Faz
27 anos do dia, em que foi assasinado o Padre Josimo Tavares. É muito
importante manter viva a sua imagem em nossa memória e em nossos corações!
O
sangue deste mártir, como também o
sangue de tantos outros mártires, homens e mulheres da América Latina, que com
a sua vida, com o compromisso destemido
com a construção do reino de Deus na vida dos homens e com o seu martírio, continuam
ser o exemplo mais forte que existe para todos nós, os cristãos de hoje, questionando
a nossa mediocridade, medo e covardia em assumir a defesa dos nossos irmãos mais pobres e principalmente
dos excluídos da sociedade.
O
sangue desses mártires questiona sobretudo a omissão e o farisaismo de todos
aqueles, que dizem-se seguidores de Jesus, mas não mexem dedo sequer para
questionar as estruturas opressoras e
injustas e os sistemas que negam o Evangelho e o mandamento de amor; ao
contrário, aproveitam-se deles para ter privilégios e vantagens.
Um
artigo muito especial, de Gilvander Moreira, publicado nestes dias pelo Instituto Humanitas Unisinos
(IHU), ajuda-nos a recordar com carinho o mártir - Pe. Josimo Tavares.
Não
deixe de ler.
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Notícias
Terça, 07 de
maio de 2013
Padre Josimo Tavares: 27 anos de martírio
"Dia 10 de maio de 1986, dia
das mães, padre Josimo foi
assassinado covardemente enquanto subia as escadas do prédio da Mitra Diocesana de
Imperatriz, MA, onde funcionava o escritório da CPT Araguaia-Tocantins. Ainda
teve forças para entrar no hospital andando. Isso foi o que fazendeiros deram a
dona Olinda,
mãe do padre Josimo,
no dia das mães", escreve Gilvander Moreira, frei e padre
carmelita, mestre em Exegese Bíblica, professor de Teologia Bíblica; assessor da
CPT, CEBI, SAB e Via Campesina, em artigo.
Eis o artigo.
Dia
10 de maio de 2013, antevéspera do dia das mães, celebramos 27 anos do martírio
do padre Josimo
Tavares. Por isso o recordamos. Após tentativa de assassinato
contra padre Josimo Moraes Tavares, no dia 15 de abril de 1986, quando cinco
tiros foram disparados contra a Toyota
dele, profundamente ameaçado de morte e de ressurreição, incompreendido até por
colegas padres e agentes de pastoral, padre Josimo foi "intimado" a
elaborar um relatório de suas atividades e a esclarecer as circunstâncias que
levaram a tantas ameaças de morte contra ele.
Em
seu belíssimo Testamento Espiritual pronunciado durante a Assembleia Diocesana de
Tocantinópolis, MA, no dia 27 de abril de 1986, poucos dias
antes de seu assassinato, dizia
Josimo que sua morte estava anunciada, encomendada e prescrita
nos anais das correntes que desejavam ardentemente eliminá-lo. Novos Anás e
novos Caifás já o haviam julgado. Mas
Josimo se encontrava firme, pois havia assumido o seu trabalho
pastoral no compromisso e na causa em favor dos pobres, dos oprimidos e
injustiçados, impulsionado pela força do Evangelho. Josimo declarou:
"Pois
é, gente, eu quero que vocês entendam que o que vem acontecendo não é fruto de
nenhuma ideologia ou facção teológica, nem por mim mesmo, ou seja, pela minha
personalidade. Acredito que o porquê de tudo isso se resume em três pontos
principais:
- Por Deus ter me chamado com o dom
da vocação sacerdotal e eu ter correspondido.
- Pelo senhor bispo, D. Cornélio, ter me
ordenado sacerdote.
- Pelo apoio do povo e do vigário de Xambioá, então Pe. João Caprioli, que me ajudaram a vencer nos estudos.
- Pelo apoio do povo e do vigário de Xambioá, então Pe. João Caprioli, que me ajudaram a vencer nos estudos.
"O discípulo não é maior do que
o Mestre. Se perseguirem a mim, hão de perseguir vocês também." Tenho que
assumir. Agora estou empenhado na luta pela causa dos pobres lavradores
indefesos, povo oprimido nas garras dos latifúndios. Se eu me calar, quem os
defenderá? Quem lutará a seu favor? Eu pelo menos nada tenho a perder. Não
tenho mulher, filhos e nem riqueza sequer, ninguém chorará por mim. Só tenho
pena de uma pessoa: de minha mãe, que só tem a mim e mais ninguém por ela.
Pobre. Viúva. Mas vocês ficam aí e cuidarão dela. Nem o medo me detém. É hora
de assumir. Morro por uma justa causa. Agora quero que vocês entendam o
seguinte: tudo isso que está acontecendo é uma conseqüência lógica resultante
do meu trabalho na luta e defesa pelos pobres, em prol do Evangelho que me
levou a assumir até as últimas conseqüências.
