de mal estar que podem estar relacionados a conflitos internos nossos, desejos e vontades que temos e com as quais não queremos entrar em contato; ou podem estar mais relacionados a dificuldades externas: a sensação, por exemplo, de que nossa vida não tem muito sentido, de que vivemos pra trabalhar, de que a única coisa que nos alegra é a cerveja... Ou a cobrança sobre nós mesmos para que ganhemos dinheiro, a todo tempo, que sejamos exemplo de sucesso, mesmo quando a ideia de sucesso não corresponde ao que desejamos; Ou a pressão para que o mês acabe para que possamos passar o mês. 

Esta vida parece sem sentido mesmo.

Quando sentimos essas angústias, geralmente recorremos a algum objeto ou alguém que nos sirva de válvula de escape. Algo que encarne a figura de todo o mal sobre o qual podemos despejar o peso de nossa angústia.

No passado recente brasileiro, as angústias que tocavam nossa alma, no mais íntimo, envolviam nosso papel no mundo, a forma como passaríamos pela vida. Brás Cubas, de Machado de Assis, bem ilustrava este brasileiro que, de 1920 a 1990, vivia aflito para ser alguém que deixaria alguma grande contribuição em sua passagem pela terra.

As saídas para essas angústias puderam contar, a partir de 1988, com possibilidades maiores de participação na política e na vida social. As pessoas tinham seus medos, seus fantasmas e iam para a associação de moradores encontrar soluções para problemas que se descobriam comuns, iam para organizações sindicais, tinham a perspectiva e o orgulho de ser funcionário público e a referência em escolas públicas, por exemplo.

Através de tudo isso, alguns sentiam que a vida ganhava maior sentido: viviam, permitindo-se questionar as coisas, criando, juntos, formas novas de enfrentar os problemas, permitindo-se sonhar e ir longe.

Na música, na literatura, no teatro, tínhamos diversos exemplos: Barão Vermelho, Ultraje a Rigor, Titãs, Legião Urbana, Engenheiros, ... Quem não se lembra de livros infantis que marcaram a geração de 80? “Longe é um lugar que não existe”, de Richard Bach, em que todos são como pássaros e nada parece impossível.

Ou óperas para crianças como Os Saltimbancos, em que o mal era compreendido, desde pequeno, como relacionado à exploração de um cão servil ao patrão, de uma galinha que viraria canja por estar velha, de um jumento, vitima de abusos, de preconceitos e de excesso de trabalho. Ainda na década de 90, preservava-se a consciência de que era necessário se organizar pra desorganizar. Nação Zumbi era um prenúncio para o que se anunciava para o Brasil.

A solução para estes males não deixava de passar pela religião também. Arca de Noé era repertório comum nas vitrolas, com canções de São Francisco, o Santo Pobre que cuidava das crianças e dos bichos. Não à toa o catolicismo aparece, na história do Brasil, como também associado a ações comunitárias, a pastorais da terra, a pastorais da criança... Essas mesmas que forjaram o próprio PT e a CUT.

Hoje, passadas as décadas de 80, 90, 2010, o PT aparece como a encarnação do mal em toda a terra. Entender o PT como a encarnação do demônio ajuda as pessoas a traduzirem as angústias que sentem. Angústias um pouco diferentes e muitas vezes manifestadas por medo da violência.

Esta angústia parece conjugar o mal estar que as pessoas têm consigo mesmo, aquele relativo a conflitos internos - dado que todos se sentem impotentes - e o incomodo com o dito mundo externo - em que todos são ameaçadores, em que todas as ruas, as vias e avenidas são perigosas. Por isto, a angústia, hoje, tem esta tendência à paranoia. Em especial, quando, em conjunto com o pânico, abandonamos a fé no ser humano, aquilo pregado por Cristo e seus apóstolos militantes, como a potência do amor que dispensa templos.

 O que esperar de um país em que as pessoas temem todos, em todos os lugares, sentem-se impotentes e não acreditam no público, na política, nas esferas cotidianas de debate e embates de ideias? O que se espera é que todos busquem o grande vilão que seja o único responsável pelo que nos amedronta e que a solução passe a ser a mais rápida, pois não se acredita mais em ninguém, a não ser em si mesmo, desde que armado. E o nome do Lobo Mal é PT.

De fato, o PT fez muito mal a muita gente: fez a segunda reforma da previdência, entregou os hospitais públicos na mão de empresários, piorou carreiras do serviço público. E conciliou as classes: ampliou os programas de assistência social do PSDB, tirou pessoas da miséria extrema, realizou concursos públicos pra classe média e permitiu grandes fusões de empresas que resultaram em lucros astronômicos de bancos e conglomerados de empresas. Nada parecido com uma Cuba ou uma Venezuela ou com o oximoro "Ditadura Comunista".

