Abaixo, um excelente artigo "Quem são os que não
aceitam Lula?",
do economista Luiz Gonzaga Belluzo*. Penso que a
sua leitura pode auxiliar bastante a quem realmente procura entender os recentes
fatos (o julgamento e condenação sem apresentar provas do ex-presidente do
Brasil Luiz Inácio Lula da Silva) e a
situação política e social do nosso Brasil. Isso é importante para poder
construir uma opinião própria, mais objetiva e justa.
Vale a pena ler!
WCejnóg
07 Março 2018
Quem
são os que não aceitam Lula?
O artigo é de Luiz Gonzaga Belluzzo, economista, publicado por CartaCapital,
07-03-2018.
(O
ex-presidente Lula após coletiva de imprensa, em São Paulo)
Quinta-feira 1º de março, a Folha de S.Paulo estampou
longa entrevista com o ex-presidente Lula. Depois de marchas e contramarchas,
a jornalista Mônica
Bergamo pergunta: “O senhor fala: ‘Eles não me aceitam’. Quem
são eles?”. Lula responde: “Ah não sei. São eles.
Eu não vou ficar nominando”.
“Quem são eles?”
Em tempos idos, a pergunta suscitaria
a velha perplexidade: “Agora é que são elas”. O Novo Dicionário de Expressões
Idiomáticas, editado em Portugal em 2006, registra o sentido
da expressão: “Exclamação com que o orador reconhece estar perante uma séria
dificuldade”. Confrontados com as ambiguidades da condição humana, os da antiga
tinham coragem para manifestar dúvidas a respeito da própria sabedoria.
“Quem são eles?’
Depois de reafirmar o “orgulho com seu
governo, período em que os empresários mais ganharam dinheiro, os trabalhadores
mais ganharam aumento de salário, em que geramos mais empregos etc.”, Lula absolveu os donos dos bancos.
Assestou baterias contra “o bando de yuppies, jovens bem aquinhoados que vivem
ganhando dinheiro através dos bônus, de não sei das quantas, para vender papel,
sem vender um produto”.
Dos baixios de minhas insuficiências,
vou arriscar uma aventura quase filosófica. “Eles” são uma construção dos
processos de abstração real que comandam a vida dos homens e mulheres nas
sociedades contemporâneas. As
corporeidades, identidades e individualidades estão aglutinadas em um bloco de
interesses classistas, visões do mundo, modos de vida, preconceitos,
ancestralidades meritocráticas e escravagistas. A embolada social-ideológica
carrega os senhores do dinheiro e seus yuppies.
As engrenagens impessoais da abstração
real e da homogeneização das individualidades foram explicitadas nos cordéis
da Escola de Samba Paraíso do Tuiuti. Os cordéis manipulam os movimentos
dos manifestoches da Avenida Paulista, a
ignorância e grosseria das redes sociais, os acarpetados escritórios ocupados
por mesas de operação das instituições financeiras, nas redações cada vez mais
obedientes e menos inquietas.
Para essa turma, a eleição de Lula foi
a realização do inaceitável. Pouco importa se ganharam muita grana e
abasteceram generosamente seus cofres com inúteis e danosas apostas nos
mercados de derivativos de câmbio e juros, sempre e cada vez mais respondendo
aos movimentos dos mercados financeiros globalizados.
Minha ousadia de recorrer à
quase-filosofia exige repetir as considerações de Gilles Deleuze a respeito da Filosofia e das Potências.
Gillles Deleuze, o filósofo, dizia que a
“filosofia (e eu acrescentaria a economia política) é inseparável de uma cólera
contra a época, mas não é uma Potência.
As religiões, os Estados, o capitalismo, a ciência, o direito, a opinião e a
mídia são Potências, mas não a filosofia. ... Não sendo Potência, a filosofia
não pode empreender uma batalha contra as Potências: em compensação trava com elas
uma guerra sem batalhas, uma guerra de guerrilhas. Não pode falar com elas,
nada tem a lhes dizer, nada a comunicar, e apenas mantém conversações”.
As Potências estão
desinteressadas em sufocar a crítica ou as ideias desviantes. Elas se dedicam a
algo muito mais importante: fabricam os espaços da literatura, do econômico, do
político, espaços completamente reacionários, pré-fabricados e massacrantes.
“É bem pior que uma censura”,
continua Deleuze,
“pois a censura provoca efervescências subterrâneas, mas a reação quer tornar
tudo isso impossível.”
Nesses espaços fabricados pelas
Potências talvez seja até mesmo impossível manter conversações, porque a norma
não é a crítica racional, mas o exercício da animosidade sob todos os seus
disfarces, da agressividade a propósito de tudo e de todos, presentes ou
ausentes, amigos ou inimigos. Não se trata de compreender o outro, mas de
vigiá-lo. “Estranho ideal policialesco, o de ser a má consciência de alguém.”
Alguns senhoritos da mídia,
transformando a opinião em Potência,
abandonam a crítica pela vigilância e a vigilância exige convicções esféricas,
maciças, impenetráveis, perfeitas. A vigilância deve adquirir aquela solidez
própria da turba enfurecida, disposta ao linchamento. Só um insensato, em meio
à perseguição, tentaria explicar alguma coisa a esse bando enlouquecido.
O filósofo Franco Berardi vai
além e conclui que o vendaval de abstrações e imediatismos produzido pelos
mercados financeiros, pela mídia e pelas tecnologias de informação capturou as
energias cognitivas da sociedade. De um lado, diz ele, são ondas avassaladoras
de sofrimento mental e, de outra parte, a depressão e o rebaixamento
intelectual encontram remédio no fanatismo e
no fascismo.
Fonte: Carta Capital
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* Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo (Bariri, 29 de outubro de 1942[1]) é um economista e professor brasileiro da Universidade Estadual de Campinas e da Faculdades de Campinas (In: wikipedia)
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