As reflexões sobre a fé e, de modo especial, sobre a fé cristã, tornam muito clara a conclusão, de que “crer” de verdade significa, na vida cotidiana, ter um compromisso muito sério com Deus e com o seu projeto do Reino. Quer dizer, quem “crê” – deve demonstrar isso na sua vida, ter uma “ vida de fé”.
Acredito que esta verificação, comparando a “fé” e a vida de uma pessoa, pode ser considerada como um “teste” da fé. Na verdade, é um teste, e serve como “trampolim” para constatações muito sérias e tristes, ao olharmos a realidade do mundo em que vivemos.
Hoje, dois mil anos depois de Cristo, as estatísticas são claras: a população do nosso planeta ultrapassou 6 bilhões de pessoas, e 1/3 desse total são cristãos. Católicos – são mais de 1 bilhão (17,4%). Mas como é este nosso mundo? Como ele vai? Talvez haja quem dirá: “o mundo vai bem, não tem nada de errado”. Tem direito de achar assim. Mas não é assim!
Não podemos negar que os fatos gritam e as vozes de “alerta” soam cada vez mais frequentes e fortes. O nosso mundo “anda” nos caminhos tortos de desigualdade, de injustiça, preconceito, egoísmo e prepotência de uns, e a miséria e morte de outros seres humanos, tanto indivíduos, quanto de nações inteiras e continentes. A degradação da natureza, a poluição do Meio Ambiente, o risco de contaminar os oceanos com a exploração do petróleo descoberto nas suas profundezas, a ameaça de extinção de várias espécies de animais. Parece até que o “caminho da morte’ está sendo construído com mais premeditação e empenho. Por que será?
Por outro lado, o caminho do Reino, indicado por Deus, em Jesus Cristo, não raras vezes fica “desacreditado” e “deixado prá lá” por muitos (não quer dizer todos!), até mesmo esses, que professam a fé em Jesus Cristo, ou que assumiram a evangelização como o objetivo e vocação da sua vida. São numerosos os exemplos, sem exagero.
As perguntas, neste contexto, voltam à tona com toda a força: Onde está hoje a força dos cristãos? Por que eles não trabalham com o máximo de empenho para ajudar ao “mundo” voltar ao caminho certo? Por que o discurso e as palavras não ressoam devidamente na vida concreta da sociedade e não atingem a política, educação, universidades, saúde, costumes, a ética? Por que existe muita omissão e falta de convicção nos cristãos de hoje?
Ou, será, porque a fé cristã não é verdadeira e autêntica nos corações dos que se consideram cristãos? Talvez ela esteja estagnada, formalista e acomodada demais? E a nossa fé? ...
O “eco” dessas perguntas precisa-se repetir muitas e muitas vezes em cada um de nós, cristãos, para percebermos, talvez, a necessidade de votarmos à verdadeira fonte da nossa fé, e novamente dizer ao Jesus Cristo; “Senhor, o que queres que eu faça?”
Precisamos ser justos e reconhecer que existem muitos exemplos de pessoas e comunidades comprometidas com o Evangelho de Jesus Cristo, lutando com fervor pelo Reino de Deus e a sua justiça. São os frutos da fé madura. No entanto, para imprimir na sociedade e no mundo contemporâneo a marca do Amor verdadeiro, revelado pelo próprio Filho de Deus – Jesus Cristo, que é o único caminho da salvação para a humanidade, é necessário o testemunho, a coragem, o engajamento e a fé de todos os cristãos. E a fé tem que ser viva e autêntica!
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O texto abaixo, de Ferdinand Krenzer, traz ponderações finais sobre a questão da fé.
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O conteúdo da fé
Quando se fala sobre a fé que abraçamos, sobre a postura de fé e sobre o processo do ato de fé, torna-se necessário falar também do propósito e do conteúdo da fé. Não basta que alguém creia; deve existir também algo “em que se crê”. Vamos agora, então, considerar o assunto do conteúdo da fé, sobretudo quando se trata de Jesus, porque n’Ele se resume todo o problema da fé.
Quando o ser humano toma conhecimento, e não tem mais dúvida, que na história da humanidade, ou na vida de pessoas concretas, o próprio Deus chama-o e convida ao encontro, ele não pode ficar “em cima do muro” (neutro), ou colocar-se contra Ele.
