Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Natal: Festa da humanização de Deus e da alforria da humanidade. – Artigo de José Lisboa Moreira de Oliveira. Muito bom!




O Natal está chegando. Dentro de alguns dias estaremos celebrando a grande Festa que deveria ser o “Aniversário” de Nascimento do Menino Jesus. Digo “festa”, porque atualmente talvez para a  maioria das pessoas este é o tempo de feriado, de presentes, de visitas, de enfeites e “papais Noéis”, de muita comida e bebida, de ‘comilança’ (tanto para quem tem condições para isso, como também para quem não tem, porque vai recorrer  ao crédito!), enfim – uma festa!. Aliás,  atualmente a ‘preparação’ para o Natal começa cada vez mais cedo, já em Novembro, bem planejada pelos setores do mercado comercial e econômico. Na verdade, o que está em jogo é conseguir vender mais, ganhar mais, alcançar mais lucros do que no ano passado, etc, etc.  E sem perceber, nós nos deixamos manipular ou permitimos que nos manipulem...  Justificando, dizemos: É tempo de Natal! 
Mas a  pergunta é esta: Que tipo de Natal é este? Que sentido ele tem para nós? (será que ainda tem?).

Para fazer uma boa reflexão sobre o assunto acima, nada melhor do que poder ler um bom artigo. Para isto, trago agora para o blog Indagações o texto “O natal: Festa da humanização de Deus e da alforria da humanidade”  de José Lisboa Moreira de Oliveira, que o autor publicou algumas semanas atrás no seu blog O Chamado. Vale a pena conferir!
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O Chamado
sexta-feira, 29 de novembro de 2013.
 
Natal
 
Natal:  Festa da humanização de Deus e da alforria da humanidade
 
José Lisboa Moreira de Oliveira
Filósofo, teólogo, escritor, conferencista e professor universitário
 
O Natal está de volta. O tempo passa tão rápido, pois a técnica nos dá a sensação de maior velocidade. Anos atrás o tempo custava passar, pois os ritmos eram mais lentos. Andávamos a pé ou a cavalo. Hoje se a internet está lenta ou o avião atrasa alguns minutos, nós ficamos nervosos e impacientes. O risco é de não aproveitarmos bem o tempo que temos e de não curtirmos cada momento de nossa existência. Como membros de uma sociedade estressada, vivemos sempre em função do quem vem logo depois, e não nos damos conta do momento presente e nem guardamos na memória o que vivemos. Terminamos por ser desmiolados e permanentemente nervosos.
 
Nós nos habituamos a celebrar o Natal como sendo a festa do nascimento de Jesus. Porém, não sabemos exatamente quando e onde ele nasceu. Não existem registros confiáveis que nos possam assegurar que Cristo tenha nascido no dia 25 de dezembro. O que se sabe com certeza é que neste dia, no mundo greco-romano, festejava-se o nascimento de Mitra, o deus indo-europeu da luz celeste, considerado o guardião da verdade e inimigo da mentira. Baixo-relevos, ainda conservados, mostram Mitra, ajoelhado diante do Sol em profunda adoração. O culto a Mitra não acontecia em templos, mas em grutas naturais e, posteriormente, em grutas artificiais escavadas nas rochas com essa finalidade (GALIMBERTI, Umberto. Rastros do sagrado. São Paulo: Paulus, 2003, p. 134-138).
 
Também não sabemos com segurança se Jesus nasceu em Belém. Hoje a maioria dos estudiosos da Bíblia acredita que a afirmação do nascimento de Jesus em Belém seja apenas uma construção teológica, inspirada na profecia de Miquéias (5,1), com o objetivo de relacioná-lo com o rei Davi e, assim, identificá-lo com o Messias esperado pelo povo hebreu (PAGOLA, José Antonio. Jesús. Aproximación histórica. Buenos Aires; Claretiana, 2009, p. 41-44). O mais provável e lógico é que Jesus tenha nascido em Nazaré (Jo 1,46). 
Esse tipo de recurso teológico era muito natural naquela época. Um recurso que nós, hoje, podemos estranhar porque trabalhamos com o princípio positivista de que só é verdadeiro o que pode ser empiricamente comprovado, enquanto os escritores da época trabalhavam com simbologias e metáforas. Para eles o importante não era um dado histórico exato, mas o significado simbólico e metafórico de um determinado fato ou personagem. Também não existem registros de que Jesus tenha nascido numa gruta. Essa lenda surge bem depois pela associação da figura de Jesus com o deus Mitra que, como vimos, era cultuado em grutas.
 
