Hoje trago novamente para este blog uma reflexão
muito concreta e atual, que tem como pano de fundo o texto bíblico Lc 16, 19-31 (Parábola do rico e Lázaro).
Esta já foi publicada neste espaço alguns anos atrás, mas por ser relevante,
achei importante trazê-la novamente. É
de autoria do padre e teólogo espanhol José Antonio Pagola. Foi publicada no
site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Vale a pena ler!
WCejnóg
IHU – ADITAL
27 Setembro 2019
Quebrar a indiferença
A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o
Evangelho segundo Lc 16,19-31, que corresponde ao 26° Domingo do Tempo Comum,
ciclo C do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio Pagola comenta o
texto.
Eis o texto
Segundo Lucas, quando Jesus gritou: “não se pode
servir a Deus e ao dinheiro”, alguns fariseus que o ouviam e eram amigos do
dinheiro “riram-se dele”. Jesus não recua. De imediato, conta uma parábola
comovente para que aqueles que vivem escravos da riqueza possam abrir os
olhos.
Jesus descreve em
poucas palavras uma situação dramática. Um homem rico e um pobre mendigo que
vivem perto um do outro estão separados pelo abismo que há entre a vida de
opulência insultante do rico e a miséria extrema do pobre.
A história descreve os
dois personagens, enfatizando fortemente o contraste entre os dois. O homem rico está vestido de púrpura e linho fino, o
corpo do pobre está coberto de feridas. O rico banqueteia-se esplendidamente
não apenas nos dias de festa, mas diariamente; o pobre está deitado à porta do
rico, incapaz de levar à boca o que cai da mesa do homem rico. Apenas os
cachorros que procuram algo no lixo vêm lamber suas feridas.
Não se fala em nenhum momento que o homem rico
tenha explorado o pobre ou que o tenha maltratado ou desprezado. Pode-se dizer
que não fez nada de mal. No entanto, toda a sua vida é desumana, pois só
vive para seu próprio bem-estar. O seu coração é de pedra. Ignora totalmente o
pobre. Tem-no à sua frente, mas não o vê. Está ali mesmo, doente, faminto e
abandonado, mas não consegue atravessar a porta para tomar conta dele.
Não nos enganemos. Jesus não está denunciando
apenas a situação da Galileia dos anos trinta. Está tentando sacudir a
consciência daqueles que se acostumaram a viver na abundância, enquanto morando
próximo à nossa porta, apenas a algumas horas de distância, há povos
inteiros vivendo e morrendo na mais absoluta miséria.
É desumano nos fecharmos na nossa “sociedade do
bem-estar”, ignorando totalmente essa outra “sociedade do mal-estar”. É
cruel continuar a alimentar essa “secreta ilusão de inocência” que nos
permite viver com a consciência tranquila, pensando que a culpa é de todos e de
ninguém.
A nossa primeira tarefa é quebrar a indiferença.
Resistirmos a continuar desfrutando de um bem-estar vazio de compaixão. Não
continuar a nos isolarmos mentalmente para deslocar a miséria e a fome que há
no mundo em direção a um afastamento abstrato, para poder assim viver sem
ouvir nenhum clamor, gemido ou choro.
O Evangelho pode ajudar-nos a viver vigilantes,
sem nos tornarmos cada vez mais insensíveis aos sofrimentos dos abandonados,
sem perder o sentido da responsabilidade fraterna e sem permanecer passivos
quando podemos agir.