Como continuação das reflexões anteriores, o texto abaixo, de Ferdinand Krenzer¹,
fala agora sobre o tema da Santíssima Trindade. Apesar de ser uma abordagem
mais teológica o autor brinda-nos com uma reflexão maravilhosa. Pode ser útil
para qualquer pessoa, que procura entender e aprofundar mais a sua fé cristã.
Não deixe de ler.
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Para poder acompanhar com facilidade a reflexão do autor e
aproveitar ao máximo as explicações é aconselhável ler desde o início todos os seus textos sobre este assunto (começo no dia 03
de agosto de 2012 - http://indagacoes-walenty.blogspot.com.br/2012/08/para-entender-o-cristianismo-qual-e-sua.html ).
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Deus Vivo: Santíssima Trindade
Deus Vivo: Santíssima Trindade
Falamos
do Espírito Santo. Mas quem é realmente o Espírito Santo, que Jesus Cristo nos
promete? Quem é este, que continua conduzindo a Obra começada por Cristo, em
cada cristão e em toda a Igreja? Aqui, o
termo “Espírito” não equivale à razão ou bom senso, como normalmente o entendia
a tradição do Ocidente. Na língua hebraica esse termo possui algo mais
dinâmico, e significa a força da vida. Somente o Espírito de Deus cria a vida.
Já no início do Relato da Criação (Livro de Gêneses) lemos que o Espírito de
Deus pairava sobre as águas (Gen 1, 2). Isso quer dizer que toda a força
criadora vem dele. Assim como “nos últimos dias” o Espírito será derramado
sobre toda a criatura humana (At 2, 17). Portanto é Ele que dá a nova vida. Ele
é essa força que tudo leva na direção do bem (compare Rm 8, 18-30).
Toda a
atuação de Jesus Cristo é a atuação no
Espírito Santo (compare Lc 4, 14-18). É por isso que Jesus Cristo pode dá-lo
para nós como sendo o seu Espírito (Lc 24, 49; At 2, 37ss; Rm 8, 9). Estar “no Espírito” e
“em Cristo” – para o São Paulo significa o mesmo.
As expressões bíblicas deste tipo levaram o cristianismo a
entender que o Espírito Santo não é
somente uma força impessoal de Deus, e, por outro lado, não pode ser
simplesmente idêntico com o Cristo ou com o Pai, ou – o que seria pior –
subordinado a Eles. Tornou-se óbvio, então, que devemos considerar o Espírito
Santo como terceira e diferente Pessoa. Os Sínodos de Niceia e de
Constantinopla (325 e 381), estabeleceram em suas fórmulas de fé (credo) a
seguinte conclusão a respeito do Espírito Santo: “Creio no
Espírito Santo, Senhor e fonte de vida, que procede do Pai; e com o Pai e o
Filho é adorado e glorificado: Ele falou pelos profetas.” (O Credo Niceno-Constantinopolitano ou Símbolo Niceno-Constantinopolitano).
Dizendo que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho, queria-se afirmar
que Ele não é criado e que tem a mesma
natureza Divina que o Pai e o Filho, portanto, e em conseqüência disso, precisa ser louvado e adorado como Deus.
Estamos aqui diante do maior
mistério da fé cristã. De novo
temos que quebrar todas as imagens de Deus, que nós próprios fizemos e,
simplesmente, apostar naquilo que Jesus Cristo nos revelou sobre Deus.
A verdade fundamental da nossa fé é que existe um só Deus. A doutrina
sobre a Santíssima Trindade (Deus Pai, Filho e Espírito Santo) de jeito nenhum questiona essa
unidade e unicidade. Mas, como conciliar
uma coisa com outra? Como entender esse
conceito?
Mesmo que o termo “Santíssima Trindade” não aparece na Bíblia,
constantemente esbarramos nesse mistério quando
analisamos as palavras e a atuação de Deus. Sem dúvida, essa verdade
da fé não foi nos transmitida para ser o objeto de especulação, e nem tampouco para atrapalhar a nossa fé. Deus
se dirigiu a nós, deu-se a nós, e por causa disso tornou-se necessário que
soubéssemos alguma coisa sobre a sua
riqueza e sobre a sua vida
interior. A fé no Mistério da Santíssima Trindade mostra até que ponto o ser
humano está pronto para ouvir o próprio Deus que revela quem Ele é, ou, então,
se apesar de tudo, o homem prefere
confiar na sua humana imaginação e diz “Sim” somente a esse Deus que ele
próprio consegue conceber. Um Deus assim
seria, no final das contas, menor que a
razão que o consegue imaginar.
