Acho que é importante conhecer as opiniões do Papa Francisco sobre vários temas e questões, dos quais atualmente se fala muito. Embora de forma
bem curta, ele respondeu às perguntas durante uma entrevista, ao estar
terminando a sua viagem à Terra Santa. É muito bom saber o que ele diz.
A matéria foi publicada recentemente por Vatican Insider, e também no site do
Instituto Humanitas Unisinos (IHU). Para
ajudar na sua divulgação, trago-a para o blog Indagações-Zapytania.
Vale a pena conferir!
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IHU - Notícias
Quarta, 28 de
maio de 2014
Abusos,
celibato, família, liberdade religiosa... Os temas tratados pelo Papa na viagem
de retorno a Roma
O Papa
Francisco, novamente, abre-se com
os jornalistas. Apesar do cansaço da viagem, submeteu-se durante uma hora às
perguntas dos jornalistas que viajaram com ele à Terra
Santa. Os temas abordados nas respostas do Pontífice
aos jornalistas, durante o voo de retorno a Roma de Israel, foram:
- “Tolerância
zero, inclusive aos bispos, contra a pedofilia. Não haverá “filhos de papai”.
- Liberdade
religiosa: “Hoje há mais mártires do que nos primeiros tempos”.
- Minhas
decisões? “Será o que Deus quiser. Ratzinger
abriu o caminho”.
- Sobre os 15 milhões perdidos no IOR,
que foram investidos na “Lux Vide”: “É uma coisa sob análise. Somos pecadores,
mas é preciso procurar fazer com que aconteçam menos escândalos”.
- Divorciados em segunda união: “Não gostei que
homens de Igreja tenham se focado apenas sobre esse tema da
relação de Kasper, o Sínodo é
sobre a família”.
A compilação
dos principais trechos da entrevista do Papa Francisco é
de Andrea Tornielli, publicada por Vatican
Insider, 27-05-2014. A tradução é do Cepat.
Entrevista
Os abusos contra menores
Neste
momento, há três bispos sendo investigados. Sobre um, já condenado, está se
estudando a pena. Não há privilégios sobre este tema dos menores.
Na Argentina
dizemos sobre os privilegiados: este é um filho de papai. Sobre este tema não
haverá filhos de papai. É um problema muito grave. Um sacerdote que realiza um
abuso trai o corpo do Senhor. O sacerdote deve conduzir o
menino ou a menina à santidade. E este confia nele. Ao invés de conduzi-lo à
santidade, ele abusa dele ou dela. É gravíssimo! É como fazer uma missa negra!
Ao invés de conduzi-lo à santidade, levo-o a um problema que terá por toda a
sua vida. Em breve, haverá uma missa com algumas pessoas vítimas de abuso, em Santa
Marta, e depois haverá uma reunião, eu com eles. Sobre isto
deve haver tolerância zero.
Os 15 milhões de euros do IOR investidos na “Lux Vide”
O
Senhor Jesus disse, certa vez, aos seus discípulos: é
inevitável que haja escândalos, somos humanos e todos pecadores. O problema é
evitar que haja mais escândalos. Na administração econômica, requer-se
honestidade e transparência. As duas comissões, a que estudou o IOR
e a que estudou a situação econômico-financeira de todo o Vaticano, chegaram a
suas conclusões e agora, com o ministério e a Secretaria para a Economia,
dirigida pelo cardeal Pell, vão ser realizadas as
reformas aconselhadas. No entanto, ainda haverá contradições, sempre haverá,
porque somos humanos. E a reforma deve ser constante.
Os
Padres da Igreja diziam que a Igreja deve ser “semper
reformanda”. Somos pecadores, somos fracos. A Secretaria
para a Economia ajudará a evitar escândalos e problemas. Por
exemplo, no IOR foram fechadas 1600 contas de pessoas que não tinham
direito. O IOR é para ajudar a Igreja, os
bispos têm direito, as dioceses, os empregados do Vaticano,
suas viúvas, as embaixadas, porém nada mais. Não é uma coisa aberta. E este é
um bom trabalho, fechar as contas dos que não têm direito. Eu diria uma coisa:
a questão dos 15 milhões ainda está sendo estudada, ainda não está claro o que
aconteceu.
Os gestos na Terra Santa e o encontro com Peres e Abbas
Os
gestos mais autênticos são os que não são pensados. Eu havia pensado se poderia
ser feito algo, mas nenhum dos gestos concretos que fiz havia sido pensado.
