No dia 11
de outubro de 1962 foi oficialmente inaugurado o Concílio Ecumênico Vaticano II
pelo papa João XXIII. Foram realizadas 4 sessões durante os três anos subseqüentes.
Nesse mesmo tempo, após a morte do papa
João XXIII, foi eleito o novo papa –
Paulo VI. Foi ele que presidiu o encerramento do Concílio Vaticano II no dia 08
de dezembro de 1965 e aplicou os seus documentos.
Portanto,
comemoramos agora, nestes dias, justamente 50 anos da inauguração desse grande
evento que nos últimos 50 anos marcou profundamente a Igreja Católica e teve –
sem dúvida nenhuma - a grande importância também para o mundo todo.
É uma
data propícia para avaliações, análises e opiniões sobre esse tema. Oxalá
que toda a Igreja Católica aproveite esta
oportunidade para fazer um profundo “exame de consciência”. Para quê? –
Para continuar, ainda com maior fervor,
a realizar as boas obras – o fruto das reformas
assumidas no Concílio Vaticano II, e para reconhecer que também foram
cometidos os erros e as omissões,
que atrapalharam e ainda atrapalham esse
“aggiornamento” da Igreja no mundo atual e moderno.
Ao meu
ver, com o Concílio Vaticano II as “portas” foram abertas e muitos, com
entusiasmo e imensa alegria, passaram por elas. Porém, muitos não compreenderam
a necessidade de atravessá-las: teve gente que ficou com medo de avançar; teve gente que preferiu ficar
atrás, agarrada à nostalgia e aparente “segurança” do passado, e teve também
aqueles que não deixaram outros passar
adiante (e continuam, não deixando!). Resultado: triste constatação que a
Igreja “perdeu ritmo” e está “ficando para trás” nesse caminho dos homens rumo
ao Reino de Deus. Alguns apostam que basta aplicar as “maquiagens”, imitar os outros e/ou voltar aos
velhos métodos do passado, para a Igreja de novo “reaparecer” na frente. Mas,
será que esta seria a solução? Aliás, a
realidade presente (e pesquisas!) demonstram que não. Seriamente, o “aggiornamento” não é - e não pode ser - entendido desta forma. Na certa, a própria história julgará esses fatos.
Talvez hoje já seja necessário o
“aggiornamento” atualizado e adaptado aos nossos tempos... Diz o ditado que uma das coisas que não se pode voltar atrás, é a
oportunidade perdida. Portanto – creio eu - é urgente sentir o sopro do
Espírito e não perder mais tempo.
Não é verdade?
Para quem estiver interessado em conhecer
um pouco mais sobre este assunto, sobretudo em relação à América Latina e
Caribe, trago para o blog Indagações, uma
reflexão muito interessante que foi publicada recentemente no ADITAL¹. É o artigo do Pedro A. Ribeiro de
Oliveira. Recomendo.
WCejnog
Comemorar os 50 anos do Concílio
Ecumênico de 1962-65
Pedro
A. Ribeiro de Oliveira²
ADITAL - 13.09.12 - Mundo
O verbo "comemorar”
significa "juntar-se a outras pessoas para fazer a memória” e traz
implícito o sentimento de alegria que perpassa esse encontro. E disso se trata:
trazer para o tempo atual aquele grande evento de meio século atrás.
Habitualmente se identificam os concílios pelo local – e não pela época – de
sua realização. Mas no caso desta comemoração é muito mais importante datar o
evento do que sua localização na cidade-estado do Vaticano. Neste breve artigo
quero destacar seu caráter de mudança de época.
Os anos de 1945 a 1973 ficaram
conhecidos como "anos dourados”, porque entre o término da guerra e a
primeira crise do petróleo o desenvolvimento das forças produtivas provocou
profundas transformações sociais, culturais e políticas em todas as partes do
mundo. É nesse contexto que se inscreve a grande reunião do episcopado
católico, a pedido dos Papas João XXIII e Paulo VI, para "colocar em dia”
a Igreja Católica nesse mundo que iniciava seu processo de globalização. Por
mais que a "tradição dos Pios”(1) ainda fosse hegemônica entre o clero
encastelado nas cúrias eclesiásticas, já era evidente seu anacronismo diante do
mundo moderno prestes a entrar na revolução cultural que eclode em 1968. As
pesquisas sócio-religiosas apenas confirmavam o que qualquer pessoa atenta aos
fatos podia observar: a crescente desafeição dos fiéis pelas normas e
doutrinas em vigor na Igreja católica romana. Foi o abalo institucional
provocado pelo caráter ecumênico do concílio que permitiu seu diálogo com a
modernidade.
