Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Indagações a respeito das festas natalinas.



Ontem celebramos o Natal. O dia tão especial e  esperado por todos – já passou. Para uns era ocasião de reunir a família e/ou amigos e fazer a festa.  Para outros, um fim de semana como qualquer outro, e nada mais.
Para outros ainda, além de uma festa, também era o momento oportuno para renovar a sua fé cristã e confirmar a fidelidade ao Filho de Deus, Jesus Cristo, que se fez homem, cujo mistério de Encarnação  lembramos e celebramos justamente no Natal. O anjo disse-lhes: Não temais, eis que vos anuncio uma boa nova que será alegria para todo o povo:  hoje vos nasceu na Cidade de Davi um Salvador, que é o Cristo Senhor.  Isto vos servirá de sinal: achareis um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura.” (Lc 2,10-12).

A Missa do Galo é o momento sublime da celebração do Natal. Para nós católicos, celebrar a Eucaristia nos momentos assim é sentir o amor infinito de Deus  derramado sobre a humanidade. Entenda quem pode entender! É maravilhoso.

Porém, neste contexto celebrativo existem também algumas indagações que causam sérios incômodos e até dúvidas  para as pessoas como eu.
Jesus nasceu na pobreza da gruta que servia de abrigo para os pastores de ovelhas, gente humilde e pobre. Ele passou a vida toda no meio desse povo, defendendo e ajudando-o, anunciando a boa nova do Reino de Deus. Atraiu para si a ira dos poderosos e ricos da sua sociedade, foi condenado e crucificado. Morreu na cruz  como pobre e marginalizado. Ressuscitou dos mortos garantindo a vida, que não terá fim, para todos aqueles que acreditam n’Ele. Basicamente é esta a nossa fé cristã. E nós acreditamos que Ele é o Filho de Deus, nosso Redentor.

Mas, alguma coisa deve estar errada quando as Igrejas (e não só católica) nas suas liturgias pretensiosamente ‘ricas’ estão celebrando a... pobreza do Menino recém-nascido.  Assistimos  Missas  cheias de pompa, brilho e rituais, celebradas pelo Papa, ou bispos, ou até mesmo pelos padres, vestidos de roupas (paramentas) douradas, ostentando cruzes, anéis e alianças de ouro. E  falam, então, ao povo reunido  que Deus ama os pobres,  que Jesus nasceu na pobreza.  O foco é a abordagem individualista e intimista.  Parece que a Boa Nova de Jesus não tem  nada a ver com a nossa sociedade como tal. Parece que o que temos, o que o homem está ‘aprontando’ neste mundo nosso é tudo digno, normal e suficiente. Que cegueira! Basta olhar em volta – tantas injustiças, violência, corrupção, mentira, egoísmo, consumismo e mais tantas coisas ruins e mesquinhas que são obras do ser humano. Não parece que a consciência dos cristãos  ficou ‘paralisada’? Então vamos esperar a vinda do Reino de Deus para após a nossa morte? ...  Não é o Menino Jesus que veio ao mundo “para que todos tivéssem vida, e vida plena” (Jo 10,10)?   Ele deu a sua vida por isso.  Os cristãos não deveriam se empenhar para continuar a missão de Cristo?   Mas, hoje não se fala sobre isso. Profere-se muitas palavras, às vezes até um verdadeiro ‘palavrório’ nas homilias, mas sem emoção, e sem coragem para representar com convicção o próprio Jesus  Cristo, hoje, entre nós, na nossa sociedade. Já imaginaram como Jesus hoje faria uma homilia no lugar do senhor bispo ou do padre, cercado pelo povo (o povo acomodado, inerente e cúmplice das aberrações que a nossa sociedade ostenta, mas também sedento da verdade, da coragem e da vitória do bem), e que certamente teria coragem de usar aquelas palavras que só um verdadeiro profeta tem coragem  usá-las?
Tantas perguntas e questionamentos que seguem... Não é uma contradição? Isso, para mim, nem exige mais comentários.

Mas tem mais.  A obsessão de algumas autoridades eclesiais para  reintroduzir os cantos em latim nas missas, está tirando com isso até as poucas oportunidades que o povo ainda tinha para se expressar através dos seus cantos, na sua língua. Pode haver quem goste disso, mas é um equivoco muito grande.

Não sei a quem satisfazem essas mudanças, que certamente não levam para lugar nenhum, a não ser  aumentam mais ainda a distância entre o povo e a Igreja Instituição com a sua liturgia, fria e imposta.

Ontem, saindo da Missa de Natal, tive a sensação de que a liturgia não consegue mais ‘mexer’ com as emoções do povo simples... Muitas formalidades, gestos vazios;  muitos ‘ritos’, que não dizem mais nada, não “inflamam” os corações. Frequentemente  as pessoas reunidas são  tratadas como se fossem crianças (ou ‘ovelhas’ literalmente).  Mas, deveria ser o encontro com Jesus, não deveria? 

Ou, será que hoje tenta-se ‘inventar’ um outro Jesus, que tem pouco a ver com o Jesus Nazareno? Será que os interesses puramente humanos de poder e domínio não ofuscam a verdadeira mensagem de Natal? Alguma coisa está errada, não está?

Mesmo assim, apesar de tudo, somos desafiados a ‘procurarmos’ o verdadeiro Menino Jesus de Belém. Não vamos nos deixar abalar. Só Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida! E Ele deixará se encontrar, porque, na verdade, sempre está esperando por nós.

