Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

domingo, 16 de setembro de 2012

“Sou cristão mas dispenso a Igreja!” – Pode?



Atualmente muitas pessoas, e sobretudo os  jovens, questionam  a  opinião de que a  Igreja como instituição seja indispensável para o indivíduo poder levar uma vida religiosa e espiritual normal, ter um contato com Deus, ou uma fé autêntica. Certamente os  motivos que  levam as pessoas a questionar o papel da Igreja são diversos. E também ninguém pode negar que  todo ser humano tem direito de ter o seu ponto de vista e defender essa ou aquela opinião que lhe parece  certa.

Mas a questão em si é importante:  Será mesmo  verdade que  para vivenciar e cultivar a fé cristã bastaria para cada um de nós apenas “estar no seu mundo pessoal e particular” e não precisar fazer parte da Igreja?

O texto abaixo, de Ferdinand Krenzer¹,  aborda esse tema com clareza e propriedade.
Não  deixe de  ler.
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Para poder acompanhar com facilidade a reflexão do autor e aproveitar ao máximo as explicações é aconselhável  ler desde o início todos os seus  textos sobre este assunto (começo no dia 03 de agosto de 2012  - http://indagacoes-walenty.blogspot.com.br/2012/08/para-entender-o-cristianismo-qual-e-sua.html .)
WCejnóg 


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O cristianismo  sem a Igreja?

Quero voltar a falar das dificuldades que muitos cristãos encontram no seu caminho de busca da  verdadeira fé. Será que a religião não  é esse algo inteira e puramente pessoal? Por que não bastaria  só a piedade particular e a fé  de cada um? Não seria mais fácil chegar a Deus e o caminho seria mais curto se for dispensada a instância intermediária,  isto é a Igreja?

Uma  resposta para essas dificuldades  é esta: a Revelação de Deus em Jesus Cristo aconteceu uma  vez por todas, há dois mil anos atrás, e por causa disso só pôde chegar a nós por meio da intermediação humana. Deus permite que o homem faça tudo o que ele pode e sabe, apostando nele,  pois sempre o trata com seriedade. Por isso também espera do ser humano a capacidade de transmitir às futuras gerações tudo isso que recebeu de Jesus Cristo, obviamente com  a  sua ajuda. Na  Carta aos Romanos  lemos: “Mas como invocarão aquele em quem não creram? E como crerão sem terem ouvido falar? E como ouvirão falar, se não houver quem pregue?” (Rom 10, 14).  Somente graças  à  Igreja sabemos hoje de Jesus Cristo, e sem Jesus Cristo o cristianismo há  muito tempo seria  só o passado.

Mas existe ainda um segundo ponto de vista: a fé segundo Jesus Cristo não  é somente a  questão pessoal ou a questão do coração. Naturalmente, não pode faltar a piedade e fé particular de cada um no  cristianismo, mas alguns fiéis, parece, só lembram da Bíblia apenas uma frase que os interessa: “Quando  rezares , entra  no quarto, fecha a porta e reza ao Pai que está no oculto. E o Pai, que vê no oculto, te dará a recompensa” (Mt 6,6). Todo o  resto não consideram. O seu cristianismo eles reduzem à fórmula: “Deus e eu”, e também “Isso eu resolvo pessoalmente com o próprio Deus”. No entanto a  doutrina sobre o corpo de Cristo nos diz que um membro deve ter a responsabilidade pelos outros membros; que ninguém, quando se trata da fé, é  responsável somente por si só. O ser humano precisa do seu semelhante quase em tudo e quase todo dia. Aqueles que fizeram a experiência de levar sozinho a sua religiosidade e piedade perceberam que sem receber o apoio da comunidade, e, com isso, sem receber novos estímulos – a sua vida interior torna-se, aos poucos, estéril  e murcha. A auto-justificação:  “Eu, no meu coração, sou religioso”, muito fácil torna-se o pretexto para limitar a sua religiosidade a um “mínimum sem  compromisso”. Uma realização da fé dentro da comunidade de jeito nenhum atrapalha o contato pessoal com Deus.