Algumas coisas, como o convite aos dois presidentes, havia se pensado que fosse
ali, durante a viagem, mas havia tantos problemas logísticos, muitos: o
território onde deveria ocorrer; não era fácil. Entretanto, ao final, surgiu o
convite, e espero que o encontro ocorra bem. No entanto, os meus gestos não
eram pensados. Tenho isso de fazer algo, assim, espontaneamente.
Para
esclarecer sobre o encontro no Vaticano, será um encontro de
oração, não para fazer uma intermediação. Com os dois presidentes, nós nos
reuniremos somente para rezar e acredito que a oração é importante, e fazer
isto ajuda. E, depois, todos retornam para casa. Estará um rabino, um islâmico
e eu. Pedi ao Custódio da Terra Santa que
organize um pouco as coisas práticas.
Populismo e eleições europeias
Tive
tempo para rezar alguns Pais-nossos, mas não soube nada sobre as eleições. O
populismo na Europa, a confiança ou a
desconfiança, algumas teses sobre o euro..., disto não entendo muito. Todavia,
o desemprego é grave: estamos em um sistema econômico mundial em que o centro é
o dinheiro, não a pessoa humana. Este sistema descarta para se manter.
Descartam-se crianças: o nível dos nascimentos não é alto, na Itália
são menos de dois por casal; na Espanha ainda é mais baixo.
Descartam-se os anciãos, inclusive com a eutanásia escondida, os remédios são
dados somente até certo ponto. E se descartam os jovens. Na Itália,
acredito que o desemprego juvenil está ao redor de 40%, na Espanha é de 50% (em
Andaluzia de 60%). Há toda uma que não estuda e nem trabalha. Esta cultura do
descartável é gravíssima. Não existe apenas na Europa, mas na Europa se sente
muito forte. É um sistema desumano este sistema econômico, como disse na Evangelii Gaudium.
Sobre Jerusalém, capital da Palestina
Há
muitas propostas sobre a questão de Jerusalém. A Igreja
católica, o Vaticano, tem sua posição do ponto
de vista religioso: uma cidade da paz para as três religiões. As medidas
concretas para a paz devem ser negociadas, talvez se decida que uma parte se
torne a capital de um estado e a outra do outro... Contudo, não me sinto
competente para dizer para que se faça isto ou aquilo, seria uma loucura de
minha parte. Acredito que se deve entrar com fraternidade, mútua confiança, na
via da negociação. Requer-se coragem, e eu rezo muito ao Senhor para que estes
dois presidentes tenham a coragem de seguir em frente. Sobre Jerusalém digo
apenas para que seja a cidade de paz para as três religiões.
Celibato e sacerdotes
A Igreja católica
tem sacerdotes casados nos ritos orientais. O celibato não é um dogma de fé, é
uma regra de vida que eu aprecio muito e que acredito que é um dom para a
Igreja. Ao não ser um dogma de fé, a porta está aberta.
Relação com os ortodoxos
Com
Bartolomeu I conversamos sobre a unidade, que é feita
pelo caminho, em um caminho. Nunca poderemos fazer a unidade em um congresso de
teologia. Confirmou-me que Atenágoras disse, de verdade, para Paulo VI: “Coloquemos
todos os teólogos em uma ilha, e sigamos juntos’. Devemos nos ajudar, por
exemplo, com as Igrejas, inclusive em Roma. Muitos ortodoxos usam igrejas
católicas. Conversamos sobre o Concílio pan-ortodoxo, para que
seja feito algo a respeito da data da Páscoa. É um pouco ridículo: “Vamos
ver, diga-me, seu Cristo quando ressuscita? O meu na
próxima semana. O meu já ressuscitou na semana passada”. Com Bartolomeu
conversamos como irmãos, queremo-nos muito, compartilhamos as dificuldades de
nossos governos. Falamos bastante sobre a ecologia, de juntos fazermos um
trabalho sobre este problema.
