Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

sexta-feira, 14 de junho de 2013

“A mulher que muito amou.” - uma reflexão incomum de M. Asun Gutiérrez Cabriada. Vale a pena conferir!




Jesus aceita o convite de um fariseu para  fazer uma refeição na  casa dele. Quando está sentado à mesa, entra uma mulher que a  sociedade definia como uma  pecadora, senta aos pés de Jesus, e chorando, lava com as lágrimas os pés  dele, enxuga-os com os cabelos e unge com o óleo precioso.... Que situação constrangedora para o dono da casa... e para muitos outros, de ontem e hoje! Mas, justamente esta é uma lição sem igual...!  Para quem? Por que Jesus age assim? Que lição é esta?
É o texto do Evangelho segundo Lucas (7,36-8,3).

O comentário abaixo, extraordinário, de M. Asun Gutiérrez Cabriada, é uma reflexão muito interessante e esclarecedora.  Não  deixe de ler.
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[Os interessados pedem ler esse texto em apresentação de PPS, acessando o site das Monjas Beneditinas de Montesserrat:  http://www.benedictinescat.com/montserrat/imatges/Dom11C13port.pps    Trabalho muito bonito!]

 Vos asseguro que em qualquer parte
do mundo onde se anuncie a Boa Nova
será recordada esta mulher e o que fez.

Jesus de Nazaré  (Mc 14,9)
 

Comentários:  Asun Gutiérrez Cabriada.

Sem algum fundamento nos Evangelhos, a tradição identifica esta mulher com Maria Madalena, 
Não é Maria Madalena.
Tão pouco é Maria de Betânia, irmã de Marta e de Lázaro (Jo. 12),
Nem outra Maria que também ungiu Jesus, não nos pés mas na cabeça (Mc. 14).
Muitas vezes, devido à injusta (e patriarcal) associação entre pecado feminino e pecado sexual, se identificou esta mulher com uma prostituta, mas o texto não diz em nenhum momento que o fosse.
O que sabemos é que a sociedade a definia como pecadora pública (social) e por isso não pode relacionar-se  com os outros nem com Deus. 
Desconhecemos qual é o seu pecado.
Pode ter sido uma pessoa ritualmente impura, uma prostituta, a esposa de um pecador conhecido...
Este texto de Lucas mostra um dos mais formosos e eloquentes gestos de Jesus.


COMENTÁRIO
[Lucas  7,36 - 8,3]

Naquele tempo, um fariseu convidou Jesus para comer com ele.
Jesus entrou em casa do fariseu e tomou lugar à mesa.

Segundo Lucas, Jesus aparece três vezes convidado por fariseus:
(Luc 7,36; 11,37; 14,1). Nas três ocasiões tem uma atitude crítica para com eles. Jesus aceita o convite, como prova de abertura e de capacidade de diálogo e, ao mesmo tempo, da sua firmeza perante o erro,  a intransigência e a duplicidade de critérios.

Então, uma mulher - uma pecadora que vivia na cidade - ao saber que Ele estava à mesa em casa do fariseu, trouxe um vaso de alabastro com perfume;
pôs-se atrás de Jesus e, chorando muito,
banhava-lhe os pés com as lágrimas
e enxugava-lhos com os cabelos,
beijava-os e ungia-os com o perfume.

A mulher, sem nome como tantas outras, põe-se atrás de Jesus, como autêntica discípula.
A cena superabunda em sensualidade: o tato, os beijos, as lágrimas, o perfume, os cabelos soltos, uma parte o corpo feminino que nunca devia ficar à vista dos homens. São gestos que se tornam escandalosos, abalam todas as normas sociais e religiosas. Jesus sabe que, para a mentalidade farisáica, essa unção é claramente provocativa e indecente e que a sua imagem fica profundamente desvalorizada. Contudo, deixa atuar a mulher sem opor a mínima resistência.

Ao ver isto, o fariseu que tinha convidado Jesus
pensou consigo: «Se este homem fosse profeta,
 saberia que a mulher que o toca
é uma pecadora».

A forma de atuar de Jesus vai contra as normas e leis de honra e de pureza estabelecidas. Jesus não é profeta do deus do fariseu, é profeta do Deus da compaixão e da bondade.
Simão não tolera um profeta que ponha o Reino ao alcance de todos, quando esta universalidade vai contra tudo o que anteriormente tinha sido considerado a vontade de Deus revelada no Templo e na Torá.
O fariseu considera-se justo, perfeito, e com direito a julgar as outras pessoas, como boas ou más, cumpridoras ou pecadoras, segundo os seus esquemas mentais.
Para as pessoas que se crêem perfeitas, melhores que as outros, em posse da verdade, o Evangelho  da compaixão e do perdão gratuito e incondicional não é Boa Notícia, é motivo de escândalo. No tempo de Jesus e nos nossos dias.

Jesus tomou a palavra e disse-lhe: «Simão, tenho uma coisa a dizer-te». Ele respondeu: «Fala, Mestre». Jesus continuou: «Certo credor tinha dois devedores: um devia-lhe quinhentos denários e o outro cinqüenta. Como não tinham com que pagar, perdoou a ambos. Qual deles ficará mais seu amigo?».  Respondeu Simão: «Aquele - suponho eu - a quem mais perdoou».
Disse-lhe Jesus:  «Julgaste bem».

