Considero interessante e muito oportuno o artigo Capitalismo? Nem pensar!, do economista Luiz Gonzaga Belluzzo. Por essa razão trago-o também para o blog Indagações-Zapytania. O texto é bem
esclarecedor e as colocações claras e diretas do autor sobre o sistema econômico dominante
no Brasil nos convidam à reflexão crítica.
O artigo foi publicado na
revista Carta Capital e, posteriormente, também no site do Instituto Humanitas
Unisinos (IHU).
Vale a pena ler!
WCejnóg
IHU – Adital
08 Maio 2017
Capitalismo? Nem pensar!
“O Brasil é um país que se precipita
na decadência sem experimentar a civilização”.
A
constatação é de Luiz Gonzaga Belluzzo, economista, em artigo publicado por CartaCapital, 08-05-2017.
Segundo ele,
“em sua Santa Cruzada, o
liberalismo à brasileira amaldiçoou a sinergia entre o público e o privado nos
anos de crescimento acelerado. Exemplo: a privatização das empresas públicas
removeu o arranjo que garantia o desenvolvimento da indústria de bens de
capital. Isso foi decisivo para impulsionar o processo de desindustrialização”.
“Sob os auspícios da mídia-empresa, é quase impossível debater os riscos abrigados na desmontagem dos nexos que articulavam o crédito direcionado, as empresas públicas e o setor privado, nacional e estrangeiro – conclui o economista. Os “liberais” acham que isso não tem a menor importância: bastam a estabilidade e a previsibilidade macroeconômicas para lançar o País numa trajetória do progresso e do bem-estar geral. É certo que, por esses caminhos, chegaremos, enfim, ao sonhado paraíso da economia de mercado. Capitalismo, que dizem ser formidável, nem pensar”.
Depois das políticas "inteligentes" que prometiam tirar o país das armadilhas do capitalismo, restam apostas como a reforma da previdência.
Eis o artigo
Relembrar e
reescrever velhos temas é obrigatório no Brasil, país que se precipita na decadência sem experimentar a
civilização. O tema é velho, mas não tão velho quanto as traquitanas que os
atuais donos do poder pretendem nos impingir.
O leitor de
há de perdoar minha insistência nas velharias contemporâneas. Vou bater na
tecla da industrialização e no seu contrário, a desmontagem do arranjo
institucional que levou o Brasil a transitar do modelo primário-exportador para
a etapa industrial.
Ao longo do
período de 1930 a 1980, o Estado constituiu formas superiores de organização
capitalista, consubstanciadas: 1. Num sistema financeiro público. 2. Em grandes
empresas estatais, replicando o “capitalismo organizado” das industrializações
avançadas. O fato de o Estado coordenar e capitanear a industrialização
conferiu ao capitalismo brasileiro retardatário a condição da economia mais
desenvolvida entre os países da periferia.
O éthos do
desenvolvimento nasceu da aliança entre as camadas empresariais nascentes, o
estamento burocrático-militar, lideranças intelectuais e o proletariado em
formação. O projeto era aproximar o País das formas de produção e de
convivência que não poderiam ser alcançadas através da simples operação das
forças naturais do mercado.
Esse arranjo
de classes sofreu as dores da convivência conflitiva com as oligarquias
agrárias. A repactuação continuada desse compromisso deu sobrevida às mazelas
do colonial-escravismo: a persistência da estrutura agrária; a reprodução e
ampliação das desigualdades sociais, transportadas do campo para a cidade; o
patrimonialismo e o rentismo que assola o sistema financeiro; a eterna revolta contra o
pagamento de impostos por parte dos endinheirados.
O esforço de
cinco décadas empenhado na construção da arquitetura econômico-política
nacional sucumbiu à desorganização dos anos 1980. O colapso do endividamento
externo impulsionou a crise monetária e fiscal que perdurou até o Plano Real.
No
entusiasmo das merecidas celebrações do Plano Real, uma ilustre figura do “Novo Renascimento” chegou a proclamar que os
tempos do nacional-desenvolvimentismo foram “40 anos de burrice”. Quando
prolatada, essa sentença de condenação do passado projetava o poder e o
prestígio do real forte.
Era, então,
de mau gosto, para não dizer quase proibido, lembrar que o prolongado desfile
de burrice, afinal, liberou o Brasil e os brasileiros da dependência da
exportação de café e de outros produtos agrícolas menos votados – além do
bicho-de-pé, da febre amarela e da hemoptise –, forjando a mais importante
economia urbano-industrial do então chamado Terceiro Mundo.
Não por
acaso, a febre amarela está de volta. A década perdida dos 1980 revigorou a
febre liberal-cosmopolita das camadas dominantes, fazendo caducar os
compromissos firmados em torno do objetivo comum do desenvolvimento.
Desde então,
o liberalismo à brasileira retornou às suas origens: autoritário, oferece aos
enriquecidos o roteiro para a disseminação das ilusões que vão eternizar as
realidades do crescimento meia-boca. No mesmo realejo tocam a ladainha do
“populismo”, para enquadrar os recalcitrantes que insistem na garantia dos
direitos das classes subalternas. As reformas modernizantes fazem conluio com
os ranços e rancores que ora predominam no âmbito político-jurídico.
Nos anos
1990, as políticas “inteligentes” sugeridas pelo consórcio dos ricos, bonitos e
cosmopolitas prometiam tirar o País das armadilhas do capitalismo organizado.
Depois de 20 anos de privatizações, câmbio valorizado, importações predatórias
e submissão aos poderes da finança desregulada, restam as apostas na
flexibilização do mercado de trabalho e na reforma da Providência.
Em sua Santa Cruzada, o liberalismo à brasileira
amaldiçoou a sinergia entre o público e o privado nos anos de crescimento
acelerado. Exemplo: a privatização das empresas públicas removeu o arranjo que
garantia o desenvolvimento da indústria de bens de capital. Isso foi decisivo
para impulsionar o processo de desindustrialização.
Sob os
auspícios da mídia-empresa, é quase impossível debater os riscos abrigados na
desmontagem dos nexos que articulavam o crédito direcionado, as empresas
públicas e o setor privado, nacional e estrangeiro. Os “liberais” acham que isso não tem a menor importância: bastam a estabilidade e a previsibilidade
macroeconômicas para lançar o País numa trajetória do progresso e do bem-estar
geral. É certo que, por esses caminhos, chegaremos, enfim, ao sonhado paraíso
da economia de mercado. Capitalismo, que dizem ser formidável, nem pensar.
Fonte:
IHU – Adital
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