Comunista tem o compromisso de acabar com o Estado. Lula fortaleceu o Estado, primarizando serviços do executivo e aparelhando a Polícia Federal, por exemplo. E, ainda assim, pudemos falar mal do Lula. Pudemos nos reunir e nos manifestar contra Lula. Pudemos ser contra ele. 

O mesmo se deu com o PSDB, no governo de FHC: pudemos ser contra sua política, pudemos reivindicar melhorias de vida, lutar contra as reformas que retiravam direitos dos que trabalham. 

Nem PSDB, nem PT diziam que os que pensavam diferente deles tinham que morrer. Não era fácil a luta, mas combatíamos, nas ruas, os ataques aos empregos e aos trabalhadores. 

Mas os tempos mudaram: aqueles que eram trabalhistas, que endeusavam Brizola e os brizolões, que insistiam que a solução era a educação e o trabalho, que poupavam as Marias Madalenas... Hoje, preferem pegar em armas, matar, eliminar, atirar a primeira pedra. São pessoas que esqueceram preceitos cristãos que faziam parte da cultura do Brasil, como o de não devolver o mal com o mal. 

Assim, alguns podem até acreditar que contam com um pai e com um filho, mas não atentam para o fato de que o Espírito Santo desagregou-se, pois a humanidade se foi. Nosso senso de comunidade se perdeu e todos querem acreditar que a solução é unicamente individual: virar patrão de si mesmo, virar empresário. O novo imaginário do brasileiro, que valorizava o trabalho, é que otário é aquele que trabalha e não o que me explora e que esperto é quem consegue explorar e lucrar. 

Isto é o que faz com que, no lugar do trabalhismo, tenham nos apresentado outra dissimulação: a figura do empreendedorismo (que, na prática, força o trabalhador a trabalhar com seus próprios e parcos recursos, sem direito algum, sem garantia sobre o dia de amanhã)

Os inteligentes sabem que Bolsonaro já declarou que é contra todo e qualquer direito trabalhista. A retirada de direitos, tais como o que o PSDB e o PT já começaram a fazer, gera pobreza, desespero, desestrutura famílias, empurra trabalhadores para a indigência e até mesmo aumenta os índices de roubos e assaltos, pela desigualdade abissal que gera. 

Lutamos contra essas iniciativas, no tempo do FHC e do Lula. Estamos vivos.
Com Bolsonaro, vamos perder o resto de direitos que temos, como 13º, férias, FGTS, aposentadoria, carteira de trabalho, emprego fixo... E, ainda por cima, não poderemos ser contra isto, pois os inteligentes sabem que Bolsonaro é a favor de matar quem pensa diferente dele. Se Bolsonaro for eleito e seguirmos criticando as retiradas de direitos, já anunciadas por ele, iremos presos,  torturados e mortos, assim como Cristo foi, injustamente, ao denunciar os mercadores, os que perseguiam os pobres e acumulavam riqueza. 

É possível ser contra o PT, o 
PSDB, sem ser a favor de matar pessoas, só porque elas pensam diferente de ti. Aqueles que têm autoridade, não precisam de autoritarismo. 

Quem sabe, entendendo isto, nosso Messias desce à terra e segue vivo, na carne e no corpo do povo?






sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Nada disso entre nós. – Reflexão de José Antonio Pagola. Muito atual!



Não será assim entre vocês. Pelo contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo; e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo de todos. Pois nem mesmo o Filho do homem veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos". (Mc 10, 43-45)

A reflexão que trago hoje para o blog Indagações-Zapytania, do padre e teólogo espanhol José Antônio Pagola, é muito concreta e atual. Tem como pano de fundo o texto bíblico Mc 10,35-45  (Os discópulos querem um lugar de honra).
Foi publicado no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).

Muito bom. Vale a pena ler.
WCejnóg

IHU – ADITAL
19 outubro 2018

Nada disso entre nós

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 10, 35-45 que corresponde ao 29° Domingo do Tempo Comum, ciclo B, do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto. 

Eis o texto

Enquanto sobem para Jerusalém, Jesus vai anunciando aos seus discípulos o destino doloroso que o espera na capital. Os discípulos não o entendem. Estão disputando entre eles os primeiros lugares. Santiago e João, discípulos desde a primeira hora, aproximam-se dele para pedir-lhe diretamente sentar-se um dia “um à Tua direita e o outro à Tua esquerda”.