A
minha vida nada vale em vista da morte de tantos pais lavradores assassinados,
violentados e despejados de suas terras. Deixando mulheres e filhos
abandonados, sem carinho, sem pão e sem lar. É hora de se levantar e fazer a
diferença! Morro por uma causa justa .”
Mas ele não imaginava que a morte viria tão cedo. Dia 10 de maio de 1986, dia das mamães, padre Josimo foi assassinado covardemente enquanto subia as escadas do prédio da Mitra Diocesana de Imperatriz, MA, onde funcionava o escritório da CPT Araguaia-Tocantins. Ainda teve forças para entrar no hospital andando. Isso foi o que fazendeiros deram a dona Olinda, mãe do padre Josimo, no dia das mães.
Padre Josimo era
coordenador da Comissão
Pastoral da Terra – CPT no Bico do Papagaio. O pistoleiro Geraldo Rodrigues da Costa
efetuou dois disparos com uma pistola de calibre 7,65. Para executar Josimo contou com a
participação de Vilson
Nunes Cardoso, que até hoje está foragido.
Em
1993, nova denúncia, apontou como mandantes do assassinato de Padre Josimo, Geraldo Paulo Vieira,
Adailson Vieira,
Osmar Teodoro da Silva,
Guiomar Teodoro da
Silva,
Nazaré Teodoro da Silva e Osvaldino Teodoro da Silva e João Teodoro da Silva.
Em 1998 Adailson
Vieira,
Geraldo Paulo Vieira (pai do Adailson) e Guiomar Teodoro da Silva
foram julgados e condenados. Os dois primeiros foram condenados a 19 anos de
reclusão e Guiomar, a 14 anos e 3 meses. João
Teodoro da Silva faleceu antes de ser levado a julgamento. Geraldo morreu
alguns meses depois da sentença. Osmar
Teodoro da Silva ficou foragido durante anos, sendo capturado
pela polícia somente em 2001, depois de ter sido alvo do programa Linha Direta, na TV Globo. Em
setembro de 2003, ele foi condenado, por unanimidade, a 19 anos de reclusão.
Geraldo
Rodrigues da Costa,
o executor do crime, foi condenado, em 1988, a 18 anos e 6 meses de reclusão.
Conseguiu fugir da penitenciária por três vezes, mas, depois da última fuga,
nunca mais fora encontrado. Há informações de que faleceu durante fuga após um
assalto na cidade de Guaraí, Tocantins.
Em
2006, Claudemiro Godoy
do Nascimento, no artigo “20 anos com Josimo”, recordava:
“Há
20 anos atrás, o Brasil vivia momentos de transformações políticas e econômicas
que dinamizavam o cenário das relações políticas. Na região do Bico do Papagaio
a situação não se diferenciava. Com o anuncio do fim do regime ditatorial havia
uma rearticulação política das oligarquias rurais na chamada Nova República. A
luta social se encontrava diante de fortes momentos de tensão e conflito por
parte de fazendeiros e trabalhadores rurais que tinham na Igreja, na CPT, nos sindicatos
e nos novos movimentos sociais do campo uma esperança em ver realmente a Terra
partilhada para todos e todas.
Josimo é a testemunha fiel e nos ensina de que vale a pena dar
a vida pela causa do Reino, das comunidades e do povo. Sua morte significou o
compromisso assumido em denunciar as estruturas de morte alimentadas pelas
injustiças políticas de mandos e desmandos de uma oligarquia rural que ousava (ou
ainda ousa) se estabelecer no poder da República. É neste sentido que Josimo se torna o
padre mártir da Pastoral da Terra ao selar com seu sangue uma opção, um
compromisso e um engajamento na defesa dos oprimidos, em especial, os
trabalhadores rurais. Poderíamos relembrar os versos de Pedro Tierra
escritos por ocasião do martírio de Padre
Josimo em maio de 1986:
Quem
é esse menino negro / Que desafia limites? / Apenas um homem. / Sandálias
surradas. /Paciência e indignação. / Riso alvo. / Mel noturno. / Sonho
irrecusável. / Lutou contra cercas. / Todas as cercas./ As cercas do medo. / As
cercas do ódio. / As cercas da terra. / As cercas da fome. / As cercas do
corpo. / As cercas do latifúndio.
Diante
de tanta fé e de uma teimosia do Reino inexplicável, Josimo sentia-se
fortalecido pela experiência de Deus, pois se encontrava dentro do próprio
Deus. Com certeza,
Josimo fez a experiência de Deus que somente os grandes
místicos da humanidade fizeram. Um homem que chega a ponto de saber que terá
seu sangue derramado em defesa dos pobres e pela causa do Reino só pode ter
tido a experiência concreta do Deus que se fez gente entre os homens e
mulheres.
