Abaixo, mais um comentário bíblico sobre o texto bíblico Mt 14, 22-33 (Jesus aparece andando sobre as águas e acalma
a tempestade). É de autoria do italiano Enzo Bianchi.
O texto foi publicado no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Não deixe de ler!
WCejnóg
IHU
- ADITAL
11 agosto 2017.
“Coragem! Eu sou. Não
tenham medo!”
Publicamos aqui o
comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose,
sobre o Evangelho deste 19º Domingo do Tempo Comum,
13 de agosto (Mt 14, 22-33). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
(...)
Mas eis que, de
repente, o Jesus solitário e orante na montanha torna-se o Jesus
Senhor sobre as
águas tempestuosas. A barca dos discípulos, durante a travessia noturna do
lago, encontra-se no meio da tempestade, é jogada pelas ondas por causa do
forte vento contrário. Parece uma noite interminável, em que os discípulos
lutam contra as ondas, na densa escuridão e no medo. Como não ver nessa barca
um ícone da comunidade de Jesus, da Igreja?
Os Padres da Igreja sempre interpretaram assim essa barca longe da margem e jogada pelas ondas (apò tês ghês apeîchen basanizómenon hypò tôn kymáton). Em todas as horas da história, a barca dos discípulos de Jesus se cruza com ventos contrários e tempestades: não pode ser de outra forma neste mundo, onde, contra os discípulos de Jesus, desencadeiam-se, muitas vezes, oposições, inimizades, perseguições. Alguns dizem que o tempo atual é um tempo em que “a barca se encheu de água quase até virar”, e é verdade; mas eu diria que, sempre, hoje como ontem, enquanto a barca não atracar nas margens do reino de Deus, será assim.
O verdadeiro problema não está na tempestade, mas no medo daqueles que estão na barca, porque o medo é sinal de pouca fé no Senhor, que, embora não esteja na barca, no entanto, é o Senhor da terra e do mar, de toda a história que, nas suas mãos, continua e continuará sendo história de salvação.
Perto do fim da noite, os discípulos na barca veem alguém que caminha sobre as águas vindo na direção deles; mas, em vez de captar naquela figura Jesus, o Senhor, eles pensam que é um fantasma e têm medo ao ponto de gritarem. Mas Jesus, estando sobre as águas, tranquiliza-os: “Coragem! Eu sou. Não tenhais medo!”. Não é um fantasma que dá medo, mas é Jesus, Senhor sobre os abismos da morte, sobre os vórtices e as ondas da vida, que vem e pede para derrotar o medo, para exercer a coragem e a fé, a confiança, porque ele é “Eu sou”.
Aqui aparecem nos
lábios de Jesus o Nome santo e glorioso de Deus
revelado a Moisés(cf. Ex 3, 14)
e repetido pelos profetas: “Eu sou” (Egó
eimi). Aquele que parece ausente, na verdade está presente mais do
que nunca, e a sua barca continua sendo a sua barca, quer ele não esteja sobre
ela, quer ele se encontre nela e durma apoiado em um travesseiro (cf. Mc 4,37;
Mt 8, 24). E sempre, quando Jesus vem ao nosso encontro, antes de discernirmos
plenamente a sua presença, ele nos diz: “Coragem, não temais!”.
Pedro, segundo Marcos e Mateus, o primeiro chamado (cf. Mc 1, 16; Mt 4, 18), reage dizendo: “Senhor (Kýrie), se és tu, manda-me ir ao teu encontro, caminhando sobre a água”. Ele gostaria de ser dotado dos poderes de Jesus, gostaria de ser Senhor das águas, e, então, quase o tenta: chama-o de Senhor, com fé, mas o que ele quer tentar?
Jesus lhe responde: “Vem!”. E Pedro desce da barca e caminha sobre as águas em direção a ele; mas, assim que sente a potência do vento, tem medo e começa a afundar, gritando: “Senhor, salva-me!”. Ele tentou, mas não foi capaz de permanecer em pé sobre as águas do mar da Galileia e, afundando, deve compreender a própria fraqueza, a própria incapacidade de se manter à tona, o que o leva a invocar o Senhor.
Repito, Pedro compreende a própria fraqueza e debilidade: a de um “homem de pouca fé” – como Jesus o define – que tem medo, que às vezes tenta o Senhor, mas que, em todo o caso, é trazido de volta à consciência da própria miséria. É assim que ele aprende a verdade daquela exclamação profundamente cristã que será cunhada por Bernard de Claraval: “Optanda infirmitas!”, “Ó desejável, abençoada fraqueza!” (Discursos sobre o Cântico dos Cânticos 25, 7).