A concepção da Igreja como uma sociedade “invisível”, puramente espiritual, composta de pessoas que crêem em Cristo – é insuficiente. Como, neste caso, os membros do mesmo corpo poderiam ser responsáveis uns pelos outros? E por que, de acordo com a vontade de Jesus Cristo, o ingresso para uma comunidade tem que se realizar pelo sinal visível, isto é pela aceitação do batismo? E como então os sacramentos seriam dados sem a Igreja? Como, por exemplo, sem uma comunidade concreta e visível, poderia ser celebrada a ceia eucarística? Ademais, Jesus Cristo deu à sua Igreja uma visível e concreta autoridade e lhe confiou a direção. Tudo isso somente tem o sentido quando a sociedade (a comunidade)  também  é visível.


“Mesmo sem a Igreja eu posso ser um bom cristão” – essa declaração, depois de tudo o que foi dito acima, parece mais que duvidosa. A própria Bíblia nos foi transmitida pela Igreja, e quem  individualmente quisesse se apoiar “somente na Sagrada Escritura”, esse será orientado justamente pela própria Bíblia como também pela biblística contemporânea para procurar a Igreja (compare Mt 18, 17).

Todas essas colocações levam, enfim, a estas perguntas: ‘Por que, realmente, Jesus Cristo se encarnou e se fez homem? Por que Deus não se dá diretamente para cada ser humano em separado?   Pois é - por quê? Nós não sabemos isso, apenas sabemos que Deus revelando-se, de fato escolheu o caminho de “humanização” e desta maneira Ele continua agindo durante toda a história da salvação. A Igreja não é, obviamente, nada mais que a confirmação dessa encarnação de Cristo. Desde o momento em que Deus se aproximou tão perto dos homens que se tornou um de nós  não devemos e nem podemos mais procurá-lo "atrás das nuvens" como alguém muito distante. Assim como era possível ver e tocar o Deus–Homem durante a sua vida na terra, exatamente do mesmo modo acontece com a sociedade que  Ele fundou: pode-se vê-la e tocá-la. No ato da  encarnação de Jesus Cristo Deus disse “Sim” para tudo o que  é humano, assumindo  Ele próprio a condição humana, tornando-se homem de corpo e sangue – um ser visível. Todas as tentativas de construir uma Igreja puramente espiritual terminam, depois de um curto tempo, sem sucesso.
A mesma pergunta relacionada ao visível e invisível repete-se no tema dos sacramentos. Falamos dos sacramentos quando a Graça Divina se dá ao ser humano como dom, através dos sinais visíveis. Pode-se,  portanto, sem erro, descrever a Igreja como primeiro Sacramento, porque a graça Divina salvadora permanece nela para sempre visível para os  homens, e por ela lhe é transmitida.

O ser humano constantemente tenta “esculpir para si a própria imagem” de Deus. “Deus não deve querer isso ou aquilo, Ele não deve ser assim”. Vale a pena deixar todas as suposições humanas e  ir direto nesse caminho que Ele mesmo traçou. Talvez, por essa razão, Ele derrama sobre  nós a sua salvação através de outras pessoas, para que sempre  esteja  bem claro na nossa consciência de que apenas com as nossas próprias forças nós não somos capazes realizar a nossa salvação.

 (KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris,  Éditions Du Dialogue, 1981, p. 140-142)²
Continua...  
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¹ Krenzer Ferdinand (nascido em 22 de maio de 1921 em Dillenburg, Hesse, 08 de maio de 2012 em Hofheim am Taunus) foi um teólogo católico alemão, sacerdote e escritor na aposentadoria.

² Obs.: As reflexões do Ferdinand Krenzer fascinam pelo seu jeito simples e direto, e agradam o leitor, ajudando-o a entender melhor o caminho da fé cristã e compreender os temas mais difíceis desta doutrina.
Os textos publicados neste blog são tomados do livro Taka jest nasza wiara, desse autor; uma edição no idioma polonês, do qual faço uma tradução livre (para o português).  O título original: “Morgen wird man wieder Glauben”.
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