Para Josimo ser padre
significava sentir a vida brotando como serviço justo a Deus e aos pobres,
sobretudo. Para ele, o culto, a eucaristia, a teologia do sacrifício
significava o agrado que fazemos a Deus no serviço aos pobres, aos doentes e
marginalizados da sociedade. Percebemos nos escritos, nos poemas e nos
registros de Josimo
uma profunda intimidade com sua opção primeira, a saber: a Diakonia, ou seja, o
serviço, o estar sempre servindo aos mais necessitados.
Necessitados
do Bico do Papagaio eram os trabalhadores rurais expulsos e espoliados da terra
pelos grandes fazendeiros locais e pelos políticos ao estilo coronelista.
Portanto, ser padre
Josimo era ser Profeta na Justiça, Pastor na Caminhada e
Sacerdote humilde que procurava oferecer a Deus oferendas justas. Josimo é a própria
oferta. Tornou-se um ofertório vivo para nossas comunidades e para a construção
do Reino.
Com
certeza, a memória dos 26 anos do martírio de Padre Josimo nos traz à
luz a experiência das Comunidades
Eclesiais de Base, da Igreja Povo de Deus, Igreja Povo Novo
enquanto sinal do Reino de Deus no mundo. Novos Josimos só surgirão quando a Igreja
novamente for sinal vivo do Reino de Deus, quando estiver ao lado dos pobres e
oprimidos, dos fracos e perseguidos; quando denunciar as injustiças e as
opressões cometidas contra o povo; quando anunciar a esperança, a fé, o amor e
a alegria aos pobres.
10
de maio de 2012 são 26 anos com
Josimo. Ele continua vivo. Vivo nas memórias do povo, nas
experiências dos educadores populares, nos escritos da Teologia da Libertação e
no compromisso dos poucos agentes de pastorais que continuam reafirmando o
mesmo compromisso com o Reino, com a causa de um novo mundo, com a justiça
social e a solidariedade para com os excluídos da sociedade. Vivo no
martirológico latino-americano, alternativo por excelência, sem nenhuma ligação
e reconhecimento por parte da estrutura eclesial oficial. A história não pode
perder a figura de Josimo. Ele é importante na história porque promoveu com o
povo a história. Com Josimo,
os dominados contam suas histórias. Com Josimo,
a história não é na lógica da classe dominante. Com Josimo, os dominados
são os sujeitos históricos.”
O
nome de Padre Josimo
está hoje em centenas de Acampamentos de Sem Terra, de Assentamentos de Reforma
Agrária e de Comunidades Eclesiais de Base. Ele está muito vivo e presente nos
corações e na mente de milhões de pessoas que lutam para que a Mãe terra seja
libertada das garras do latifúndio e partilhada com milhões de sem-terra
através de uma reforma agrária popular, massiva e democrática.
Algumas
pessoas nos alertam perguntando: "Por que valorizar tanto o martírio, o
sofrimento...?" Devemos ser criteriosos para não incentivarmos um martírio
voluntário. É claro que existem muitas pessoas que, de mil e uma formas, e não
raro, de um jeito eficaz e abrangente, dão testemunho, dinamizam a vida, atuam
na cidadania e constroem o bem comum. Não podemos também jamais esquecer a
memória dos inúmeros mártires da caminhada. Ai de um povo que esquece os seus
mártires.
José
Vicente,
compositor e cantor das
CEBs – Comunidades Eclesiais de Base – diz sobre Padre Josimo: “Padre Josimo sofreu
várias ameaças, dois atentados e foi executado à bala, por um pistoleiro, a
mando de um grupo de fazendeiros da região chamada Bico do Papagaio no
Tocantins, onde ele acompanhava toda a situação de conflitos pela posse da
terra e pelos direitos dos trabalhadores, como membro da coordenação da CPT.
Como
cantor da caminhada, movido pelo testemunho de Josimo, Zé Vicente compôs a música
"Renascerá” em sua homenagem.
De um novo destino renascerá!
E chegará, e chegará tempo novo sagrado
Há tanto esperado, pra nós chegará!”
Dona
Olinda, mãe de
Padre Josimo
ainda vive e mora na região do Bico do Papagaio. Ao contemplar sua imagem tão
pequena, cabelos brancos, silenciosa, vestindo a camiseta comemorativa, com a frase
do testamento do filho: "morro por uma Causa justa!”, o nosso coração arde
de emoção. Quem conviveu com Josimo
diz: "Ele era um poeta, tocava violão, gostava de escutar as histórias das
pessoas, tinha um jeito manso, gostava de usar aquelas chinelas havaianas...”
Ao
contemplar o pôr-do-sol na beira do grande Rio Tocantins, sob a lua nova que
também deu o ar de graça sobre os presentes, a última estrofe do Samba pra Josimo irrompe na
lembrança, como utopia teimosa, assinada com seu sangue há 27 anos.
Levará teu sonho a todos os confins
E cada braço erguido, conquistando o chão
Terá as energias do teu coração!”
Assim seja! Amém, Aleluia, Auerê, Uai!
Belo Horizonte, MG, Brasil, 10 de maio de 2013, 27 anos
com padre
Josimo Tavares vivendo vida plena.
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