Agora a questão é a frequente dúvida dos
homens e mulheres do nosso tempo, e principalmente dos adolescentes e jovens,
se realmente são necessários todos esses
ritos litúrgicos que a Igreja realiza, convidando e chamando todos os fiéis
para participarem ativamente. Para quê isso? – perguntam. Já que Jesus disse
que o mais importante e decisivo é servirmos ao
próximo, principalmente na pessoa do pobre, faminto, doente, enfermo, e
migrante - não seria suficiente, então, dedicarmo-nos só a isso? A participação
das celebrações, Missas, Cultos – poderíamos dispensar. Precisamos realmente
participar pessoalmente dessas celebrações litúrgicas?
Sobre isso trata o texto abaixo, de
autoria de Ferdinand Krenzer¹. A leitura
é fácil.
Não deixe de ler.
WCejnog
[Para aproveitar melhor a abordagem deste tema, é aconselhável ler desde o início todas as postagens que se referem a este assunto (começo no dia 3 de junho de 2012: Corpus Christi. Algumas indagações)].
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Servir ao mundo ou servir a Deus
Servir ao mundo ou servir a Deus
Voltamos para falar do questionamento já mencionado
anteriormente (no início das reflexões sobre os ritos litúrgicos católicos):
Será que, em certas circunstâncias, não deveríamos desistir totalmente do
serviço a Deus e apenas limitar-nos a servir às pessoas e ao mundo? Não se
serve a Deus servindo às pessoas? Precisamos mesmo impor um caráter sacro ao
nosso serviço aos nossos semelhantes?
Temos que tratar esta colocação com muita seriedade. Já o São Paulo
dizia: “Eu vos exorto, pois, irmãos, pela
misericórdia de Deus, que vos ofereçais em vossos corpos, como hóstia viva,
santa, agradável a Deus. Este é o vosso culto espiritual. Não vos conformeis
com os esquemas deste mundo mas transformai-vos pela renovação do espírito,
para que possais conhecer qual é a vontade de Deus, boa, agradável e perfeita.”
(Rm 12, 1-; e no outro lugar: “Quer comais, quer bebais, quer façais
qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus.” ( 1 Cor 10, 31)
Portanto, a própria vida humana é
um louvor a Deus. Não há nenhuma separação entre o que é leigo e que é religioso;
tudo é o “ambiente Divino” (Teilhard de Chardin). Sem esse serviço que visa o
mundo toda oração e todo o culto estaria
sem base e sentido.
Entretanto, seria algo muito
arbitrário considerar como dispensáveis os ritos litúrgicos que (como tais) são
celebrados pela reunida comunidade
dos fiéis. Se queremos tratar
seriamente o mundo e as pessoas que vivem a nosso lado, precisamos ver tudo
como “um todo”, e de modo especial em relação a Deus. Ser cristão não se esgota
numa relação correta para com o próximo.
O cristão sabe que é criatura de Deus e que
foi salvo (quer dizer que Deus o ama), e portanto ele precisa expressar isso de alguma forma. Para
o homem de fé a oração e a vida no mundo devem-se entrelaçar. Por exemplo,
quando estamos no trabalho ou na escola - as nossas atitudes fundamentais devem
permanecer fieis a Deus; quando rezamos
– devemos estar com os nossos “pés no
chão”.
O fato é que nós, humanos, de modo geral, conseguimos agir e fazer as
coisas somente numa sequência de tempo: uma coisa a cada vez. Até mesmo os
nossos pensamentos não conseguem concentrar-se sempre no mesmo ponto. Por isso
também temos a necessidade de nos
dirigirmos, pelo menos de vez enquanto, expressivamente e exclusivamente a
Deus. Isso não nos prejudica em nada em nossa vida diária; ao contrário, nos
mobiliza mais ainda para vivermos intensamente a nossa vida no mundo. Porque
Deus e o mundo são como os dois focos de
uma mesma elipse, em volta da qual
circula a nossa devoção.
Seria, por exemplo, algo
simplesmente desumano, se estivéssemos só trabalhando sem refletir sobre o nosso trabalho e o seu sentido. Também,
igualmente, seria desumano no casamento, se um cônjuge fosse fiel ao outro, mas
sem a mútua simpatia e amor expressados em
palavras, presentes e carinho. A verdade é que o que não se faz conscientemente
e o que não se exterioriza – é condenado a perder a vitalidade e se tornar
distorcido.
É humano, portanto, proclamar
conscientemente e com clareza o nosso amor a Deus,
o nosso louvor e gratidão. Quando servimos a Deus com retidão – o nosso serviço
ao mundo e aos irmãos não fica em nada diminuído. Ao contrário, o significado
do mundo se torna claro para nós e nos
leva a louvar mais ainda a Deus; os ritos e celebrações litúrgicas, por sua
vez, nos enviam para servirmos a Deus no
mundo. Não pode ter aqui nenhum “ou (a Deus) – ou (ao mundo)”, mas unicamente
“tanto (a Deus) – como (ao mundo)”.
Quando um cristão participa
retamente das celebrações litúrgicas, ele não muda nem se transforma ao entrar pela porta da igreja.
Nesse tempo ele não se afasta do mundo, mas
traz o mundo para a igreja. E durante os ritos litúrgicos as nossas
atitudes e ações diárias ficam confrontadas com a Palavra de Deus e dela
recebem estímulos. É claro que depende de cada um pessoalmente, de que jeito
ele co-participa desses ritos e até que ponto consegue lançar a ponte entre
eles e a vida cotidiana.
Descrevendo a Última Ceia, São João
informa que ela foi precedida por uma cerimônia muito expressiva: Jesus Cristo
lavou os pés aos seus discípulos, quer dizer, se fez um servo para eles, e lhes
ordenou: “Se eu, pois, Mestre e Senhor, vos lavei os pés, também vós deveis
lavar-vos os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo para que, como vos fiz,
assim também façais vós.” (Jo 13, 14-15)
Isto é um exemplo para eles e para
todos os cristãos, para que sirvam-se mutuamente. Essa foi uma das ordens dadas
naquela hora. A outra, também dita nessa mesma hora, era: “Fazei isto (quer
dizer a cerimônia da Última Ceia) em
memória de mim”. Deste jeito tanto uma como a
outra ordem de Jesus Cristo devem ser realizadas e “entrelaçar-se” –
conforme a vontade de Cristo.
(KRENZER, F. Taka
jest nasza wiara, Paris, Éditions Du
Dialogue, 1981, p. 279-280)²
Continua...
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¹
Ferdinand Krenzer é um teólogo católico alemão, pastor, aposentado
e escritor.
²Obs.: As reflexões do Ferdinand Krenzer
fascinam pelo seu jeito simples e direto, e agradam o leitor, ajudando-o a
entender melhor o caminho da fé cristã e compreender os temas mais difíceis
desta doutrina.
Os textos publicados neste blog são
tomados do livro Taka jest nasza wiara, desse autor; uma edição no idioma
polonês, do qual faço uma tradução livre (para o português). O título original: “Morgen wird man wieder
Glauben”.
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