Os judeus contemporâneos a Jesus eram orgulhosos do seu monoteísmo, que
os diferenciava de todas as outras nações. Para eles, grandiosa era a frase do
Velho Testamento: “Eu sou Javé, teu Deus, que te libertou do Egito, do
antro de escravidão. Não terás outros
deuses além de mim.” (Ex 20, 2ss; Mc 12, 29). Também Jesus afirma que Deus é
um. Mas, ao mesmo tempo, cuidadosa e
gradativamente – para não ser acusado que prega vários deuses – alarga e
aprofunda a visão de Deus.
Quando a Bíblia fala do Nascimento de Cristo, já são mencionados, lado a
lado, Pai, Filho e Espírito Santo. Depois, novamente são mencionados quando é descrito
o batismo de Jesus no rio Jordão (Mt 3, 13-17; Lc, 1,32). Após a sua
ressurreição, Cristo mais uma vez coloca lado a lado todos os três nomes de
Deus: “Foi-me dada toda a
autoridade nos céus e na terra. Portanto, vão e façam discípulos de todas as
nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28, 18). Portanto, já na própria Bíblia fica claro que existe a
diferença, como também existe a unidade, do Pai, Filho e Espírito Santo, a
ponto que podemos professar sem receio: Um Deus em três Pessoas (compare Jo 16,
28).
Uma afirmação dessa seria sem
sentido somente no caso, se falasse que uno e trino no mesmo aspecto. Mas isso,
exatamente, não é o caso. A unidade e trindade, que associamos em relação a
Deus, indicam os pontos de vista totalmente diferentes. Existe um ser Divino em
três Pessoas, ou, falando de outra forma – três Pessoas Divinas têm a mesma
natureza Divina. (Esse conceito de natureza e pessoa foi introduzido nos pensamentos filosóficos há muitos séculos
atrás).
Como diante de um oceano imenso, cuja profundidade não temos como
pesquisar e nem imaginar, estamos agora diante Deus – Ele não nos parece mais
como infinita e inerte solidão, mas como TRINO. Ai vem a pergunta: O que pode significar essa
verdade para a nossa vida?
– Nós nos aproximamos a esse
Deus insondável, e podemos perceber que Ele nos ama de maneira imponente,
e que Ele próprio é o AMOR (1 Jo 4,8) – como diz o Apóstolo João. Por isso a nossa existência humana também
adquire um sentido muito mais profundo. Deus revela-se para nós como um ser
continuamente fecundo e criativo; nele existe a COMUNIDADE, que vive numa mútua
entrega de tal plena confiança, que constitui total UNIDADE. Nela existe amor
perfeito e entendimento total, nela realiza-se um encontro intensivo e eterno.
Talvez diante disso seja mais fácil para nós acreditarmos que esse Deus queria
estar também perto de nós, que nos ama.
Agora entendemos melhor o fato que existe na nossa terra a comunidade, família,
amizade e amor, que as criaturas são criativas, fecundas e vivas. Temos a impressão que Deus Trino e Uno tem derramado do seu ser sobre todo o mundo e sobre todos nós.
O ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus, é destinado, de acordo com a sua mais profunda necessidade,
para viver em comunidade. Por esta razão, quando não tem o contato com Deus ou
com as pessoas – fatalmente o homem ficará vazio, frustrado e só.
Nas Cartas Apostólicas freqüentemente se repetem palavras sobre a fé na
Santíssima Trindade (2 Cor 3, 13; 1 P 1,2; 1 Jo 5,7ss). A Igreja sempre foi fiel a essa transmissão
bíblica durante todos esses séculos. Muitas orações dirige ao Pai pelo Cristo e
no Espírito Santo. Terminam elas: “Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,
que convosco e com o Espírito Santo vive e reina pelos séculos dos séculos”.
(KRENZER, F. Taka
jest nasza wiara, Paris, Éditions Du
Dialogue, 1981, p. 126-128)²
Continua
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¹
Krenzer Ferdinand (nascido em 22 de maio de 1921 em Dillenburg,
Hesse, † 08 de maio de 2012 em Hofheim am Taunus) foi um teólogo católico alemão,
sacerdote e escritor na aposentadoria.
² Obs.: As reflexões do Ferdinand
Krenzer fascinam pelo seu jeito simples e direto, e agradam o leitor,
ajudando-o a entender melhor o caminho da fé cristã e compreender os temas mais
difíceis desta doutrina.
Os textos publicados neste blog são
tomados do livro Taka jest nasza wiara, desse autor; uma edição no idioma
polonês, do qual faço uma tradução livre (para o português). O título original: “Morgen wird man wieder Glauben”.
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