São
muitas as publicações a respeito da encíclica “Lumen Fidei”, que recentemente
foi apresentada pelo papa Francisco no
Vaticano.
A
maioria são opiniões e análises
positivas, reconhecendo a
oportuna abordagem do tema da fé cristã e a necessidade de se ter uma
ferramenta deste tipo nos tempos de hoje, marcados pelas incertezas e crises da
fé.
É
óbvio, na minha opinião, que algumas publicações expressam também as insafisfações
e críticas, de vários tipos, em relação ao conteúdo dessa encíclica, o que seria
difícil não acontecer no mundo pluralista e que se torna cada vez mais relativista,
como o nosso... Tanto mais, que –
falando de modo figurativo - o apetite do “Adão” de hoje em querer ocupar o
lugar do seu Criador, e querer ditar “as suas regras” é tão grande, que ultrapassa até os limites do bom senso, e
tudo em nome de “autonomia” e
“liberdade”! A mensagem do Livro de Gênesis (Gn 2,15-17 e 3,1-24), quando lida focada o mundo de hoje, é como se narrasse as atitudes do homem contestador contemporâneo, cheio de orgulho e arrogância.
Pra
mim, o documento traz um farto material para uma boa reflexão sobre a fé. E
precisamos fazê-la com serenidade, abertura, e também com o necessário olhar
crítico, sobretudo nos pontos que ficaram ainda para serem investigados, ou
onde ainda existem lacunas para as quais não há respostas prontas.
Por
exemplo, Leonardo Boff escreve no seu blog: “Mas, se constata na Encíclica uma dolorosa lacuna que lhe subtrai
grande parte da relevância: não aborda as crises da fé do homem de hoje, suas
dúvidas, suas perguntas que nem a fé pode responder: Onde estava Deus no
tsunami que dizimou milhares de vida ou em Fukushima? Como crer depois dos
massacres de milhares de indígenas feitos por cristãos ao longo de nossa
história, dos milhares de torturados e assassinados pelas ditaduras militares
dos anos 70-80? Como ainda ter fé depois dos milhões de mortos nos campos
nazistas de extermínio? A encíclica não oferece nenhum elemento para
respondermos a estas angústias. Crer é sempre crer apesar de… A fé não
elimina as dúvidas e as angústias de um Jesus que grita na cruz: "Pai, por
que me abandonaste?”. A fé tem que passar por este inferno e
transformar-se em esperança de que para tudo existe um sentido, mas escondido
em Deus. Quando se revelará?”
Concordo
que essas são as dificuldades concretas que
podem perturbar muitas pessoas, a ponto de poder levá-las à descrença e à dúvida, quando se trata da fé
em Deus - Pai e Criador de tudo e de todos. Penso que este tema se relaciona diretamente com a questão da
ideia de Deus que essas pessoas possuem ou cultivam. Aliás, sobre este assunto foi
postada no blog Indagações a postagem “Como o homem imagina Deus”, do dia 19 de
janeiro de 2012, que pode ser encontrada
no link:
Acredito que a encíclica Lumen Fidei não necessariamente deveria abordar essa questão, porque correria
o risco de alargar demasiadamente o foco do tema proposto.
Mesmo assim,
apesar das questões expostas acima, considero este documento papal de muita
importância e valor para todas as pessoas que buscam refletir mais sobre sua fé, ansiosas em encontrar “toques” e “trilhas”, que possam
levá-las a confirmar em sua vida essa necessária “certeza da fé”.
Destaco aqui dois
parágrafos (53 e 55) da encíclica “Lumen Fidei”, que neste momento mais me chamam a atenção:
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Parágrafo 53
Em
família, a fé acompanha todas as idades da vida, a começar pela infância: as
crianças aprendem a confiar no amor de seus pais. Por isso, é importante que os
pais cultivem práticas de fé comuns na família, que acompanhem o amadurecimento
da fé dos filhos.
Sobretudo
os jovens, que atravessam uma idade da vida tão complexa, rica e importante
para a fé, devem sentir a proximidade e a atenção da família e da comunidade
eclesial no seu caminho de crescimento da fé. Todos vimos como, nas Jornadas
Mundiais da Juventude, os jovens mostram a alegria da fé, o compromisso de
viver uma fé cada vez mais sólida e generosa. Os jovens têm o desejo de uma
vida grande; o encontro com Cristo, o deixar-se conquistar e guiar pelo seu
amor alarga o horizonte da existência, dá-lhe uma esperança firme que não
desilude.
A
fé não é um refúgio para gente sem coragem, mas a dilatação da vida: faz
descobrir uma grande chamada — a vocação ao amor — e assegura que este amor é
fiável, que vale a pena entregar-se a ele, porque o seu fundamento se encontra
na fidelidade de Deus, que é mais forte do que toda a nossa fragilidade.
Parágrafo 55
Além
disso a fé, ao revelar-nos o amor de Deus Criador, faz-nos olhar com maior
respeito para a natureza, fazendo-nos reconhecer nela uma gramática escrita por
Ele e uma habitação que nos foi confiada para ser cultivada e guardada;
ajuda-nos a encontrar modelos de progresso, que não se baseiem apenas na
utilidade e no lucro mas considerem a criação como dom, de que todos somos
devedores; ensina-nos a individuar formas justas de governo, reconhecendo que a
autoridade vem de Deus para estar ao serviço do bem comum.
A
fé afirma também a possibilidade do perdão, que muitas vezes requer tempo,
canseira, paciência e empenho; um perdão possível quando se descobre que o bem
é sempre mais originário e mais forte que o mal, que a palavra com que Deus
afirma a nossa vida é mais profunda do que todas as nossas negações. Aliás,
mesmo dum ponto de vista simplesmente antropológico, a unidade é superior ao
conflito; devemos preocupar-nos também com o conflito, mas vivendo-o de tal
modo que nos leve a resolvê-lo, a superá-lo, como elo duma cadeia, num avanço
para a unidade.
Quando a fé esmorece, há o risco de
esmorecerem também os fundamentos do viver, como advertia o poeta Thomas Sterls
Eliot: « Precisais porventura que se vos
diga que até aqueles modestos sucessos / que vos permitem ser orgulhosos de uma
sociedade educada / dificilmente sobreviveriam à fé, a que devem o seu
significado? »[48]
Se tiramos a fé em Deus das nossas
cidades, enfraquecer-se-á a confiança entre nós, apenas o medo nos manterá
unidos, e a estabilidade ficará ameaçada. Afirma a Carta aos Hebreus: « Deus
não Se envergonha de ser chamado o "seu Deus", porque preparou para
eles uma cidade » (Heb 11, 16).
A expressão « não se envergonha »
tem conotado um reconhecimento público: pretende-se afirmar que Deus, com o seu
agir concreto, confessa publicamente a sua presença entre nós, o seu desejo de
tornar firmes as relações entre os homens. Porventura vamos ser nós a
envergonhar-nos de chamar a Deus « o nosso Deus »? Seremos por acaso nós a
recusar-nos a confessá-Lo como tal na nossa vida pública, a propor a grandeza
da vida comum que Ele torna possível? A fé ilumina a vida social: possui uma
luz criadora para cada momento novo da história, porque coloca todos os
acontecimentos em relação com a origem e o destino de tudo no Pai que nos ama.
Não deixe de ler a encíclica
“Lumen Fidei” na íntegra: clique AQUI
ou acesse o link
abaixo:
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