Não são poucas ocasiões em que assistimos notícias chocantes sobre as vidas desperdiçadas: as pessoas matam as outras por motivos banais e, às vezes, sem motivo algum; crimes bárbaros, chacinas (colhendo a vida de muitos inocentes); suicídios, violência... Os noticiários estão cheios de notícias desse tipo. E nós, ficamos perplexos e até certo ponto “perdidos” diante desse quadro – não sabemos o que pensar, como nos posicionar. A “construção” da vida social e humana, parece, não tem mais fundamentos sólidos – a casa corre risco de desabar. O próprio planeta Terra começa a encontrar-se ‘em apuros’. Os homens começam a questionar praticamente tudo, propondo as mudanças que não têm sentido. É esta a sensação. É ‘prato cheio’ para quem consegue ver só a matéria e a passagem do tempo. Estamos numa estrada errada, que não se sabe para onde vai levar a humanidade. Alias, até podemos imaginar, sim.
Um pensamento quase que persistente incomoda-me muito. No pleno século XXI, quando temos tanta possibilidade de averiguação crítica e científica acerca de muitas questões, quando fica evidente a diferença entre o caminho do mal (que leva a morte) e do bem (que valoriza a vida e da esperança), o homem moderno não faz escolhas certas, não trilha o caminho seguro. Prefere fingir que não sabe, ou então deixa se levar pelas doutrinas e orientações enganadoras. Quer apenas aproveitar a vida, dominar, comprar, consumir, sentir, degustar, e só isso. Eu me pergunto: por que o ser humano nos tempos de hoje não aproveita as vantagens que a razão e a inteligência lhe oferecem e não se lança com energia e determinação para ‘inventar’ um mundo melhor, onde todos possam ter a vida em plenitude? Por que os homens de hoje complicam tanto as coisas e a própria vida?
Todos sabemos, naturalmente, que alguns poucos elementos ou minorias que tem uma influência poderosa nas sociedades, esses sabem muito bem o que fazem e o fazem com os objetivos bem definidos: são eles que apontam a direção para onde querem que a ‘massa’ humana os siga.
Sabemos que existem pessoas e organizações, do outro lado, que lutam pelo verdadeiro bem da humanidade, em favor de todas as pessoas, sem exceção. Esses são muito importantes, mas não são muitos. A imensa maioria está ‘na deriva’: assistindo, sofrendo, concordando, ou, simplesmente, se acomodando. São multidões! São homens e mulheres que se iludem pensando que o que fazem é suficiente, mergulhados no individualismo, egoísmo, ou refugiando-se nas crenças de caráter intimista e individualista. Assim é fácil alimentar a indiferença, uma espécie de analgésico (para não dizer ‘droga’), para não se sentir ‘culpado’ pelo rumo que o mundo está tomando, ou para poder dormir tranqüilo. São também muitos que vivem como ‘sonâmbulos” – andando na vida sem saber por que estão aqui ou vão pra lá, por que apóiam isso ou aquilo...
A vida poderia ser melhor para todos – imagino eu. O mundo poderia ser melhor. Mas a humanidade precisa reassumir o caminho certo: despertar, reconhecer que todos somos irmãos e irmãs que moram na mesma casa – mundo, e que a nossa vida aqui, na terra, é passageira. Deve sair do egoísmo e da hipocrisia, e parar de enganar-se, a si mesma.
Ressoam com força as palavras da Bíblia e mexem com todos nós: "Eis que ponho diante de ti a vida ou a morte, a bênção ou a maldição, escolhe a vida para que vivas com tua descendência!..." (Dt 30:19).
Acho que construir o futuro melhor só será possível, reforçando as bases - os fundamentos - da vida. Acredito que esses fundamentos sólidos são a esperança e a fé: a fé em Deus que é Deus da vida, e a esperança (que deve ser certeza para todo cristão): “tudo posso naquele que me fortalece” (Fl 4, 13). Sem elas nada será feito.