Sim, Jesus aceita a fraqueza da nossa fé e nos estende a mão todas as vezes que nós caímos ou nos afundamos. Pedro ainda conheceria essa experiência, quando, depois de renegar Jesus, sentiria novamente uma mão sendo estendida a ele, através do olhar do Senhor que se volta para ele (Lc 22, 61). “Kýrie eleison!”, “Senhor, tem piedade de mim!”, eis a oração do cristão sempre, oração que, no profundo do coração, deve ser presença constante, pronta para se tornar palavras que se fazem invocação, em cada momento de consciência da própria fragilidade.
Depois, Pedro e Jesus sobem novamente na barca, e o vento cessa. Então, todos os outros se prostram diante de Jesus e confessam: “Verdadeiramente, tu és o Filho de Deus!”, mostrando que compreenderam a palavra de Jesus (“Eu sou”) e reconhecendo nele o Senhor, o Kýrios.
O caminho da Igreja, de cada comunidade cristã, de cada um de nós conhece e conhecerá contrariedade, horas de medo, sofrimentos e dificuldades. Quem pensa queJesus Cristo é um “fantasma”, uma miragem, mostra que não tem a fé necessária para se dizer e ser seu discípulo e não consegue ir ao seu encontro, alcançá-lo. Mas quem tem fé, às custas de caminhar sobre águas tempestuosas – metáfora muito eficaz –, consegue ficar atrás de Jesus, encontrá-lo como o Senhor que lhe diz: “Não tenhais medo, Eu sou!”.
Pedro, segundo Marcos e Mateus, o primeiro chamado (cf. Mc 1, 16; Mt 4, 18), reage dizendo: “Senhor (Kýrie), se és tu, manda-me ir ao teu encontro, caminhando sobre a água”. Ele gostaria de ser dotado dos poderes de Jesus, gostaria de ser Senhor das águas, e, então, quase o tenta: chama-o de Senhor, com fé, mas o que ele quer tentar?
Jesus lhe responde: “Vem!”. E Pedro desce da barca e caminha sobre as águas em direção a ele; mas, assim que sente a potência do vento, tem medo e começa a afundar, gritando: “Senhor, salva-me!”. Ele tentou, mas não foi capaz de permanecer em pé sobre as águas do mar da Galileia e, afundando, deve compreender a própria fraqueza, a própria incapacidade de se manter à tona, o que o leva a invocar o Senhor.
Repito, Pedro compreende a própria fraqueza e debilidade: a de um “homem de pouca fé” – como Jesus o define – que tem medo, que às vezes tenta o Senhor, mas que, em todo o caso, é trazido de volta à consciência da própria miséria. É assim que ele aprende a verdade daquela exclamação profundamente cristã que será cunhada por Bernard de Claraval: “Optanda infirmitas!”, “Ó desejável, abençoada fraqueza!” (Discursos sobre o Cântico dos Cânticos 25, 7).
Sim, Jesus aceita a fraqueza da nossa fé e nos estende a mão todas as vezes que nós caímos ou nos afundamos. Pedro ainda conheceria essa experiência, quando, depois de renegar Jesus, sentiria novamente uma mão sendo estendida a ele, através do olhar do Senhor que se volta para ele (Lc 22, 61). “Kýrie eleison!”, “Senhor, tem piedade de mim!”, eis a oração do cristão sempre, oração que, no profundo do coração, deve ser presença constante, pronta para se tornar palavras que se fazem invocação, em cada momento de consciência da própria fragilidade.
Depois, Pedro e Jesus sobem novamente na barca, e o vento cessa. Então, todos os outros se prostram diante de Jesus e confessam: “Verdadeiramente, tu és o Filho de Deus!”, mostrando que compreenderam a palavra de Jesus (“Eu sou”) e reconhecendo nele o Senhor, o Kýrios.
O caminho da Igreja, de cada comunidade cristã, de cada um de nós conhece e conhecerá contrariedade, horas de medo, sofrimentos e dificuldades. Quem pensa queJesus Cristo é um “fantasma”, uma miragem, mostra que não tem a fé necessária para se dizer e ser seu discípulo e não consegue ir ao seu encontro, alcançá-lo. Mas quem tem fé, às custas de caminhar sobre águas tempestuosas – metáfora muito eficaz –, consegue ficar atrás de Jesus, encontrá-lo como o Senhor que lhe diz: “Não tenhais medo, Eu sou!”.
Fonte: IHU - ADITAL
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