A quem Jesus encontrou, verdadeiramente, uma vez, esse não pode passar adiante, fingindo que não O viu. Terá que parar em frente dele e decidir. E por quê? Porque encontrando Jesus, o homem vai ouvir uma reivindicação absoluta, acima da qual não existe nada maior, nem mais importante. Aqui, encontra-se a plenitude da verdade, aqui foi pronunciada a decisiva palavra de Deus e definitivamente anunciado o seu direito exclusivo e o seu reinado. Ademais, aqui também ao homem foi oferecida a salvação e o amor abrangente de Deus. Por isso, cada um que procura e pergunta, encontra-se no caminho que leva ao encontro com Deus, em Jesus Cristo. (...)
A fé cristã é inimitável e insubstituível por qualquer outra religião; sim, ela ultrapassa, abrange e complementa plenamente cada religião que existe no mundo. O cristianismo é para todos e oferece a todos - tudo.
Para extrair, apresentar e cada vez melhor entender esta verdade, existe a ciência da fé e a ciência sobre a fé.
A Teologia faz uma cuidadosa ponderação (reflexão) de tudo, o que foi nos dado para crer, e não é intrometida e infrutífera especulação. Ela fala de modo contido e com muita cautela sobre Deus e sobre tudo aquilo, o que Ele nos revelou.
Os dogmas (frases que expressam as verdades da fé) não são nada mais, do que sempre novo e melhor entendimento pela Igreja das verdades reveladas por Deus.
“Mas o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos trará à memória quanto vos disse.” (Jo 14, 26).
A meditação – é o aprofundamento da fé através da própria experiência. Ela leva a pessoa à aplicar na própria vida o entendimento e conhecimento da fé. Uma pessoa quanto mais aprofunda o seu entendimento da fé, passa a pronunciar a profissão da fé com a própria voz, e a cada vez – com as novas palavras.
Viver com a fé
A fé, no entanto, não é apenas um assunto interno da pessoa, a sua coisa particular, mas, ao contrário, ela transparece no seu comportamento diante dos outros. Ela precisa ser consequente, penetrando todo o ser do homem e tornando-se visível nos seus atos. (...)
“Porque quem observar toda a Lei mas infringir um só preceito, vem a ser réu de todos.” (Tg 2, 10). Ela precisa passar de teste na vida cotidiana. Por isso o “sim” que está no ato de fé de uma pessoa não pode ficar só formal ou simbólico, mas deve marcar todas as ações e atividades que fazem parte da vida. Crer não significa apenas reconhecer algo como verdade, não é o “sim” teórico em relação à missão de Jesus Cristo, mas é a forma da vida toda. Nela a teoria e a prática se unem. A fé é a diretriz (Buber) e o caminho ( Brox). Precisa constantemente, durante toda a vida, “estar” experimentando a fé (Hermann). Assim sendo, os cristãos divididos unem consigo duas frases muito discutidas, que na verdade se complementam:
“Pois a justiça nele se revela de fé a fé, conforme está escrito: O justo vive da fé” (Rm 1, 17) e também “Queres saber, homem insensato, como a fé sem as obras é estéril? (Tg 2, 20). Acreditável é apenas o amor (Balthasar).
Resumindo
O homem (também de hoje) pode crer, e isto é algo mais sensato que tudo o que ele pode fazer (Chesterton). Se olhar bem para as “saudades” do coração do homem, ele quer crer (ser homem crente). Ele deveria crer. Ele deve ser o homem de fé, se não quiser perder o sentido da sua vida. O cristão verdadeiro tem que “crer” seriamente, para que vendo a credibilidade da sua existência – o homem descrente e ateu pudesse chegar à fé.
(KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris, Éditions Du Dialogue, 1981, p. 90-91)*
Continua..._________________
*Obs.:Para embasar as minhas pequenas reflexões (simples, diretas e questionadoras) acerca de perguntas que, suponho, perturbam a todos nós, sirvo-me do livro do Ferdinand Krenzer- “Morgen wird man wieder Glauben” e, usando aqui uma edição desse livro no idioma polonês (Taka jest nasza wiara), faço uma tradução livre (para o português) apontando alguns trechos, muito bem elaborados pelo autor. É um prazer seguir o seu pensamento.
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