Jesus fica desalentado: “Não sabeis o que pedis”. Ninguém no grupo parece entender que segui-lo de perto no seu projeto sempre será um caminho sem poder nem grandezas, mas de sacrifício e de cruz.

Entretanto, ao ficarem sabendo do atrevimento de Santiago e João, os outros dez indignam-se. O grupo está mais agitado que nunca. A ambição os divide. Jesus reúne-os a todos para deixar claro o seu pensamento.

Antes de tudo expõe-lhes o que acontece aos povos do Império romano. Todos conhecem os abusos de Antipas e das famílias herodianas na Galileia. Jesus resume assim: os que são reconhecidos como chefes utilizam o seu poder para “tiranizar” os povos, e os grandes não fazem senão “oprimir” os seus súditos. Jesus não pode ser mais categórico: “Vós, nada disso”.

Jesus não quer ver entre os seus nada semelhante: “O que queira ser grande entre vós que seja vosso servidor, e o que queira ser primeiro entre vós que seja escravo de todos”. Na sua comunidade não haverá lugar para o poder que oprime, só para o serviço que ajuda. Jesus não quer chefes sentados à sua direita e esquerda, mas servidores como Ele que dão a sua vida pelos demais.

Jesus deixa as coisas claras. Sua Igreja não se constrói a partir da imposição dos de cima, mas a partir do serviço dos que se colocam abaixo. Não cabe qualquer tipo de hierarquia em termos de honras ou de domínio. Tampouco métodos e estratégias de poder.  O serviço é o que constrói a Igreja de Jesus.

Jesus dá tanta importância ao que está a dizer que se coloca a si mesmo como exemplo, pois não veio ao mundo para exigir que o sirvam, mas “para servir e dar a Sua vida em resgate por todos”.

Jesus ensina-nos que ninguém triunfe na Igreja, que não seja para servir o projeto do reino de Deus, dando a vida pelos mais débeis e necessitados.

Os ensinamentos de Jesus não são só para os dirigentes. Desde tarefas e responsabilidades diferentes temos de comprometer-nos todos a viver com mais entrega ao serviço do seu projeto. Não necessitamos na Igreja de imitadores de Santiago e João, mas de seguidores fiéis de Jesus. Os que querem ser importantes, que se ponham a trabalhar e a colaborar.




sexta-feira, 12 de outubro de 2018

“Com Jesus no meio da crise”. – Reflexão de José Antonio Pagola. Bem atual!



Então Jesus, olhando em redor, disse aos seus discípulos: Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas! “  (Mc 10, 23)

A reflexão que trago hoje para o blog Indagações-Zapytania, do padre e teólogo espanhol José Antônio Pagola, é muito atual e bem concreta. Tem como pano de fundo o texto bíblico Mc 10, 17-30 (O jovem rico e Jesus).
Foi publicada no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).

Muito boa. Vale a pena ler.
WCejnóg


IHU – ADITAL
12 Outubro 2018

Com Jesus  no meio da crise

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 10,17-30 que corresponde ao 28° Domingo do Tempo Comum, ciclo B, do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto. 

Eis o texto

Antes de se pôr a caminho, um desconhecido aproxima-se de Jesus a correr. Ao que parece tem pressa de resolver o seu problema: «Mestre, que devo fazer para herdar a vida eterna?». Não lhe preocupam os problemas desta vida. Ele é rico. Tem tudo resolvido.

Jesus coloca-o perante a Lei de Moisés. Curiosamente, não lembra os dez mandamentos, mas só os que proíbem de atuar contra o próximo. O jovem é um homem bom, observante fiel da religião judaica: «Tudo isso tenho cumprido desde jovem».

Jesus olha-o com carinho. É admirável a vida de uma pessoa que não fez mal a ninguém. Jesus quer atraí-lo agora para que colabore com Ele no Seu projeto de fazer um mundo mais humano, e faz-lhe uma proposta surpreendente: «Uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres... e depois vem e segue-me».

O rico possui muitas coisas, mas falta-lhe a única que permite seguir Jesus de verdade. É bom, mas vive apegado ao seu dinheiro. Jesus pede-lhe que renuncie à sua riqueza e a coloque a serviço dos pobres. Só partilhando o que é seu com os necessitados poderá seguir Jesus colaborando no Seu projeto.

O homem sente-se incapaz. Necessita de bem-estar. Não tem forças para viver sem a sua riqueza. O seu dinheiro está acima de tudo. Renuncia a seguir a Jesus. Tinha vindo a correr entusiasmado para Ele. Agora se afasta triste. Não conhecerá nunca a alegria de colaborar com Jesus.

