Hoje trago para o blog Indagações-Zapytania uma curta porém bastante profunda
e importante reflexão que pode ser muito útil para muitas pessoas nos tempos
atuais, sobretudo para quem sente-se inseguro(a) e/ou até ‘perdido(a)’ no mundo
de hoje, quando o assunto é a sua fé cristã.
De modo especial penso nos jovens, que hoje muitas vezes enfrentam dúvidas
parecidas, sem no entanto encontrar uma ajuda séria, válida e tranquilizadora. Acho
que o texto abaixo, de Frei Betto, é excelente no sentido de servir como
auxílio para uma curta mas muito boa análise dessa questão. É óbvio que cada um precisa fazer a sua
própria reflexão pessoalmente e no seu absoluto íntimo.
Vale a pena ler esse texto e refletir com muita serenidade.
20.05.2016
Minha fé no ser supremo
Por Frei Betto*
Minha fé cristã tem
paralelo com a história das ideias. Criança, eu acolhia como óbvio que Deus criara
a árvore, assim como todas as coisas existentes.
Depois, passei a crer
que Ele fizera, não a árvore, e sim a semente, da qual brotou a árvore. Adão e
Eva são apenas figuras emblemáticas para atestar que somos todos filhos e
filhas de Deus. Deixei de ser criacionista.
Adão significa, em
hebraico, terra; Eva, vida. O autor bíblico quis sinalizar que a vida veio da
terra, confirma hoje a ciência. Descartei, portanto, a convicção embutida no
criacionismo de que somos todos filhos e filhas do incesto materno, já que Adão
e Eva tiveram dois filhos homens...
Sei, hoje, que a
semente é o ovo primordial que deu origem ao Big Bang. Ali, naquele miolo de
densíssima energia, estava contida toda a Criação. Aderi ao Deus de
Aristóteles, a causa primeira. E aprendi com Santo Agostinho que Deus nos legou
dois livros: a natureza e a Bíblia. O segundo nos faz entender o primeiro.
Hoje, o papa Francisco vai mais longe e afirma, na encíclica Laudato Si, que a
natureza também é fonte de revelação divina (85).
Do Deus Providencial
passei pelo Deus Artífice e, afinal, cheguei ao Deus Amoroso. Para tanto,
atravessei um estágio ateu. Deixei de crer no Deus "lá em cima”, o Deus
que regula sincronicamente os movimentos do Universo. Este Deus se apagou da
minha fé na medida em que me aproximei de Jesus.
Antes, eu tinha Jesus
na conta do Filho que o Pai enviara para redimir o pecado do mundo. Pobre
Filho, destinado a lavar com o seu sangue inocente os nossos pecados! Que Deus
é este, que aplaca a ofensa sofrida ao ver o Filho dependurado na cruz diante
da dor incomensurável de Maria, sua mãe?
A equação se inverteu
em minha cabeça. Jesus é quem me revela Deus. Agora, subo da Terra para o Céu,
do humano para o divino, do Filho para o Pai/Mãe. Não creio senão no Deus de
Jesus. E para mim nada significa ter fé em Jesus. Busco ter a fé de Jesus.
Assim, chego ao estágio
atual de minha crença. Na fé de Jesus o ser supremo não era Deus, com quem ele
tinha relações de familiaridade amorosa. Era o ser humano. Jesus acreditava que
o ser humano é imagem e semelhança de Deus. Este só pode ser adorado, servido e
amado no ser humano.
Por isso, toda ofensa
ao ser humano é uma ofensa a Deus. Todo preconceito, toda discriminação ou
segregação é rejeitar Deus. Toda injustiça cometida contra o ser humano é uma
profanação do templo vivo de Deus.
O amor, como mandamento
maior, não é uma questão de sentimento, devoção ou piedade. É uma questão de
justiça, solidariedade e partilha. Toda religião, portanto, se resume em cuidar
do ser humano e da natureza como seres sagrados. E toda espiritualidade
consiste em deixar que o Espírito quebre as resistências de nosso egoísmo e nos
mova na direção do ser supremo e de seu contorno ambiental, de modo a fazê-los
transcender da injustiça à justiça, da opressão à libertação, da dor à
felicidade, da morte à vida.
Fonte: Adital
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