“A vida
eterna” não é o ponto de chegada, mas um modo de viver cada instante de modo
novo, profundo e coerente." (do comentário abaixo)
O
episódio bíblico A mulher Samaritana e Jesus (Jo 4, 5-42) é muito conhecido e bastante comentado.
Porém, sempre podemos descobrir novos detalhes e elementos.
Abaixo,
o comentário bíblico sobre esse texto, de M. Asun Gutiérrez Cabriada, é muito completo e interessante. É uma
excelente oportunidade para aprofundar a reflexão.
WCejnog
Obs.:
Os interessados podem ler esse texto em
apresentação de PPS, acessando o site
das Monjas Beneditinas de Montserrat. benedictinescat.com/montserrat Trabalho
muito bonito!
O ser humano não tem só
sede:
É SEDE!
Comentário
Naquele tempo, chegou Jesus a uma cidade da Samaria,
chamada Sicar, junto de propriedade
que Jacó
tinha dado a seu filho José, onde
estava a fonte de Jacó.
Jesus, cansado da caminhada, sentou-se à beira do poço.
Era por volta do meio dia.
Veio uma mulher da Samaria para tirar água.
Disse-lhe Jesus:
- Dá-me de beber.
Os discípulos tinham ido à cidade comprar alimentos.
Os
samaritanos são pessoas desprezadas pelos judeus. Jesus atua com total
liberdade, não lhe importam os preconceitos que proibiam a conversa pública com
uma mulher, interessa-lhe que ela solucione a sua vida. Jesus, cansado e
sedento encontra uma mulher sedenta.
Boa
oportunidade para refletir nas situações nas quais Jesus sai ao meu encontro ou
eu vou ao seu.
Que me
pede? Que Lhe peço? Que me oferece? Que Lhe ofereço? Tenho sede? De que
tenho sede?
Onde, em
quem descubro hoje a Jesus cansado, sedento, dizendo-me «dá-me de beber»?
Respondeu-Lhe a samaritana:
- Como é que Tu, sendo judeu, me pedes de beber,
sendo eu samaritana?
De fato, os judeus não se dão com os samaritanos.
Disse-lhe Jesus:
- Se conhecesses o dom de Deus
e quem é Aquele que te diz ‘Dá-me de beber’,
tu é que lhe pedirias e Ele te daria água viva.
Aparentemente
a samaritana tem tudo para matar a sede: o poço, o balde, a corda, o
cântaro....
Jesus
fala de outros poços, de outras águas, de outros desejos, de outra sede.
Fala do
dom de Deus, o Espírito, alegria indizível, paz contagiosa, liberdade plena,
força criadora..., que nos lava, sacia os nossos desejos e nos faz desejar
mais, nos fecunda, nos vivifica, nos pacifica, nos torna livres, e nos enche de
tudo o que podemos desejar, em plenitude.
Respondeu-Lhe a mulher:
- Senhor, Tu nem sequer tens um balde,
e o poço é fundo: donde Te vem a água viva?
Serás Tu maior que o nosso pai Jacó,
que nos
deu este poço,
do qual ele mesmo bebeu,
com os seus filhos e os seus rebanhos?
Porventura Te consideras maior que ele?
Disse-lhe Jesus:
- Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede.
Mas aquele que beber da água que Eu lhe der,
nunca mais terá sede: a água que Eu lhe der
tornar-se-á nele uma nascente
que jorra para a vida eterna.
Jesus
vai-se revelando ao ritmo das inquietações que descobre na mulher. Não a
acabrunha nem condena, mas fala-lhe com palavras que a vão levando de desejo em
desejo, de verdade em verdade, fazendo-a sair de si mesma para se abrir ao dom
de Deus.
“A vida
eterna” não é o ponto de chegada, mas um modo de viver cada instante de modo
novo, profundo e coerente.
Suplicou a mulher:
- Senhor, dá-me dessa água,
para que eu não sinta mais sede
e não tenha de vir aqui buscá-la.
“Dá-me
dessa água” que me alivia o cansaço dos
caminhos e a tortura da sede,
essa
água que me liberta de tantas desilusões,
essa
água que me aclara o olhar e limpa o meu coração,
que
fecunda o meu deserto e me enche de felicidade e de vida.
Disse-lhe Jesus: - Vai chamar o teu
marido e volta aqui.
Respondeu-Lhe a mulher: - Não tenho
marido.
Jesus replicou: - Disseste bem que não tens marido,
pois tiveste cinco, e aquele que tens agora
não é teu marido.
Neste ponto falaste verdade.
Os cinco
maridos simbolizam os ídolos com os quais Samaria se tinha prostituído (2 Re
17, 24-41; Os 2, 4-25). A samaritana não tem marido, não tem o verdadeiro Deus.
Jesus substitui todos os seus deuses.
A mulher
sedenta é um bom retrato duma humanidade que busca, porque não está satisfeita,
que tem sede, não só de água, mas de
felicidade, de justiça, de verdade, de liberdade, de beleza, de Deus... e não
sabe bem a que poço poderá acudir.
Disse-Lhe a mulher: - Senhor, vejo que és profeta.
Os nossos antepassados adoraram neste monte,
e vós dizeis que é em Jerusalém que se deve adorar.
Disse-lhe Jesus: - Mulher, podes acreditar em Mim:
vai chegar a hora em que nem neste monte
nem em Jerusalém adorareis o Pai.
Vós adorais o que não conheceis;
nós adoramos o que conhecemos,
porque a salvação vem dos judeus.
