Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

domingo, 11 de março de 2012

O que é crer?


Existem várias definições e ideias que os homens relacionam com a palavra fé. Muitas delas carregam o peso pejorativo, contribuindo para a desvalorização da fé que as pessoas confessam. Em tempos atuais o principal alvo de críticas e deboches desse tipo, da parte dos céticos e descrentes, é a fé religiosa.

Mas, afinal, o que é a fé? O que significa crer? O que o homem “lucra” com a fé?  Até que ponto o conhecimento adquirido por meio da fé é seguro? O que é a fé no sentido religioso?  Como ela se desenvolve? Por que a fé religiosa torna-se certa e segura acima de tudo?

A reflexão sobre estas perguntas podemos encontrar no texto abaixo, de Ferdinand Krenzer. Uma leitura atenciosa e a interiorização do seu conteúdo, certamente podem nos ajudar a compreender melhor e valorizar muito mais a nossa fé.
WCejnog


(2)
A fé como um tipo de conhecimento

A cada objeto que uma pessoa chega a conhecer corresponde um processo cognitivo específico.  Não  se pode cometer o erro pensando que  somente o conhecimento matemático-natural, que compreende o  conhecimento sensorial dos objetos,  é  o único que permite ao homem um novo conhecimento e entendimento. Mesmo, porque nas relações interpessoais  o conhecimento baseado na fé  tem  o papel  particular.

Olhando para a história do ser humano  chega-se  à conclusão de que somente nesse caminho, onde o conhecimento baseia-se na fé, torna-se possível  o verdadeiro conhecimento.  Também, o  contato íntimo e pessoal  do homem com Deus  só pode acontecer no caminho da fé.
 
O que uma pessoa vivenciou e  experimentou na vida,  as outras pessoas só podem conhecer  baseando-se naquilo o que ela lhes falou e transmitiu. É deste modo que o interior do ser humano se abre.  E,  graças a esse ato de exteriorização, de uma pessoa para outra, ou para  outras, torna-se possível o conhecimento que normalmente não seria acessível.  Admitir a possibilidade de receber as informações deste tipo,  significa  crer. Assim acontece  nas relações educativas pais – filhos, professores – alunos, mestres – jovens  universitários; no processo de formação refere-se à transmissão de dados científicos para os formandos; também aplica-se à todo tipo de transmissão de notícias e informações entre os países distantes, e é inevitável em relação a todas as transmissões históricas.

Dependendo da confiança que uma pessoa  tem na outra, a certeza da fé é maior ou menor.  A maior e a mais bela certeza de um ato da fé humana  o ser humano pode experimentar na amizade e no amor. Aqui realmente um entende o outro,  isto é,  é capaz colocar-se no lugar do outro e, num certo sentido, enxergar com os olhos do outro. A credibilidade  da transmissão apoia-se em confiança, de que esse outro não está errado e não pretende nos enganar. Quanto mais afetuoso e pessoal é este tipo de  relação, tanto maior é a certeza que se pode confiar na outra pessoa.

A fé no sentido religioso

A fé no sentido religioso não é uma simples e formal aceitação das fórmulas catequéticas como verdadeiras, mas um encontro pessoal com Deus.  Deus, que “reina numa luz inacessível”, que “ultrapassa todos os conceitos e esquemas imagináveis”,  assim como  toda a pessoa, Ele tem a sua esfera íntima, tem mistérios, que não se pode conhecer com a razão.  Mesmo quando se torna claro para a mente humana que Deus existe, o homem não vai saber quem é Deus, e não conseguirá saber sobre Ele nada de mais íntimo.  Deus  concebido pela mente humana não seria mais Deus.