Ninguém tem dúvidas que existem, sim, nos dias de hoje também, as comunidades com seus  pastores que são verdadeiros exemplos de profetismo e trabalho pastoral muito dedicado e fiel ao Jesus Cristo. Mas, pergunto eu,  são muitas?  Se fosse assim, com certeza o mundo seria mais humano: com mais luz, mais bondade, justiça, pão, emprego, dignidade, sinceridade, doação, amor...  o princípio do Reinado de Deus Verdadeiro.  Mas, o que vemos, ainda estamos muito longe para que isso aconteça.

Trago aqui um texto comovente, publicado nestes dias, que endossa a reflexão:
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23.12.11 - Brasil            

Natal de Jesus na pessoa dos pobres


Pe. Djacy P. Brasileiro



Jesus nasceu pobre, na periferia, distante dos palácios, das riquezas. Como pobre, sentiu as dores do povo oprimido, injustiçado, ferido na sua dignidade de pessoa humana. Aliás, toda sua vida foi voltada para os pobres. Basta ver o sermão da montanha.

É natal! Muita luz, muita festa, muita música e muito enfeite. Na noite de natal, haverá muitos banquetes, muita comilança. Nas mansões, o clima é de grande festa. Cada um com sua roupa caríssima, elegância fora do comum. Tudo é encantador, maravilhoso, emocionante: Comidas, bebidas, músicas, desfiles de modas. Porém, o Jesus pobre, esfarrapado e humilhado, na pessoa dos famintos, doentes, presos, injustiçados, não será o centro da festa. Para essa gente, esse Jesus não existe.

É natal! Na noite de natal, milhares de crianças vão morrer de frio, de sede, de fome...; Muitos irmãos nossos vão clamar, no seu mais profundo silêncio, por justiça, por dignidade, por vida.

É natal! No dia do nascimento de Jesus pobre, esfarrapado, milhões de seres humanos estarão gritando: socorro! Falta pão na nossa mesa.

É natal! Neste dia, muitos animais de estimação estarão com suas roupas novas, de marcas, banhados e cheirosos, comendo comida especial, mas as criancinhas preferidas de Jesus vão dormir chorando pedindo um pouco de pão.

É natal! Aqui no sertão paraibano, neste dia de natal, os clamores dos pobres por justiça social, por dignidade, por liberdade, por pão e água chegam aos ouvidos de Deus.

É natal! Em Pedra Branca, onde moro, vejo tantos pais e mães clamando pelos seus filhos: roupa ,alimento, remédio, cadeira de roda, água ,dignidade.

É natal! Os pobres comem um pouco de feijão, arroz e um pedaço de carne, enquanto os ricos se deleitam com suas comidas caríssimas. Então, é natal dos pobres e dos ricos?

É natal! Políticos, sem escrúpulos, aumentam seu próprio salário. Enquanto o povão sobrevive graças a um famigerado salário mínimo.

É natal! Relativismo religioso, secularismo, absolutização do poder, do ter; abandono dos valores evangélicos.

É natal! Alienação política, terrorismo político-cultural, reacionarismo religioso, relativismo ético-moral, consumismo, idolatria do mercado. É natal dos endinheirados, dos consumistas.

É natal! Desprezo à pessoa humana, fome, miséria, sede, guerra, desemprego, injustiça social. Quanta hipocrisia na noite de natal!
É natal! Tantas vezes cristãos compromissados com o reino de Deus, com a justiça social são vítimas de calúnias, difamações, de violência.
É natal! O padre quando luta para que o povo de sua comunidade viva com dignidade passa a ser vítima dos poderosos e de seus comandados.
É natal! Quando o padre fala de anjos, de coisas do outro mundo, leva o povo ao delírio psíquico, é santo, é padre dez; quando fala das injustiças que agridem a dignidade da pessoa humana, e chama, em nome da fé, a lutar contra esse mal, logo é tachado de demônio, de desobediente à Igreja.
É natal! Quando o padre vive só de louvar a Deus é rotulado de padre verdadeiro; quando faz o povo tomar consciência dos seus direitos inalienáveis , alguns dizem: vamos fazer abaixo assinado para tirá-lo, ele é perigoso.

É natal! Milhares de pessoas, no meu sertão, bem no vale do piancó, gritam: bebemos água imprópria para o consumo humano.

É natal! Milhares de estudantes, no vale do piancó, clamam: por que na nossa região não há um campus da UFCG e UEPB? Temos o direito de fazer um curso superior, mas nos é negado este sagrado direito.

É natal! No meu sertão paraibano, quantas pessoas clamando por assistência-médico-hospital com dignidade.

É natal! No vale do piancó, as pessoas que desejam uma consulta médica ou odontológica têm que pegar a fila ainda de madrugada. Só assim, conseguem uma ficha. Imagine acordar-se de madrugada para conseguir uma ficha.

É natal! Corrupção nas esferas públicas reina neste Brasil. E os pobres sofrem as terríveis consequências.

É natal! Quando uma autoridade, seja quem for, tenta combater a corrupção existente neste País, passa a ser destratada, caluniada, sofre reprimenda por parte dos seus superiores.

É natal! Muitas orações, muitas celebrações, muitos louvores, muitos aplausos para Jesus, muitas mensagens de felicitações, muitas confraternizações, porém, pouca sensibilidade humano-cristã diante dos sofrimentos de tantos irmãos nossos, vítimas da fome, da miséria, da sede...

E o natal? Na criança faminta, no doente mal atendido nos hospitais, na pessoa desempregada, nos agredidos em sua dignidade de pessoa humana, nos pobres, nos favelados, nos sem vez e voz. Então é natal de Jesus na pessoa dos pobres!

É natal em cada Belém deste recanto paraibano.

Padre Djacy Brasileiro, em 21 de Dezembro de 2011.

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