Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

As reivindicações de Jesus. A coisa é séria!



Anteriormente notamos que  ao ler o Novo Testamento e sobretudo os Evangelhos, diante dos olhos do leitor surge  Jesus Cristo extraordinário  e incomum, que impressiona a todos tanto com as características da sua pessoa, como também com a sua doutrina,  incomparável com as outras  doutrinas religiosas existentes no mundo. Mais ainda: Ele atua de um modo como se  com  Ele e n’Ele,  o próprio Deus estivesse presente, afirmando que se encontra  numa  única, misteriosa e  especial relação com Deus, a qual  se realiza de maneira que ultrapassa qualquer imaginação, a ponto de constituir com Deus uma certa identidade.

Isso tudo nos faz ficarmos impressionados e admirados, mas também continua deixando muitas pessoas chocadas, pois não é fácil entender quem realmente é Jesus. E quando começamos a entender – temos dificuldade de aceitá-lo, ou tentamos interpretá-lo da nossa maneira. No entanto, este Jesus Cristo diz: “Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30) – o que isso quer dizer? O que mais Jesus fala de si mesmo? Ele quer ser reconhecido como único e faz claras exigências para qualquer um que se encontre com Ele frente a frente.  Como entender isso? 

Assim como nas postagens  anteriores também agora  sirvo-me do texto de Ferdinand Krenzer para servir de base para o nosso tema. Uma leitura atenta  pode nos ajudar muito na busca pela resposta à pergunta: Quem realmente é Jesus Cristo.
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As reivindicações de Jesus. 

Apesar de que não é fácil identificar nos Evangelhos as palavras que realmente saíram da boca de Jesus, podemos  mesmo assim e com razão, aceitar de que também as suas afirmações aprofundadas, alargadas, alongadas e relacionadas a alguma coisa, foram não somente  atribuídas a Ele, mas que  também expressam a sua intenção e que são bem entendidas, bem pronunciadas e corretamente interpretadas palavras de Jesus histórico. “Tudo o que realmente Jesus disse” (Schwarz), disse do jeito que fosse entendido, transmitido para frente, e depois também melhor aceito. A sua palavra “não passa” (Mc 13, 31), sempre terá valor. As primeiras testemunhas olhavam para a boca e as mãos de Jesus, leram dos seus olhos cada gesto apontado para o futuro, e por isso elas tinham esse direito de entender tudo o que Ele lhes manifestava como um convite e impulso para refletir, meditar e agir.

A palavra autêntica de Jesus - assim dizem os exegetas - em que ressoa a sua própria voz, com certeza é tudo isso que não deriva do mundo em que Jesus vivia e nem do pensamento da Igreja primitiva,  permanecendo inexplicável.  Mas também o que permanece ligado a esta ou aquela opinião contemporânea ou até posterior ao Jesus, apesar de toda essa dependência, também pode ser a mais pura, esclarecedora e atuante  fala de Jesus.  As diversas formas de falar e expressões que existiam no tempo de Jesus , por serem elas a mensagem dele, hoje são usadas com uma certa reserva, corrigidas e purificadas de interpretações errôneas. Existe uma quantidade de palavras que, sem nenhuma dúvida, foram pronunciadas pelo Jesus e que constituem o autêntico pré-documento, que saiu da sua boca. Acrescenta-se aqui ainda uma série de ditados e comparações que normalmente não eram usadas comumente.                 

De qualquer modo, parece que Jesus, Ele próprio, falava provavelmente pouco e de forma mais sugestiva, não falando até o fim,  preservando a liberdade.  As suas palavras eram carregadas de conteúdo e assim ficaram:  cheias de expressão, fáceis para memorizar, fáceis também para serem esquecidas, e,  ao mesmo tempo, convidando para a reflexão quando são lembradas. “São uma arma perigosa, mas,  simultaneamente, libertadora”(Metz). Isto que Jesus fala é considerado como “a última palavra de Deus”. Justamente isso é que choca, desequilibra os homens, confunde. Jesus formula uma pergunta principal, que pode ser respondida unicamente ou com  rejeição ou com  fé.

“O tempo se cumpriu e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e creiam no Evangelho. Sigam-me”. (Mc 1,15.17). É isso que constitui o centro e núcleo do Evangelho. Um desafio que tira o homem do equilíbrio, uma assustadora provocação de Jesus.

Quem assim fala, este sabe o que está dizendo, mesmo quando parece que “perdeu sentidos” (Mc 3,21). Fala com rara auto-consciência, como Filho, que conhece o Pai, como representante de Deus. Fala como quem que sabe quem é Deus e o que Deus espera das pessoas  e o que quer para elas. Fala com convicção de que Deus está presente, vai estar presente e virá, para salvar todos os homens e mulheres.