Os mistérios de Deus não são  ridículos, ao contrário, são muito pertinentes. Por amor ao ser humano Deus informa-lhe  sobre si mesmo através da Revelação. No ato da Encarnação pronuncia-se o próprio Deus.  Jesus Cristo é a “Palavra de Deus” (Dei Verbum),  através do qual  encontrou-se  fisicamente com a humanidade. Em Jesus Cristo Deus é simultaneamente o objeto da fé e a sua base. Eu acredito em Deus por causa de Deus.  Creio n’Ele, aceitando o que Ele mesmo fala de si mesmo. Creio n’Ele, em Jesus, em Deus Uno e Trino.  “No ato da fé o ser humano percebe a realidade de Deus Uno e Trino” (Josef Pieper).  A profissão da fé é um “creio em Ti” pessoal .  Se quisermos  analisar a fé, não chegaremos  a nenhum resultado.  A fé é algo vivo e escapa do bisturi da razão e da psicologia.

Pode-se aqui, apenas,  capturar alguns momentos individuais. A razão está engajada não menos que a vontade; tenta ao máximo ouvir, saber mais e analisar os mistérios de  Deus. A vontade submete-se às exigências de Deus e tira as conclusões para serem aplicadas na vida pessoal  do homem.  A fé é o conhecimento e reconhecimento. Ela não é o resultado de deduzir – porque  não é possível penetrar na fé e a conhecer  para tirar as conclusões, baseando-se apenas nas próprias investigações,  nem o risco assumido no escuro - porque o homem não se lança cegamente para o abismo do irracionalismo.  


A fé é uma questão do coração.  Entendemos aqui o coração não como lugar dos sentimentos, mas como um centro da pessoa, de onde saem  as decisões certas. Portanto, não se pode, de jeito nenhum, forçar a fé numa pessoa. Na sua essência a fé é Graça. Se Deus não se aproximar do homem, os esforços deste não servirão para nada. Não se pode suscitar a fé por meio do engajamento só do homem, e nem só da ação de Deus. Deus não força a ninguém a ter fé, no entanto começa agir no momento quando no homem surgem as perguntas, saudade e prontidão. Antes de acreditar o ser humano pode apenas estender os seus braços e abrir  seu coração para Deus poder entrar nele. Justamente o símbolo de mãos vazias corresponde à disposição que leva à fé.  Portanto, a fé  é um acontecimento que realiza-se no encontro.  Esse encontro desenvolve-se não seguindo esquema lógico ou psicológico, mas como algo que começa a viver, surgindo de modo milagroso.

Portanto, o processo da fé concretiza-se em etapas, começando no momento quando se ouve e entende (teoria e prática), passando pela determinação e decisão (vontade), e terminando  na total entrega a Deus. E Deus nos encontra  em Jesus Cristo.

Uma fé assim, aparentemente é pouco clara e compreensível  porque ultrapassa conceitos humanos e, neste sentido, continua sendo um risco. Mas justamente por isso decidir-se pela fé é um ato totalmente livre. O ser humano não se sente escravizado, forçado, vencido... Ao contrário, pode abrir-se para uma nova luz, cuja fonte não está mais nele mesmo, no homem, mas em Deus. E Deus  fornece-lhe os “olhos da fé” (Agostinho) com os quais pode enxergar com mais clareza esse mistério, em que se lança com vontade e com o qual se compromete.  Apesar de tão grande  incerteza e a possibilidade de questionamento -  pensando humanamente, a fé é certa acima de tudo, porque não se apoia na sabedoria e na experiência humana, mas apoia-se em Deus, que não engana e não  mente.  “Quem acredita, esse não treme”, esse “tem apoio em Deus”. (...)
    (KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris,  Éditions Du Dialogue, 1981, p. 82-84)*

Continua...
_________________________
*Obs.:Para embasar as minhas pequenas reflexões (simples, diretas e questionadoras) acerca de perguntas que, suponho, perturbam a todos nós, sirvo-me  do  livro do Ferdinand Krenzer- “Morgen wird man wieder Glauben”  e,  usando aqui uma edição desse livro no idioma polonês (Taka jest nasza wiara), faço uma tradução livre (para o português) apontando  alguns trechos, muito bem elaborados pelo autor. É um prazer seguir o seu pensamento.

*****************************

Nenhum comentário:

Postar um comentário