Simão é o único fariseu de quem se conhece o nome, em todo o Evangelho.
Jesus quer transmitir uma mensagem básica na sua pregação e na sua atuação: a importância do amor e do perdão gratuito e incondicional. A misericórdia e a bondade que fazem parte da essência de Deus são manifestadas uma e outra vez nas palavras e na atitude de Jesus.
E voltando-se para a mulher, disse a Simão:
«Vês esta mulher?
Vejo as pessoas?
Como as vejo?
Como as olho?
Considero-me melhor que os outros?
Atrevo-me a menosprezar e julgar  por aparências, etiquetas, preconceitos...?
O olhar de Jesus é de acolhimento, ajuda, proximidade, tolerância, compreensão, perdão, amor...
Olho as pessoas como as olha Jesus?

Entrei em tua casa e não me deste água para os pés; mas ela banhou-me os pés com as lágrimas e enxugou-os com os cabelos. Não me deste o ósculo; mas ela, desde que entrei, não cessou de beijar-me os pés. Não me derramaste óleo na cabeça; mas ela ungiu-me os pés com perfume. Por isso te digo: são-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou;
mas aquele a quem pouco se perdoa,  pouco ama».

Jesus fala a Simão, e a nós, de água, de lágrimas, de beijos, de unguentos e perfumes. Jesus faz destes sinais, cotidianos e simples, sacramentos de amor e de perdão, de vida nova, de ressurreição.
Jesus coloca-se do lado da mulher, do lado da pecadora frente ao justo e puro.
Aparece a palavra chave, amor,  e a radical diferença entre o fariseu e Jesus, entre a antiga lei e a Boa Notícia.
Segundo Jesus ela é a verdadeira anfitriã. Deste modo antecipa o papel de outras mulheres que, com o seu acolhimento, converterão as suas casas em igrejas domésticas, plataforma das primeiras comunidades cristãs.
Depois disse à mulher:
«Os teus pecados estão perdoados».
Então os convivas começaram a dizer entre si:
«Quem é este homem, que até perdoa os pecados?».

Os que reduzem a sua religião à lei, os fariseus, não podem entender o dom gratuito e generoso do Deus de Jesus.  O perdão de Jesus não é a sua resposta ao arrependimento e ao amor da mulher.
O amor da mulher é a resposta agradecida ao perdão - amor gratuito, sem esperar nada em troca, de Jesus.
Experimentar o amor e o perdão gratuito e incondicional do Deus de Jesus  torna-nos livres, capazes de perdoar e de amar.
A maneira de atuar de Jesus ofende a sensibilidade religiosa, não só dos seus contemporâneos mas de muitos cristãos de todos os tempos.
Mas Jesus disse à mulher:
«A tua fé te salvou. Vai em paz».

Esta mulher com sede de Bondade, com ânsia de Deus, comprovou que, por meio de Jesus, Deus se adianta a oferecer acolhimento e perdão e a sua experiência de libertação interior provoca uma resposta de amor e gratidão que a leva a viver de um modo novo.
As palavras de Jesus à mulher são as palavras que Jesus continua a pronunciar. São palavras que devemos estar sempre dispostos a pronunciar.

Depois disso, Jesus ia caminhando por cidades e aldeias,
a pregar e a anunciar a Boa Nova do reino de Deus. 
Acompanhavam-n’O os Doze, bem como algumas
mulheres que tinham sido curadas de espíritos malignos
 e de enfermidades.  Eram Maria, chamada Madalena,
de quem tinham saído sete demónios,
Joana, mulher de Cusa, administrador de Herodes,
Susana e muitas outras, que serviam Jesus
 com os seus bens.

Pela fé e pelo amor, aquela mulher ficou vinculada a Jesus.
É fácil imaginá-la entre as mulheres que acompanhavam Jesus como discípulas, testemunhas de tudo quanto Jesus realizou na Galileia, no caminho para Jerusalém e, em Jerusalém, incluída a última ceia.
Jesus não escolheu nem excluiu por razão de sexos.
Suscitou um discipulado, sem nenhum tipo de discriminação por ser homem ou mulher, que atualmente continua a ser necessário descobrir e realizar.

O que agrada a Deus

Quando entrei em tua casa
tu não me ofereceste água para os pés;
ela, em pelo contrário, me regou-os
com as suas lágrimas
e os secou com o seu longo cabelo.
Tu não me beijaste;
ela, pelo contrário, desde que entrou
não parou de me beijar.
E se passarmos a outras coisas…
Tu estiveste a olhar de esguelha;
ela, com ternura e amor a transbordar
através dos  seus húmidos olhos chorosos.
Tu, no teu foro íntimo, murmuraste
dela e de mim sem receio;
ela me amou como sabe
e me agrada ser amado.
Tu foste bem avarento
e até velhaco;
ela, agradecida
com os seus gestos humanos.
Tu escandalizaste-te;
ela recuperou a sua dignidade perdida
e se salvou…
O banquete terminou.
No te surpreendas.
Deus quer pessoas novas.

Florentino Ulibarri


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