O texto abaixo nos ajuda a refletir mais sobre essa questão:
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(...) Quem não espera mais por nada nesta vida, esse congela, se perde no ceticismo. O ser humano só pode viver, se vê ainda alguma coisa na sua frente, se ainda alguma coisa pode acontecer. Sempre estamos voltados para o futuro, porque o presente é apenas um breve momento, que não podemos reter e se torna passado antes mesmo que a gente o levar a sério. Apenas a esperança fornece ao homem as forças para conseguir levar em frente a sua vida. Como, então, isso procede para as pessoas que já não esperam nada na vida? Trata-se dos velhos, doentes que não tem mais cura, as pessoas da margem social, consideradas miseráveis... Elas também esperam, só que o que? Será que para todos eles a vida não teria o sentido? Mas eles querem viver, e tem muito interesse nisso – como as pessoas com câncer - mesmo quando as suas esperanças estejam a toda hora sendo destruídas.
Na literatura moderna o ser humano costuma ser apresentado – obviamente não sempre – como um ser indefeso, solitário, impotente, vivendo no medo e com apatia em relação à própria existência. A sua vida é uma vida sem saída – literalmente –porque ele não encontra nem a porta e nem sequer algum caminho que o levaria para fora desse estado. O filósofo Sartre denomina esta situação como “sociedade fechada”. E o homem que experimenta essa exclusiva fragilidade e temporariedade sente-se como no “inferno”.
Nós também concordamos com esta colocação: se para o homem existe somente e apenas isso que ele pode esperar nesta terra e nesta vida, aí realmente ele vai chegar a conclusão que a vida é um absurdo. Uma vida em que a pessoa não pode esperar mais nada é algo sem saída.
Por que, então, o homem participa desse jogo absurdo? Por que simplesmente não sai do jogo, já que afirma ele, com freqüência, que não concorda com atitudes absurdas? Mesmo se alguém realmente “termina” com a sua vida – não vem logo o pensamento de que uma vida foi perdida? O ser humano, então, valoriza a vida, que – como dizem alguns - deveria rejeitar ou negar.
A vida é muito preciosa sobretudo para uma pessoa jovem. Como, então, poderia ser verdade considerar a vida um absurdo? Ninguém, pois, pode negar que freqüentemente o homem vivencia também situações positivas; não pode negar que a vida também tem os lados bons e o ser humano sente-se feliz. Afirmar que o sentimento principal do homem é “nojo” e “rejeição” em relação à vida não pode ser verdade, porque o que o ser humano mais manifesta é justamente a alegria de estar vivo. Na intimidade do seu ser todo homem e toda mulher é otimista e pressente algum sentido mais profundo da sua vida. Uma afirmação, portanto, que a vida é um absurdo e não tem sentido é muito unilateral e arriscada.
Não podemos consentir com a tese de que a vida do ser humano é um absurdo. No entanto, isso ainda não é nenhuma resposta para a pergunta, por que e para que vivemos, e tampouco explica os profundos desejos e ‘saudades’ do homem. Também não nos satisfaz apenas afirmar que “o homem encontra-se na vida” e ponto final. Estaríamos simplificando demais o problema. Trata-se de uma das mais essenciais perguntas sobre a existência humana, e por isso não se pode desanimar na investigação.
Quem realmente acha que é possível viver uma vida sem sentido, esse deveria tentar, na prática, viver segundo essa concepção. A sua postura deveria ser respeitada. Apenas não diga que essa é a única verdade e deveria ser assumida por todos. Porque, de onde ele pode saber que realmente não existe nenhum caminho que pode tirar o homem da escuridão e desespero? De onde pode saber que, apesar de todas as frustrações, não existe alguma força que traz a confiança e enche de esperança?
Nós, cristãos, somos convictos de que a resposta que a fé nos oferece, nos conduz muito além, e que traz frutos, e sobre ela podemos construir a nossa vida.(...)
(KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris, Éditions Du Dialogue, 1981, p.23)*
Continua...
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*Obs.:Para embasar as minhas pequenas reflexões (simples, diretas e questionadoras) acerca de perguntas que, suponho, perturbam a todos nós, sirvo-me do livro do Ferdinand Krenzer- “Morgen wird man wieder Glauben” e, usando aqui uma edição desse livro no idioma polonês (Taka jest nasza wiara), faço uma tradução livre (para o português) apontando alguns trechos, muito bem elaborados pelo autor. É um prazer seguir o seu pensamento.
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