Mais uma entrevista com o cardeal Gerhard Müller, o atual prefeito da Congregação da Doutrina e Fé, publicada recentemente no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Acho muito boa a possibilidade de podermos conhecer mais concretamente a sua opinião (de Gerhard Müller) sobre a Teologia da Libertação. Assim, torna-se possível dispersarmos possíveis dúvidas em relação a esse assunto e, com isso, elaborarmos uma opinião própria mais justa, que corresponda à verdade.
Não
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Notícias
Quinta, 23 de maio de 2013
“É necessário distinguir entre uma Teologia da Libertação equivocada e uma correta”, afirma Gerhard Müller
A
nomeação do cardeal Gerhard Ludwig
Müller para prefeito da Congregação que
se ocupa da ortodoxia da doutrina católica, somada à eleição do arcebispo de
Buenos Aires para bispo de Roma, foi qualificada em alguns ambientes como uma
revanche da Teologia da Libertação, criticada por João Paulo II e pelo
cardeal Ratzinger.
A
decisão do Papa não foi por motivos pessoais: Müller foi nomeado prefeito
porque é um dos mais brilhantes teólogos da Igreja, como demonstra sua carreira
acadêmica.
Em
alguns ambientes católicos a nomeação do bispo de Regensburg para prefeito da
ortodoxia católica suscitou preocupação, porque havia sido acusado de ter
mantido contatos com representantes da Teologia da Libertação e, particularmente, de ter sido amigo do padre
Gustavo Gutiérrez, com quem escreveu o livro Da Parte dos Pobres. Teologia da Libertação.
A
entrevista é de Włodzimierz
Rędzioch e está publicada no sítio Zenit, 20-05-2013. A
tradução é do Cepat.
Eis
a entrevista.
Você,
desde que é sacerdote e também como bispo é muito sensível aos valores da
justiça, da solidariedade e da dignidade da pessoa. Por que este interesse
pelos problemas sociais?
Eu
venho de Mainz e minha cidade, no início do século XIX, teve um grande bispo, o
barão Willhelm
Emmanuel von Ketteler, que foi um precursor da Doutrina Social
da Igreja. Desde criança vivia em um ambiente de empenho social. E não devemos
esquecer que se na Europa do pós Segunda Guerra Mundial e após as diversas
ditaduras conseguimos construir uma sociedade democrática, isto devemos também
à doutrina social católica. Graças ao cristianismo os valores da justiça,
solidariedade e dignidade da pessoa foram introduzidos nas Constituições de
nossos países.
Em
seu currículo vemos que teve muita relação com a América Latina. Como nasceu
esta relação?
Durante
15 anos viajei pela América Latina, estive no Peru, mas também em outros países.
Passava dois ou três meses ao ano vivendo como vivem as pessoas comuns, ou
seja, em condições muito simples. No começo, para um europeu isto é difícil,
mas quando se aprende a conhecer pessoalmente as pessoas e se vê como elas
vivem, então se aceita a situação. Um cristão tem que se encontrar em sua casa
em qualquer parte: onde há um altar Cristo está presente; em qualquer parte se
pertence à família de Deus.
No
ano passado, quando você foi nomeado prefeito da Congregação para a Doutrina da
Fé, alguns o acusavam de ser amigo do padre Gustavo Gutiérrez, fundador da
Teologia da Libertação. O que nos pode dizer sobre isso?
É
verdade que conheço bem o padre Gutiérrez.
Em 1988, me convidaram para participar de um seminário com ele. Fui com alguma
reserva porque conhecia as duas declarações da Congregação para a Doutrina da Fé sobre
a Teologia da Libertação, publicadas em 1984 e em 1986. Entretanto, pude
constatar que é necessário distinguir uma Teologia da Libertação equivocada e
uma correta.
Considero
que cada teologia é boa se parte de Deus e de seu amor e tem a ver com a
liberdade e a glória dos filhos de Deus. Portanto, a teologia cristã que fala
da salvação dada por Deus não pode ser misturada com a ideologia marxista que
fala de uma autorredenção do homem.
A
antropologia marxista é completamente diferente da antropologia cristã, porque
trata o homem como um ser privado de liberdade e dignidade. O comunismo fala da
ditadura do proletariado e a boa teologia, ao contrário, fala da liberdade e do
amor. O comunismo, e também o capitalismo neoliberal, rechaçam a dimensão
transcendente da existência e se limitam ao horizonte material da vida. O
capitalismo e o comunismo são as duas faces da mesma moeda, a moeda falsa. Ao
contrário, para construir o Reino de Deus a verdadeira teologia vem da Bíblia,
dos Padres da Igreja e do Concílio
Vaticano II.
Em
certos ambientes, sua nomeação para prefeito da Congregação que se ocupa da
doutrina católica e a recente eleição do arcebispo de Buenos Aires para bispo
de Roma foram vistos como uma revanche da Teologia da Libertação, criticada por
João Paulo II e pelo cardeal Ratzinger. O que responde a estas vozes?
Em
primeiro lugar, queria destacar que não existe nenhuma ruptura entre Bento XVI e o Papa Francisco no
que se refere à Teologia
da Libertação. Os documentos do então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé
serviram para esclarecer o que era necessário evitar, da maneira de fazer a
Teologia da Libertação à autêntica teologia da Igreja. Minha nomeação não
significa que se abre um novo capítulo nas relações com esta teologia; pelo
contrário, é um sinal de continuidade.
Bento
XVI, ao receber em 2009 um grupo de bispos do Brasil em visita ad limina apostolorum, disse que valia a pena recordar
que em agosto do ano anterior foram comemorados os 25 anos da Instrução
Libertatis Nuntius da Congregação para a Doutrina da Fé, sobre alguns aspectos
da Teologia da Libertação. E acrescentou que “suas consequências mais ou menos
visíveis feitas de rebelião, divisão, discordância, ofensa, anarquia ainda
agora se fazem sentir, criando em nossas comunidades diocesanas grande
sofrimento e uma grave perda de forças vivas”. Concorda com esta análise do
pontífice sobre as consequências da Teologia da Libertação?
Estes
aspectos negativos dos quais fala Bento
XVI são o resultado da mal entendida e mal aplicada Teologia da Libertação.
Estes fenômenos negativos não teriam acontecido se tivesse sido aplicada a
autêntica teologia. As diferenças ideológicas criam divisão na Igreja.
Mas
isto acontece também na Europa onde há, por exemplo, os chamados católicos
progressistas e conservadores. Isto recorda a situação de Corinto, onde havia
quem se referia a Paulo
e quem, ao contrário, se referia a Pedro, ao passo que outros se referiam a
Cristo. Mas todos nós temos que estar unidos em Cristo, porque Deus une, o mal
divide. A teologia que cria as divisões é antes ideologia. A verdadeira
teologia tem que levar a Deus, então não se pode criar divisões.
Excelência,
você, ao receber em 2008 o Doutorado Honoris Causa na Pontifícia Universidade
Católica do Peru, condenou em seu discurso “a infâmia da nossa época: o capitalismo
neoliberal”. O capitalismo neoliberal é uma estrutura do mal?
É
difícil fazer comparações entre uma estrutura do mal e um pecado pessoal,
embora cada pecado tenha uma dimensão social, estando inserido em alguma
‘estrutura’: família, ambiente de trabalho, sociedade, país. O capitalismo
neoliberal é uma daquelas estruturas do mal que no século XIX e XX queriam
eliminar os valores do cristianismo. Mas repito: por trás de cada estrutura
estão as pessoas que aceitam seus princípios, ou seja, por trás de qualquer
estrutura do mal há pecados pessoais.
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