Atualmente muitas pessoas, e sobretudo os jovens, questionam a
opinião de que a Igreja como
instituição seja indispensável para o indivíduo poder levar uma vida religiosa
e espiritual normal, ter um contato com Deus, ou uma fé autêntica. Certamente
os motivos que levam as pessoas a questionar o papel da Igreja são diversos. E também ninguém pode negar que
todo ser humano tem direito de ter o seu ponto de vista e defender essa
ou aquela opinião que lhe parece certa.
Mas a questão em si é importante: Será mesmo verdade que
para vivenciar e cultivar a fé cristã bastaria para cada um de nós
apenas “estar no seu mundo pessoal e particular” e não precisar fazer parte da
Igreja?
O texto abaixo, de Ferdinand Krenzer¹, aborda esse tema com clareza e propriedade.
Não deixe
de ler.
WCejnog
Para poder
acompanhar com facilidade a reflexão do autor e aproveitar ao máximo as
explicações é aconselhável ler desde o
início todos os seus textos sobre este
assunto (começo no dia 03 de agosto de 2012
- http://indagacoes-walenty.blogspot.com.br/2012/08/para-entender-o-cristianismo-qual-e-sua.html .)
WCejnóg
(7)
O cristianismo sem a Igreja?
Quero voltar a falar das
dificuldades que muitos cristãos encontram no seu caminho de busca da verdadeira fé. Será que a religião não é esse algo inteira e puramente pessoal? Por
que não bastaria só a piedade particular
e a fé de cada um? Não seria mais fácil
chegar a Deus e o caminho seria mais curto se for dispensada a instância
intermediária, isto é a Igreja?
Uma resposta para essas dificuldades é esta: a Revelação de Deus em Jesus Cristo
aconteceu uma vez por todas, há dois mil
anos atrás, e por causa disso só pôde chegar a nós por meio da intermediação
humana. Deus permite que o homem faça tudo o que ele pode e sabe, apostando
nele, pois sempre o trata com seriedade.
Por isso também espera do ser humano a capacidade de transmitir às futuras
gerações tudo isso que recebeu de Jesus Cristo, obviamente com a sua
ajuda. Na Carta aos Romanos lemos: “Mas
como invocarão aquele em quem não creram? E como crerão sem terem ouvido falar?
E como ouvirão falar, se não houver quem pregue?” (Rom 10, 14). Somente graças à
Igreja sabemos hoje de Jesus Cristo, e sem Jesus Cristo o cristianismo
há muito tempo seria só o passado.
Mas existe ainda um segundo ponto
de vista: a fé segundo Jesus Cristo não
é somente a questão pessoal ou a
questão do coração. Naturalmente, não pode faltar a piedade e fé particular de
cada um no cristianismo, mas alguns
fiéis, parece, só lembram da Bíblia apenas uma frase que os interessa: “Quando rezares , entra no quarto, fecha a porta e reza ao Pai que
está no oculto. E o Pai, que vê no oculto, te dará a recompensa” (Mt 6,6).
Todo o resto não consideram. O seu
cristianismo eles reduzem à fórmula: “Deus e eu”, e também “Isso eu resolvo
pessoalmente com o próprio Deus”. No entanto a
doutrina sobre o corpo de Cristo nos diz que um membro deve ter a
responsabilidade pelos outros membros; que ninguém, quando se trata da fé,
é responsável somente por si só. O ser
humano precisa do seu semelhante quase em tudo e quase todo dia. Aqueles que
fizeram a experiência de levar sozinho a sua religiosidade e piedade perceberam
que sem receber o apoio da comunidade, e, com isso, sem receber novos estímulos
– a sua vida interior torna-se, aos poucos, estéril e murcha. A auto-justificação: “Eu, no meu coração, sou religioso”, muito
fácil torna-se o pretexto para limitar a sua religiosidade a um “mínimum sem compromisso”. Uma realização da fé dentro da
comunidade de jeito nenhum atrapalha o contato pessoal com Deus.
