O artigo O clamor dos indígenas que
precisamos ainda ouvir, do Leonardo Boff *, é muito significante e bem oportuno para
chamar a atençaõ da sociedade brasileira sobre a questão indígena no Brasil nos
dias de hoje. O tema é de grande importância! Foi publicado recentemente pelo
autor no seu blog.
Para contribuir um pouco na divulgação deste texto,
trago-o também para o blog Infagações –Zapytania.
Vale a pena ler!
WCejnóg
O clamor dos indígenas que precisamos
ainda ouvir
25/10/2014
Por Leonardo
Boff
A causa
indígena nunca foi resolvida no Brasil. A toda hora se
ouvem invasões de terras indígenas para dar lugar ao agronegócio.
Homologação de suas terras são proteladas. E há assassinatos e suicídios
misteriosos entre os guarani.
Não obstante,
deram-se alguns avanços que cabe reconhecer como a demarcação e
homologação em área contínua da terra Yanomami contra a
pressão de meia dúzia de arrozeiros, apoiados pelo latifúndio
pelo agronegócio; a devolução da terra indígena xavante Marãiwatsédé na Prelazia de São Felix do Araguaia, de onde haviam sido arrancados à
força há 40 anos atrás. A mesma coisa não ocorreu com a terra dos Guarani
Kaiowá, Guyraroka, que o STF com os votos
dos ministros Celso Mello e Carmen
Lúcia rejeitaram o voto de relator do processo o
ministro Ricardo Lewandoski. Em nenhum momento a comunidade
indígena foi consultada e o latifundiário que as ocupou,
ganhou o direito sobre os 12 mil hecatares das terras tradicionais.
Casos como estes
são frequentes, por mais que a Funai e o CIMI
(Centro indigenista missionário da Igreja Católica) se empenhem em sua defesa.
Neste contexto vale recordar O Manifesto da Comissão Indígena 500 anos (1999)
expressando o clamor de 98 diferentes povos originários.
Eles denunciaram com veemência:
”Os conquistadores chegaram com fome de ouro e de
sangue, empunahando em uma das mãos armas e na outra a cruz, para abençoar e
recomendar as almas de nossos antepassados, o que daria lugar ao
desenvolvimento, ao cristianismo, à civilização e à exploração das riquezas
naturais. Estes fatores foram determinantes para o extermínio de
nossos antepassados….”
“O dia 22 de
abril de 1500 representa a origem de uma longa e dolorosa história… Afirmamos nossa
divergência clara e transparente com relação às comemorações festivas do V
centenário, por atentar e desrespietar nossos antepassados, mortos em defesa de
seus filhos, netos e gerações futuras. E por negarem nosso direito à vida como
povos culturalmente diferenciados…”
“Pretendemos
sim, celebrar as conquistas ao longo dos séculos, plenas de heróis
anônimos, que a história se nega a reconhecer. Celebramos sim, as vitórias que
nos custaram tantas vidas e sofrimentos, porém trouxeram a determinação e a
esperança de um mundo mais humano, de
solidariedade”.
“Celebraremos
também o futuro, herdeiros que somos de um passado de valorização da vida, de
ideais, de sonhos deixados por nossos antepassados. Apesar das desigualdades e
injustiças, estamos cientes da importância de contribuir para a consolidação
de uma humanidade livre e justa, aonde índios, negros e brancos
vivam com dignidade” (Jornal do Brasil de 31 de maio de 1999). Na campanha
presidencial nunca se abordou com seriedade esta demanda histórica dos
indígenas.
O que poderíamos
esperar dos portugueses que durante quinze séculos passaram pela educação
cristã? Que ao verem aqueles belos corpos na praia, espreitando curiosamente a
chegada das caravelas, exclamassem: “Que bom! Descobrimos mais irmãos e irmãs.
Vamos abraçá-los e beijá-los como membros da grande família de Deus,
representantes diferentes do corpo místico de Cristo”. Nada disso ocorreu.
Depois do
primeiro encontro pacífico, cheio de lirismo descrito pela carta de Pero Vaz
de Caminha, tudo mudou. Vieram com a
cobiça pelas riquezas da terra. Moveram-lhes guerras, chegaram a negar-lhes a
humanidade e, apesar de sua inocência e bondade natural, atestadas por todos os
primeiros missionários, consideraram-nos faltos de salvação. E os subjugaram e
os batizaram sob medo.
Alguma coisa
falhou no processo de educação e de evangelização dos europeus, notadamente dos
espanhois e dos portuguses que impediu que ocorresse verdadeiramente um
encontro de pessoas e de culturas. O que houve foi uma negação pura e simples
da alteridade.
O assim chamado “descobrimento”
equivaleu a um encobrimento e a um apagamento do outro, da história dos povos
originários do Brasil e de Africa. Também não significou um “encontro” de
culturas mas uma invasão. O que de fato ocorreu foi um imenso
desencontro, um verdadeiro choque de civilizações com o
submentimento completo dos negros e dos indígenas mais fracos. Até hoje fica a
marca deste ato fundacional nas formas como discriminamos
os indígenas, não respeitando suas terras sagradas e
mantendo preconceitos contra os afrodescentens, aqueles que construiram quase
tudo do Brasil.
____________
* Leonardo
Boff, pseudônimo de Genézio Darci Boff, é um teólogo brasileiro, escritor e
professor universitário, expoente da Teologia da Libertação no Brasil. Foi
membro da Ordem dos Frades Menores. Ficou conhecido pela sua história de defesa
das causas sociais. Atualmente dedica-se sobretudo às questões ambientais. (In.: Wikipedia)
Fonte:
Blog leonardoBOFF
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