A plenitude chamada de Reino de Deus, entendida como amor para com o ser humano, existe lá onde está Jesus: perto, alcançável, no meio do mundo e da história, real já aqui e agora,  mas ainda não totalmente. Esse Reino de Deus já começou, mas ainda não se realizou plenamente. Quem fala deste jeito, como Jesus, deve ser alguém extraordinário e único. De vez enquanto se serve de expressões que são compreendidas unicamente quando se supõe que Ele permanece no mais íntimo contato com Deus, numa total e contínua concordância com Aquele, a quem chama de “Abbá” (querido pai, papai).

Aqui ficam claros os pronunciamentos diretos do próprio Jesus, as suas afirmações e garantias, que encontramos nos trechos do Evangelho, como por exemplo: “Filho, perdoados estão os teus pecados” (Mc 2,5); “Tudo me foi entregue pelo Pai. De modo que ninguém conhece o Filho senão o Pai e ninguém  conhece  o Pai senão o Filho  e aquele a quem o Filho quiser revelar” (Mt 11,27); “Tu o disseste. Entretanto eu vos digo: um dia vereis o Filho do homem sentado à direita do poder e vir sobre as nuvens do céu”  (Mt 26,64);  “Ninguém subiu ao céu senão quem desceu do céu, o Filho do homem”  (Jo 3,13); “Em verdade, em verdade vos digo: o Filho nada pode fazer por si mesmo. Ele só faz o que vê o Pai fazer. E tudo o que o Pai faz, faz igualmente o Filho” (Jo 5,19);  “Em verdade, em verdade vos digo: antes que Abraão fosse, eu sou” (Jo 8,58);   “Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30); “Mas, se as faço, já que não credes em mim, crede nas obras para saberdes e reconhecerdes que o Pai está em mim e eu no Pai” (Jo 10,38); “ (...) Quem me viu a mim, viu o Pai. Como então dizes: mostra-nos o Pai?” (Jo 14,9); “E agora, Pai, glorifica-me junto a ti, concedendo a glória que tive contigo antes que o mundo fosse criado” (Jo 17,5).

Repletas de pretensões, sobretudo, são essas suas expressões que começam do “Eu sou”, ou então simples dizer: “Sou eu”. Pretendem assim se ligar diretamente ao nome  Javé, o que já existe no próprio nome “Jesus”, que significa “Javé ajuda e salva”. 

Falando: “Eu sou aquele que será”, sou este que “era e é e será” - na pretensão de Jesus – o próprio  “Deus conosco”  torna-se presente no meio das pessoas.   E quando Jesus fala não usa e dirige apenas “as palavras de Javé”, como falavam os profetas, mas fala em seu próprio nome: “Amém, Eu vos digo”; “Eu, porém, vos digo”. 

Ele trata também da sagrada Lei de Deus,  não a anula, mas lhe confere uma dimensão mais profunda. Nem Moisés teve coragem de fazer uma coisa assim. Aqui está alguém “mais” do que qualquer um dos mensageiros de Deus.  Aqui fala alguém delegado por Ele.

Jesus, para não ser mal entendido, evita responder diretamente a pergunta quem é Ele. Responde, então, com a pergunta: e vocês, o que acham? Ou então dá uma dica: venham e vejam, respondam o que vocês viram e ouviram.  Jesus dá também o recado: bem-aventurado é aquele que não se escandaliza por causa de mim.  Por que vocês estão com medo? Vocês são de pouca fé. Será que vocês não viram?  Até quando ainda  tenho que suportar a sua descrença?  Ele, contudo, não força  ninguém. Exige uma resposta livre, onde espera que se descubra e veja nele este alguém extraordinário.

Jesus se serve de parábolas, quadros e comparações.  Este jeito misterioso e especial de falar, que é muito próximo da vida e por isso fácil de entender para os ouvintes, faz que essas suas exigências e a sua revelação tornam-se gradativamente cada vez mais nítidas e claras. Ele sabe muito bem o que quer dizer, e em pensamento sempre tem mais do que inicialmente os ouvintes podem compreender.

Servindo-se de exemplos reais e compreensíveis, Jesus anuncia a aproximação extraordinária de Deus com o homem e também do homem com Deus. Ele próprio, enfim, é a parábola e exemplo do amor de Deus que se doa ao ser humano.  Ele próprio é “soberania de Deus” (Orígenes) que começa. E provoca os homens para que ajam do mesmo modo que Ele.