A concepção da Igreja como uma
sociedade “invisível”, puramente espiritual, composta de pessoas que crêem em
Cristo – é insuficiente. Como, neste caso, os membros do mesmo corpo poderiam
ser responsáveis uns pelos outros? E por que, de acordo com a vontade de Jesus
Cristo, o ingresso para uma comunidade tem que se realizar pelo sinal visível,
isto é pela aceitação do batismo? E como então os sacramentos seriam dados sem
a Igreja? Como, por exemplo, sem uma comunidade concreta e visível, poderia ser
celebrada a ceia eucarística? Ademais, Jesus Cristo deu à sua Igreja uma
visível e concreta autoridade e lhe confiou a direção. Tudo isso somente tem o
sentido quando a sociedade (a comunidade)
também é visível.
“Mesmo sem a Igreja eu posso ser um bom cristão” – essa declaração, depois de tudo o que foi dito acima, parece mais que duvidosa. A própria Bíblia nos foi transmitida pela Igreja, e quem individualmente quisesse se apoiar “somente na Sagrada Escritura”, esse será orientado justamente pela própria Bíblia como também pela biblística contemporânea para procurar a Igreja (compare Mt 18, 17).
“Mesmo sem a Igreja eu posso ser um bom cristão” – essa declaração, depois de tudo o que foi dito acima, parece mais que duvidosa. A própria Bíblia nos foi transmitida pela Igreja, e quem individualmente quisesse se apoiar “somente na Sagrada Escritura”, esse será orientado justamente pela própria Bíblia como também pela biblística contemporânea para procurar a Igreja (compare Mt 18, 17).
Todas essas colocações levam,
enfim, a estas perguntas: ‘Por que, realmente, Jesus Cristo se encarnou e se
fez homem? Por que Deus não se dá diretamente para cada ser humano em separado?
Pois é - por quê? Nós não sabemos isso, apenas
sabemos que Deus revelando-se, de fato escolheu o caminho de “humanização” e
desta maneira Ele continua agindo durante toda a história da salvação. A Igreja
não é, obviamente, nada mais que a confirmação dessa encarnação de Cristo. Desde
o momento em que Deus se aproximou tão perto dos homens que se tornou um de nós
não devemos e nem podemos mais
procurá-lo "atrás das nuvens" como alguém muito distante. Assim como era possível
ver e tocar o Deus–Homem durante a sua vida na terra, exatamente do mesmo modo
acontece com a sociedade que Ele fundou:
pode-se vê-la e tocá-la. No ato da encarnação
de Jesus Cristo Deus disse “Sim” para tudo o que é humano, assumindo Ele próprio a condição humana, tornando-se
homem de corpo e sangue – um ser visível. Todas as tentativas de construir uma
Igreja puramente espiritual terminam, depois de um curto tempo, sem sucesso.
A mesma pergunta relacionada ao
visível e invisível repete-se no tema dos sacramentos. Falamos dos sacramentos
quando a Graça Divina se dá ao ser humano como dom, através dos sinais
visíveis. Pode-se, portanto, sem erro,
descrever a Igreja como primeiro Sacramento, porque a graça Divina salvadora
permanece nela para sempre visível para os
homens, e por ela lhe é transmitida.
O ser humano constantemente tenta
“esculpir para si a própria imagem” de Deus. “Deus não deve querer isso ou
aquilo, Ele não deve ser assim”. Vale a pena deixar todas as suposições humanas
e ir direto nesse caminho que Ele mesmo
traçou. Talvez, por essa razão, Ele derrama sobre nós a sua salvação através de outras pessoas,
para que sempre esteja bem claro na nossa consciência de que apenas
com as nossas próprias forças nós não somos capazes realizar a nossa salvação.
(KRENZER, F. Taka jest nasza wiara,
Paris, Éditions Du Dialogue, 1981, p. 140-142)²
Continua...
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¹ Krenzer Ferdinand (nascido em 22 de maio de 1921 em Dillenburg,
Hesse, † 08 de maio de 2012 em Hofheim am Taunus) foi um teólogo católico alemão,
sacerdote e escritor na aposentadoria.
² Obs.: As reflexões do Ferdinand
Krenzer fascinam pelo seu jeito simples e direto, e agradam o leitor,
ajudando-o a entender melhor o caminho da fé cristã e compreender os temas mais
difíceis desta doutrina.
Os textos publicados neste blog são
tomados do livro Taka jest nasza wiara, desse autor; uma edição no idioma polonês,
do qual faço uma tradução livre (para o português). O título original: “Morgen wird man wieder
Glauben”.
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