Quando o cristianismo se expandiu neste ambiente encontrou esta festa e fez um processo de inculturação. Transformou o nascimento de Mitra na festa do nascimento de Jesus, considerado pelos cristãos a “luz que brilha nas trevas” (Jo 1,5) e que era cheio de pura “graça e verdade” (Jo 1,17). Assim o dies natalis(dia do natal) de Mitra foi sendo transformado em dia do nascimento de Cristo. O culto ao Sol, típico do solstício de inverno do hemisfério norte, foi transferido para a pessoa de Jesus. 
O objetivo dessa extraordinária construção cultural foi introduzir sem muita violência e sem muito impacto sociocultural o culto cristão no ambiente greco-romano. Aliás, cabe dizer que o cristianismo, inteligentemente, realizou o mesmo processo para tantas outras coisas.
 
Sei perfeitamente que alguns cristãos detestam que se fale dessas coisas. Eles acreditam que uma fé genuína pode ser mantida no século XXI com “estórias da carochinha”. Pensam que o cristianismo pode se conservar escondendo certas verdades. Se assim fosse o cristianismo não estaria em crise na Europa, ambiente onde ainda se insiste, dentro das Igrejas, em proclamar como verdade absoluta aquilo que é apenas periférico. Com isso o cristianismo deixa de ser a religião da esperança, da salvação e do sentido da vida, uma vez que, tendo acesso ao conhecimento, as pessoas sabem que não se pode acreditar como sendo historicamente reais estórias como a de “Alice no país das maravilhas”. Se o cristianismo, ao invés de insistir obsessivamente na veracidade histórica de certos episódios, soubesse apresentar o significado simbólico-antropológicoque está por detrás de certas narrativas, ele conseguiria dar aos homens e às mulheres de hoje muito mais esperança (1Pd 3,14-17).
 
Nesta perspectiva é importante dizer que no Natal não celebramos um fato cronológico. Isso pode ficar totalmente em segundo plano. Na festa litúrgica do Natal não celebramos uma data, mas um evento único e extraordinário, que só o cristianismo proclama: “Ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de mulher e sujeito à lei, para pagar a alforria daqueles que estão sujeitos à lei, para que nos seja dado ser filhos adotivos” (Gl 4,4-5). Portanto, o que celebramos no Natal, antes de tudo, é o fato de que o Filho de Deus se humanizou, ou seja, se tornou como nós. E com este fato extraordinário celebramos outro não menos importante: a alforria de toda a humanidade e a sua elevação à categoria de filiação divina.
 
Ao nascer de mulher, isto é, ao assumir a condição humana, Cristo declara totalmente absurda qualquer forma de escravidão das pessoas. De modo que se pode afirmar que o Natal é a celebração da humanidade do Filho de Deus e da divinização da humanidade. Porque Cristo se tornou igual a nós em tudo, exceto no pecado (Hb 4,15), os homens e as mulheres foram elevados à condição de filhos e de filhas de Deus. Por essa razão, para o cristianismo, é inaceitável qualquer coisa que violente a dignidade humana.
 
Desta forma o Natal é a celebração dos relacionamentos humanosmaduros, ou seja, da tomada de consciência de que, em Cristo nascido de mulher, todos nós nos tornamos irmãos e irmãs. Não importa em que data Jesus tenha nascido. Isso, na celebração litúrgica do Natal, é totalmente insignificante. O que importa mesmo é a tomada de consciência de que Deus se humanizou e espera que também nós nos humanizemos. Que as nossas relações sejam sempre mais fraternas, carregadas de afeto e de bondade, de amor e de misericórdia. A troca de presentes na noite de Natal deveria simbolizar esse compromisso. Deveria expressar este nosso sonho, este nosso desejo, este nosso esforço de construir novas relações.
 
Porém, lamentavelmente não é o que acontece. O que continuamos a ver é a mercantilização e a comercialização do Natal. Trocar presentes virou uma obrigação formal, sem nenhuma carga de afeto e de ternura. Por isso a melhor maneira de se celebrar o verdadeiro sentido do Natal seria quebrando essa regra mercantilista e consumista, trocando-a pela gratuidade, pelo amor e pela humanização de nós mesmos. Isso é o que há de mais genuíno e original na celebração natalina. Que tal, ao invés de trocar presentes, trocar muito amor, muita ternura, muito carinho e muita compaixão? Que tal no dia de Natal procurar alguém que conhecemos e que está sofrendo muito por falta de humanidade das pessoas? Que tal dar um abraço bem carinhoso nessa pessoa, olhar em seus olhos e dizer que a amamos?
 
Fonte: Blog O Chamado



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