Em tudo isso, mencionado acima, indiretamente está presente a pretensão de Jesus, de que nele encontra-se o próprio Deus.  Assim também, com certeza, Ele foi entendido pelos seus ouvintes. Este foi o motivo exato  de acusação: “Acaso és maior  do que o pai Abraão, que morreu? E os profetas também morreram. Quem pretendes ser? (Jo 8,53). Isso também foi a mais profunda causa da sua rejeição, processo e morte.  É assim que  isso ressoa na acusação e veredicto afixado na cruz: “Jesus Nazareno, o rei dos judeus” (Jo 19,19).  Então, tão chamado Messias.

Alguém  que se declara assim, e é diferente daquele que foi esperado, este torna-se insuportável. Talvez por isso o homem percebendo de que se trata, confesse depois, ao anoitecer:  “Na verdade este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39).  Mas, para todos os outros, essa pretensão de Jesus ficou como ofensa a Deus: “E unânimes o julgaram merecedor de morte” (Mc 14,64).

Quando a Jesus são dirigidas  todas as acusações e pergunta: Quem na verdade tu és?,  “Donde és tu?” (Jo 19,9),  Ele não fornece nenhuma resposta, mas se cala.  Com este digno e significativo silêncio Ele apaga de uma só vez toda a conversa supérflua, todas as falsas suposições, todo ingênuo desentendimento. É  assim porque ninguém pode pegar Jesus, prender e imobilizar.

Ele escapa de todos os esquemas. A sua existência é inegável, mas ao mesmo tempo, impossível para explicar.  Somente quem abraça humildemente a fé  n’Ele, este consegue gradativamente chegar a decifrar o que  tem de especial em Jesus, quem Ele realmente é, o que disse, e o que pretendia com isso expressar.

Jesus é aquele que simultaneamente desaparece e vai aparecendo. Por isso torna-se também compreensível o porquê Ele rejeita, ou trata com reserva, os vários nomes honrosos  e títulos, que esperavam pelo esperado enviado de Deus. Provavelmente não usou nenhum deles em relação  a sua própria pessoa.

Jesus não quis ser “messias” nem “terrestre” e nem “religioso”, ao contrário, proibia que o chamassem  assim (compare Mc 1,24-25). Nem “Filho de Davi”, “Rei”, “um dos profetas”, ou até o título “Filho de Deus” pareciam-lhe adequados, porque podiam ser atribuídos aos outros enviados de Deus. Provavelmente, Jesus  considerava como mais adequado o título “o Filho do homem”, que mostrava – graças ao seu duplo significado – tanto o homem sofrido, que vive concretamente, como também esta figura eterna, que saiu de Deus, e diante da qual o ser humano deve assumir uma posição.  Este título também era  o mais acertado para a sua “função de Intermediário”. Mas, mesmo este título, considerado como palavras autênticas de Jesus, isto é, que saíram da sua boca, não é certo. Jesus é simplesmente Ele mesmo, o seu mistério permanece mistério, e só gradativamente está sendo compreendido.     “A quem buscais? Responderam-lhe eles: A Jesus Nazareno. Jesus lhes respondeu: Sou eu. (...)  Se, pois, é a mim que buscais, deixai que estes se retirem” (Jo 18, 4-8).

Os títulos mencionados acima existem no Evangelho somente no sentido que foi submetido à apuração, correção, ao enriquecimento, e à complementação.  Enfim, com o seu nome está fortemente ligada a palavra grega que serve para descrever o messias, e as duas se fundem  em uma só – única em seu gênero – o nome de duas partes: “Jesus Cristo”,  expressando de forma descritiva o ser  extraordinário e  incomum.

De qualquer modo, no Novo Testamento foi preservado, guardado, interpretado e transmitido às futuras gerações  tudo isso o que o próprio Jesus disse mesmo, e não outra coisa. È  justamente este conteúdo também que hoje comunica-se ao homem contemporâneo; o conteúdo que  absolutamente não foi falsificado nem deturpado.  (...)

(KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris,  Éditions Du Dialogue, 1981, p. 67-70)*

Continua...

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*Obs.:Para embasar as minhas pequenas reflexões (simples, diretas e questionadoras) acerca de perguntas que, suponho, perturbam a todos nós, sirvo-me  do  livro do Ferdinand Krenzer- “Morgen wird man wieder Glauben”  e,  usando aqui uma edição desse livro no idioma polonês (Taka jest nasza wiara), faço uma tradução livre (para o português) apontando  alguns trechos, muito bem elaborados pelo autor. É um prazer seguir o seu pensamento.

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