Achei bem interessantes e muito acertadas as
colocações da filósofa Viviane Mosé sobre os desafios do Brasil em relação ao
Ensino Médio, que ela expôs numa entrevista publicada no início do mes de
agosto de 2014 no jornal O Globo. A matéria foi publicada também,
postriormente, no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Vale a pena ler.
WCejnóg
IHU
- Notícias
Terça, 05 de agosto de
2014
O ensino médio se reduziu a
uma preparação para o vestibular’, diz educadora
Para a filósofa Viviane
Mosé, educadores precisam refletir sobre as reais demandas dos
alunos e adequar o ensino aos novos tempos. Ela participará do encontro
internacional “Educação 360”, que será realizado
nos dias 5 a 6 de setembro na Escola Sesc de Ensino Médio, no Rio,
em parceria com o Sesc e a prefeitura do Rio e
apoio do Canal Futura.
A entrevista foi
publicada pelo jornal O Globo, 03-08-2014.
Eis a
entrevista.
A sra. já
disse que precisa haver uma revolução no ensino médio. Que revolução seria
essa?
Se o ensino
fundamental tem melhorado, o ensino médio permanece estagnado. Como trata da educação de adolescentes e jovens, é hoje o olho do
furacão. Mesmo com oferta de vagas, com a melhora das condições físicas das
escolas, muitos jovens abandonam os estudos, fenômeno que já aparece nos anos
finais do ensino fundamental. A escola, do modo como está estruturada, não
consegue atrair. Se esse fenômeno acontece em muitos países, em função da
democratização do saber permitida pela internet, no Brasil
se apresenta de modo ainda mais grave, já que o ensino médio se reduziu a uma preparação para o vestibular. Como as
escolas públicas não conseguem competir com as particulares, jovens das classes
populares não encontram nada na escola: nem acesso à universidade, nem
ferramentas que o ajudem a viver melhor, nem acesso ao mercado de trabalho, nem
espaço de encontro e experiências lúdicas. Muitas medidas paliativas têm sido
tomadas, como as cotas para as escolas públicas nas universidades, mas nada
disso resolverá o problema. O Brasil
precisa repensar o ensino médio, que deve oferecer diferentes possibilidades,
dependendo da vocação e do interesse do aluno.
O que
torna um projeto educacional bem-sucedido?
Um projeto é bem
sucedido quando as crianças aprendem e não abandonam a escola. Quando encontram
na escola um espaço de crescimento não apenas intelectual, mas humano. A escola
não deve se sustentar na administração de conteúdos, mas na aquisição de
ferramentas para viver melhor. Os conteúdos estão disponíveis na rede,
precisamos estimular a capacidade de ler e interpretar dados e sofisticar nossa
habilidade de ler o mundo. Essa é uma escola que dá certo, pois permite que a
pessoa continue aprendendo.
Qual o
novo papel do professor?
Nós,
professores, nos sustentávamos nos conteúdos que tínhamos e devíamos passar aos
alunos. Hoje, esses conteúdos estão disponíveis, muitas vezes, com mais
dinamismo e qualidade nas novas mídias. Então, nosso poder passa a ser o de
preparar os alunos para lidar com as mídias. Isso significa incentivar a inteligência,
o pensamento e, especialmente, a capacidade de filtrar dados e interpretá-los,
para que não sejam levados por uma onda de informação manipulada ou de má
qualidade. O professor não é mais quem sabe tudo, mas quem se interessa por
tudo. A educação caminha para a formação de pesquisadores, e isso é muito
favorável.
As
escolas precisam olhar mais para as comunidades ao redor?
Elas devem se
abrir para o mundo. Não podem mais se esconder por trás de altos muros. Os
desafios do mundo devem ser questões presentes no cotidiano das escolas, não
apenas questões acadêmicas abstratas. Mas esse mal, o isolamento, deve começar
a ser vencido nas universidades, que nasceram dos conventos, com seus altos
muros.
Muitos
especialistas associam as manifestações do ano passado ao aumento do acesso à
educação. Acredita nesta conexão?
De forma
nenhuma. As manifestações são consequência do acesso às novas mídias, que
rapidamente reúne pessoas. Mas essa reunião se deu em um momento em que as
pessoas ainda não têm uma educação de qualidade, voltada para a vida, para as
questões sociais. Sem rumo, elas se perderam, não produziram conquistas,
desembocaram em violência. Em breve, teremos outro cenário: manifestações, sim,
enormes, mas com direção, sentido, maturidade política e intelectual.
No
encontro “Educação 360”, a senhora vai participar de uma mesa sobre as
iniciativas de educação que partem do Brasil. As ações brasileiras guardam um
diferencial comum?
Não há uma gente
mais criativa que a nossa, eu penso. Depois de andar do Oiapoque
ao Chui, tenho a honra de conhecer experiências incríveis e
inéditas que dão muito certo. Muitas vezes, escolas muito pobres; em outras,
mais ricas, sempre com criatividade e vontade, conseguem produzir uma educação
de qualidade. Temos de valorizar essas práticas e compartilhá-las, precisamos
adotar o modo brasileiro de educar que dá certo, e não importar modelos, o
mundo inteiro repensa a educação.
Fonte:IHU - Notícias
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