“(...)
Amai os vossos inimigos,
fazei bem e emprestai, sem daí esperar nada. E grande será a vossa recompensa e
sereis filhos do Altíssimo, porque ele é bom para com os ingratos e maus. Sede
misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso. Não julgueis, e não sereis
julgados; não condeneis, e não sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados.” (Lc 6,
35-37)
A reflexão que trago hoje para o blog
Indagações-Zapytania, do padre e teólogo espanhol José Antônio Pagola, é bem concreta
e interessante. Tem como
pano de fundo o texto bíblico Lc 6,
27-38 (Jesus fala sobre amor verdadeiro).
Foi
publicado no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Vale
a pena ler.
WCejnog
IHU
– ADITAL
22
fevereiro 2019
Sem
esperar nada
A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o
Evangelho de Jesus Cristo segundo Lc 6,27-38 que corresponde ao 7°
Domingo de Tempo Comum, ciclo C, do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio
Pagola comenta o texto.
Eis o texto
Por que tantas pessoas vivem secretamente
insatisfeitas? Por que tantos homens e mulheres acham a vida
monótona, trivial, insípida? Por que se entediam no meio do seu bem-estar? Que
lhes falta para encontrar de novo a alegria de viver?
Talvez a existência de muitos mudasse e adquirisse
outra cor e outra vida, simplesmente se aprendessem a amar alguém de
graça. O queira ou não, o ser humano está chamado a amar desinteressadamente;
e, se não o faz na sua vida, abre-se um vazio que nada nem ninguém pode
preencher. Não é uma ingenuidade escutar as palavras de Jesus: “Façam o
bem... sem esperar nada”. Pode ser o segredo da vida. O que pode devolver-nos a
alegria de viver?
É fácil acabar
sem amar ninguém de uma forma verdadeiramente gratuita. Não faço mal a
ninguém. Não me meto nos problemas dos outros. Respeito os direitos dos outros.
Vivo a minha vida. Já tenho o suficiente com que me preocupar comigo e com as
minhas coisas.
Mas isso é vida? Viver despreocupado dos
outros, reduzido ao meu trabalho, à minha profissão ou ao meu ofício,
impermeável aos problemas dos outros, alheio aos sofrimentos das pessoas, me
encerro na minha “redoma de vidro”?
Vivemos numa sociedade onde é difícil aprender a
amar gratuitamente. Quase sempre perguntamos: para que serve isso? É útil? Que
ganho com isso? Tudo contamos e medimos. Criamos a ideia de que tudo se
obtém “comprando”: alimentos, vestuário, casa, transporte, entretenimento... E
assim corremos o risco de converter todas as nossas relações numa pura troca de
serviços.
Mas o amor, a amizade, o acolhimento, a
solidariedade, a proximidade, a confiança, a luta pelos fracos, a esperança, a
alegria interior... não se obtêm com dinheiro. São algo gratuito que se
oferece sem esperar nada em troca, mas visa o crescimento e a vida do outro.
Os primeiros cristãos, ao falar de amor, usaram a
palavra “ágape”, justamente para enfatizar mais esta dimensão da
gratuidade, em contraste com o amor entendido apenas como "eros"
e que tinha, para muitos, uma ressonância de interesse e egoísmo.
Entre nós há pessoas que só podem receber um
amor gratuito, porque quase nada têm para retribuir a quem se quer
aproximar delas. Pessoas sozinhas, maltratadas pela vida, incompreendidas por
quase todos, empobrecidas pela sociedade, com quase nenhuma saída na vida.
Aquele grande profeta que foi Helder Câmara
recorda-nos o convite de Jesus com estas palavras: “Para libertar-te a ti
mesmo, lança uma ponte para além do abismo que o teu egoísmo criou. Tenta ver
para além de ti mesmo. Tenta escutar outra pessoa e, acima de tudo, tenta
esforçar-te por amar em vez de amar-te a ti próprio”.