O concílio foi ecumênico não só
por reunir bispos de todo o mundo –inclusive estadunidenses incapazes de se
expressarem em latim– quanto por seu espírito de abertura a outras Igrejas
cristãs. A velha cúria romana, que se via e era vista como indispensável ao
Papado – e, por conseguinte, à unidade da Igreja universal – de repente se vê
ultrapassada pela colegialidade episcopal.
A aliança estratégica formada pelos
"padres conciliares” em sintonia com o papa derruba a fortaleza da cúria
romana e faz avanços notáveis no campo teológico, bíblico, litúrgico e
sociopolítico. Foi como um arado que desmancha os restos da antiga plantação ao
preparar o terreno para nova semeadura. E assim, passados apenas três anos,
novos campos estavam semeados e já começavam a frutificar.
As Igrejas da América Latina e
Caribe receberam os frutos do Concílio ecumênico não somente para saboreá-los,
mas também para deles tirarem novas sementes a serem plantadas em seus campos.
Eram tempos difíceis, marcados por ditaduras militares, violações de direitos
humanos, resistência armada e, principalmente, o esmagamento dos direitos dos
pobres. A assembléia episcopal de Medellín, em 1968, traça as diretrizes
pastorais que adaptarão aquelas sementes aos solos de Nossa América. Em pouco
tempo elas desabrocham num novo modo de ser Igreja(2) que engloba as Comunidades
Eclesiais de Base, as Pastorais sociais e as Conferências episcopais; a
teologia que lhe serve de fundamento será conhecida por sua proposta de
Libertação face às estruturas opressoras em vigor em nossas sociedades; enfim,
a explicitação da opção preferencial pelo pobres –presente já na própria
convocação do Concílio – vem completar o quadro estrutural desse catolicismo
recomposto desde suas fontes neotestamentárias rejuvenescidas pelo Concílio de
1962-65.
Quando tudo indicava que a
Igreja católica, renovada desde dentro, partiria em missão no mundo conturbado
pela "guerra fria” para proclamar a boa nova da Paz com Justiça, ocorre o
inesperado retorno da antiga aliança entre o Papa e a Cúria Romana,
enfraquecendo-se a colegialidade episcopal universal e o ecumenismo. Com
efeito, apesar de afirmarem sua adesão à teologia consagrada pelo Concílio, os
dois últimos papas governaram a Igreja como se lhes bastasse o apoio das
congregações romanas. Nesse contexto, as Igrejas particulares que seguem
levando em frente às propostas do Concílio se vêem marginalizadas por Roma,
como se não fossem, também elas, concretizações legítimas da mesma Igreja
católica.
É, portanto, muito oportuno – e
muito bom! – promover encontros e reuniões onde se torne presente, ao fazer-se
a memória, o evento do Concílio Ecumênico de 1962-65.
Notas:
(1)
Uso a expressão de J. B. Libanio para referir-se ao catolicismo em vigor
desde Pio VI até Pio XII (1775-1958).
(2) Essa expressão foi usada no
documento nº 25 da CNBB sobre as CEBs (1982, 5). Sua recepção nas próprias
comunidades foi tão boa que se tornou como que o seu lema até os dias de hoje.
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² Pedro Ribeiro de Oliveira
é doutor em Sociologia pela Universite Catholique de Louvain, na Bélgica.
Atualmente, é professor da PUC Minas. Dentre suas obras, destacamos Fé e Política: fundamentos
(Aparecida: Idéias & Letras, 2004), Reforçando a rede de uma Igreja missionária
(São Paulo: Paulinas, 1997) e Religião
e dominação de classe (Petrópolis:Vozes, 1985).
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