Mas vai chegar a hora – e já chegou –
em que os verdadeiros adoradores hão-de adorar o Pai
em espírito e verdade…
Jesus
vai descobrindo a necessidade duma relação nova com o Pai, mais além do culto
institucionalizado ou de um lugar determinado.
Já
chegou a hora de dar culto "em espírito e em verdade”. Os ritos
exteriores, as normas estéreis, a categoria dos templos já não têm capacidade
para matar a sede de Deus. O fundamental é o compromisso interior da pessoa. Podemos
aprender a lição. O autêntico culto ao Pai não pode reduzir-se a um ritual rotineiro nem ficar “sequestrado” no
templo, mas traduzir-se na vida vivida
ao estilo de Jesus. Jesus encontra-nos e
encontramo-l’O nos irmãos, na alegria,
na tristeza, na esperança, na solidariedade..., em tudo o que faz parte da vida
cotidiana dos seus filhos e filhas.
… pois são esses os adoradores que o Pai deseja.
Deus é espírito e os seus adoradores
devem adorá-l’O em espírito e verdade.
O amor
de Jesus não tem limites, o Deus que Ele anuncia não cabe nos espaços que se
constroem para Ele. Não é a pertença a uma instituição, mas a forma de nos
relacionarmos com os outros e com o mundo que define a nossa relação com o Pai
de todos.
Disse-Lhe a mulher:
- Eu sei que há-de vir o Messias, isto é,
Aquele que chamam Cristo.
Quando vier, há-de anunciar-nos todas as coisas.
- Respondeu-lhe Jesus:
- Sou Eu, que estou a falar contigo.
Nisto, chegaram os discípulos e ficaram admirados
por Ele estar a falar com aquela
mulher,
mas nenhum deles Lhe perguntou:
‘Que pretendes?’ ou então: ‘Porque falas com ela?’
Jesus é
a resposta a todas as formas de sede que há na humanidade e a toda a busca de
luz e de vida.
Jesus
supera barreiras, rompe modelos, apesar da surpresa e do escândalo que
continuamente provoca, até nos mais próximos.
A mulher deixou a bilha, correu à cidade e falou a todos:
- Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz .
Não será ele o Messias?
Eles saíram da cidade e vieram ter com Jesus.
Quando a
mulher descobre que o seu desejo mais profundo só se pode saciar
no “poço de Jesus” deixa o cântaro, já
não necessita apoios exteriores. É uma
mulher nova. Ela mesma se converteu em manancial de “água viva”, semeadora do Evangelho e em apóstola do seu
povo.
O
encontro com Jesus leva a partilhar essa experiência e ao compromisso com o
anúncio da Boa Notícia.
Jesus
aproveita o nosso poço para descansar e fazer-se o encontrado com todos os
sedentos necessitados da água que limpa, refresca, dá alegria, paz, esperança,
vida ....
Entretanto, os discípulos insistiam com Ele, dizendo:
- Mestre, come.
Mas Ele respondeu-lhes:
- Eu tenho um alimento para comer que vós não conheceis.
Os discípulos perguntavam uns aos outros:
- Porventura alguém Lhe trouxe de comer?
Disse-lhes Jesus:
- O meu alimento é fazer a vontade d’Aquele
que Me enviou e realizar a sua obra.
Não dizeis vós que dentro de quatro meses
chegará o tempo da colheita? Pois bem, Eu digo-vos:
Erguei os olhos e vede os campos,
que já estão loiros para a ceifa.
Já o ceifeiro recebe o salário e recolhe
o fruto para a vida eterna e, deste modo,
se alegra o semeador juntamente com o ceifeiro.
Nisto se verifica o ditado:
‘Um é o que semeia e outro o que
ceifa’.
Eu mandei-vos ceifar o que não trabalhastes.
Outros trabalharam e vós aproveitais-vos do seu trabalho.
Jesus
alimenta-se da sua união com o Pai. “Fazer” a sua vontade não é só aceitá-la
com plena confiança, mas cooperar na sua realização. A obra do Pai é a missão
de Jesus e dos seus seguidores e seguidoras.
Muitos samaritanos daquela cidade
acreditaram em Jesus, por causa
da palavra da mulher, que testemunhava:
- ‘Ele disse-me tudo o que fiz
Por Isso os samaritanos, quando
vieram ao encontro de Jesus,
pediram-Lhe que ficasse com eles.
E ficou lá dois dias.
Ao ouvi-l’O, muitos acreditaram e diziam à mulher:
- Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos.
Nós próprios ouvimos e sabemos que Ele
é realmente o Salvador do mundo.
A
samaritana, cheia da Palavra que a ilumina e a queima por dentro, converteu-se
em evangelista e testemunha de Jesus. Mulher
e testemunha. Samaritana e evangelista.
O
Espírito não distingue sexos, raças nem religiões. O seu testemunho, cheio de
capacidade de convicção e de paixão, leva os samaritanos a uma experiência
pessoal de Jesus, a crer n’Ele.
Que,
como a a samaritana, o encontro com Jesus nos impulsione a ser doadores de água
viva e testemunhas da Boa Notícia.
Sedento
Dá-me de beber.
Tão sedento estás que não
reparas em quem sou?
Dá-me de beber.
Estás a brincar, Senhor?
Dá-me de beber.
Que esquemas queres
romper?
Não me perguntes. Tu, dá-me
de beber.
Era o que me faltava
ouvir isso de ti!
Dá-me de beber...
Eu não tenho água, mas
sede...
Dá-me, pois, a tu sede.
...//...
Ulibarri Fl.