A crise econômica convida-nos, aos seguidores de Jesus, a dar passos para uma vida mais sóbria, para partilhar com as pessoas necessitadas o que temos e simplesmente não precisamos para viver com dignidade. Temos de nos fazer perguntas muito concretas se queremos seguir Jesus nestes momentos.

A primeira é rever a nossa relação com o dinheiro: que fazer com o nosso dinheiro? Para que poupar? Em que investir? Com quem partilhar o que não necessitamos? Logo, rever o nosso consumo para fazê-lo mais responsável e menos compulsivo e supérfluo: Que compramos? Onde compramos? Para que compramos? A quem podemos ajudar a comprar o que necessitam?

São perguntas que devemos nos fazer no fundo da nossa consciência e também nas nossas famílias, comunidades cristãs e instituições da Igreja. Não faremos gestos heroicos, mas, se damos pequenos passos nessa direção, conheceremos a alegria de seguir Jesus, contribuindo para fazer a crise de alguns, um pouco mais humana e leve. Se não é assim, iremos sentir-nos bons cristãos, mas à nossa religião faltará alegria.




sexta-feira, 5 de outubro de 2018

“Contra o poder do homem”. – Reflexão de José Antonio Pagola. Muito boa!



E eles disseram: Moisés permitiu escrever carta de divórcio e repudiar.
Jesus, respondendo, disse-lhes: Pela dureza dos vossos corações vos deixou ele escrito esse mandamento; porém, desde o princípio da criação, Deus os fez homem e mulher.  Por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe, e unir-se-á a sua mulher,
e serão os dois uma só carne; e assim já não serão dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem”.  (Mc 10, 4-9)

 Hoje, uma boa reflexão, muito atual e importante. Como pano de fundo  tem o texto bíblico Mc 10, 2-16 (O que Deus uniu, o homem não deve separar). É de autoria do padre e teólogo espanhol José Antonio Pagola.
O texto foi publicado na no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Não deixe de ler.
WCejnóg

IHU – ADITAL
05 outubro 2018

Contra o poder do homem

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 10,2-16 que corresponde ao 27° Domingo do Tempo Comum, ciclo B, do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o texto. 


Eis o texto
 
Os fariseus colocam a Jesus uma pergunta para o pôr à prova. Desta vez não é uma questão sem importância, mas um fato que faz sofrer muito as mulheres da Galileia e é motivo de vivas discussões entre os seguidores de diversas escolas rabínicas: «É lícito ao marido separar-se da sua mulher?».

Não se trata do divórcio moderno que conhecemos hoje, mas da situação em que vivia a mulher judia dentro do matrimônio,  controlado absolutamente pelo homem. Segundo a Lei de Moisés, o marido podia quebrar o contrato matrimonial e expulsar de casa a sua esposa. A mulher, pelo contrário, submetida em tudo ao homem, não podia fazer o mesmo.

A resposta de Jesus surpreende a todos. Não entra nas discussões dos rabinos. Convida a descobrir o projeto original de Deus, que está acima das leis e normas. Esta lei «machista», em concreto, impôs-se no povo judeu pela dureza de coração dos homens, que controlam as mulheres e as submetem à sua vontade.

Jesus aprofunda o mistério original do ser humano. Deus «criou-os homem e mulher». Os dois foram criados em igualdade. Deus não criou o homem com poder sobre a mulher. Não criou a mulher submetida ao homem. Entre homens e mulheres não tem de haver domínio por parte de ninguém.

A partir desta estrutura original do ser humano, Jesus oferece uma visão do matrimônio que vai mais além de tudo o que é estabelecido pela Lei. Mulheres e homens se unirão para «ser uma só carne» e iniciar uma vida partilhada numa mútua entrega, sem imposição nem submissão.

Este projeto matrimonial é para Jesus a suprema expressão do amor humano. O homem não tem direito algum de controlar a mulher como se fosse o seu dono. A mulher não deve aceitar viver submetida ao homem. É Deus mesmo quem os atrai a viver unidos por um amor livre e gratuito. Jesus conclui de forma rotunda: «O que Deus uniu que não o separe o homem».

Com esta posição, Jesus destrói pela raiz o fundamento do patriarcado em todas as suas formas de controle, submissão e imposição do homem sobre a mulher. Não só no matrimônio, mas em qualquer instituição civil ou religiosa.

Temos de escutar a mensagem de Jesus. Não é possível abrir caminhos para o reino de Deus e da sua justiça sem lutar ativamente contra o patriarcado. Quando reagiremos na Igreja com energia evangélica contra tanto abuso, violência e agressão do homem sobre a mulher? Quando defenderemos a mulher da «dureza de coração» dos homens?