Viagem ao Sri Lanka e Filipinas. Liberdade religiosa
Há
duas viagens programadas: para a Ásia, Coreia do
Sul, (em agosto deste ano - nota da IHU On-Line) e em janeiro
uma viagem de dois dias ao Sri Lanka e, depois, Filipinas,
na região onde ocorreu o tsunami. O problema da liberdade de praticar a
religião não existe somente em alguns países asiáticos, mas também em outros. A
liberdade religiosa é algo que nem todos os países têm. Alguns exercem um
controle, outros tomam medidas que acabam em uma verdadeira perseguição. Há
mártires hoje, mártires cristãos, católicos e não católicos. Em alguns lugares
não se pode carregar um crucifixo, ter uma Bíblia ou
ensinar o catecismo às crianças. E eu acredito que, no momento atual, há mais
mártires do que nos primeiros tempos da Igreja.
Devemos
nos aproximar de alguns lugares, com prudência, para ajudá-los. Rezar muito por
estas Igrejas que sofrem tanto. Também os bispos e a Santa Sé trabalham com
discrição para ajudar os cristãos destes países, mas não é nada fácil. Por
exemplo, em um país é proibido rezar juntos. Os cristãos que vivem lá querem
celebrar a Eucaristia, e há um senhor que é operário, mas é sacerdote, e vai à
mesa com os outros. Agem como se estivessem tomando chá e celebram a
Eucaristia. Caso cheguem os policiais, escondem os livros e parece que estavam
tomando chá.
Minha eventual renúncia
Eu
farei o que o Senhor me disser que faça. Rezar, procurar fazer a vontade de
Deus. Bento XVI já não tinha forças e, honestamente, como
homem de fé, humilde como é, tomou esta decisão. Há setenta anos, os bispos
eméritos não existiam. O que vai acontecer com os Papas eméritos? Devemos ver Bento XVI
como uma instituição, abriu uma porta: a dos Papas eméritos. A porta está
aberta, haverá outros ou não. Deus é quem sabe. Eu acredito que caso um bispo
de Roma sinta que as forças o abandonam, deve se colocar as mesmas perguntas
que o Papa Bento refletiu.
A Beatificação de Pio XII
A
causa está aberta. Informei-me e ainda não há nenhum milagre. Está parada e não
pode seguir adiante. Devemos respeitar a realidade da causa. Mas, não há
milagre. É necessário que haja pelo menos um para a beatificação. Eu não posso
pensar se o faço beato ou não.
Divorciados em segunda união
O Sínodo
será sobre a família, sobre o problema da família e sobre suas
riquezas e situação atual. A exposição preliminar que o cardeal Kasper
fez tinha cinco capítulos, quatro dos quais sobre as coisas belas da família e
sobre seu fundamento teológico. O quinto capítulo era sobre o problema pastoral
das separações e sobre a nulidade matrimonial, e aí também está o tema da
comunhão aos divorciados em segunda união.
Eu
não gostei que muitas pessoas, inclusive da Igreja,
tenham dito: “O Sínodo é para dar a comunhão aos
divorciados em segunda união”, como se tudo se reduzisse a uma casuística. Hoje
sabemos, a família está em crise, é uma crise mundial, os jovens não querem se
casar ou convivem. Não gostaríamos que caíssemos nesta casuística: será
permitido ou não dar a comunhão? O problema pastoral da família é muito amplo,
muito amplo. Deve-se estudar caso por caso. Sempre considero uma coisa que Papa
Bento já disse três vezes: é preciso estudar os procedimentos
da nulidade matrimonial, estudar a fé com a qual uma pessoa vai ao casamento e
esclarecer que os divorciados não estão excomungados. Muitas vezes, são tratados
como se estivessem. Escolher o tema do Sínodo sobre a família foi uma
experiência espiritual muito forte, lentamente se acabou falando sobre a
família. Estou seguro de que o Espírito do Senhor nos conduziu até este ponto.
Obstáculos para a reforma da Cúria
O
primeiro obstáculo sou eu! Estamos em um bom momento, consultamos toda a Cúria.
As coisas começam a ser estudadas para dar agilidade à organização, por
exemplo, juntando dicastérios. Um dos pontos chave foi o da economia: o
dicastério da Economia deve trabalhar com a Secretaria de Estado.
Agora, em julho, teremos quatro dias de trabalho e, depois, em fins de
setembro, outros quatro, mas se trabalha. Todos os resultados não são vistos
ainda, mas a parte econômica é a que se tocou antes. Havia alguns problemas
sobre os quais a imprensa falava bastante. A via da persuasão é muito importante.
Há algumas pessoas que não veem as coisas com clareza. Mas, eu estou contente,
trabalhou-se bastante.