Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Teologia da Libertação em foco. Parte da entrevista com Sergio Torres, o teólogo chileno. Confira para saber mais!


Um depoimento sério e muito competente sobre o tema da Teologia da Libertação (TL) pode servir como fonte de informação e orientação para todas as pessoas que buscam esclarecimentos e a verdade sobre este assunto, a fim de não faltar com a justiça nas suas opiniões.



A entrevista com Sergio Torres, o teólogo chileno, tem este caráter. O blog Indagações traz agora  uma parte dessa entrevista, que foi publicada em outubro de 2011,  no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU)¹.

Uma leitura muito esclarecedora.  Não deixe de ler.

WCejnog


Entrevistas 



"A Teologia da Libertação pode ajudar a interpretar o mal-estar global de hoje". Entrevista especial com Sergio Torres


"Tanto a teologia da libertação, por si mesma, como o Congresso Continental de Teologia de 2012 podem contribuir muito para abordar de uma maneira nova esses novos desafios", que "não foram considerados no Concílio, mas temos as ferramentas que tornam possível enfrentá-los".

Para o teólogo chileno Sergio Torres, o salto qualitativo promovido pela  teologia da libertação foi abrir a perspectiva contextual na teologia. "O contexto – afirma – permite aprofundar alguns aspectos da única Mensagem e torná-la mais credível para pessoas de diferentes culturas". E também agregando outro "lugar teológico": a presença de Deus na "fé que atua pela caridade", especialmente entre os pobres.

Torres é cofundador e membro emérito do comitê coordenador da Ameríndia (www.amerindiaenlared.org), rede de católicos/as do continente americano que, junto a outras organizações como o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, participou da organização e promoção do Congresso Continental de Teologia, entre os dias 8 e 11 de outubro de 2012, na Unisinos, por ocasião dos 50 anos de convocação do Concílio Vaticano II e dos 40 anos da publicação do livro Teologia da libertação. Perspectivas, de Gustavo Gutiérrez.

Por isso, nesta entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, Torres conta os principais momentos da história da Ameríndia e afirma que celebrar essas datas significativas em solo latino-americano é também rememorar os momentos de "grande entusiasmo" vividos pela Igreja continental, que "não só leu e aplicou o Concílio, mas também o reinterpretou a partir da nossa realidade social, econômica e cultural".

Sergio Torres é licenciado em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Chile. Foi professor de teologia dogmática no Instituto Alfonsiano de Santiago. É coeditor de vários livros da Associação Ecumênica de Teólogos do Terceiro Mundo (Asett/Eatwot) e cofundador e membro emérito do comitê coordenador da Ameríndia. Foi vigário-geral da diocese de Talca e atualmente é vigário-cooperador de uma paróquia de Santiago.


Entrevista (parte):
 (Por Moisés Sbardelotto)

 [...]


IHU On-Line – A identidade da Ameríndia  também é marcada pela reafirmação da "opção por novos modelos de igreja comunitária e participativa e pela teologia da libertação como uma contribuição para a Igreja universal". Em sua opinião, quais são as características centrais desses novos modelos de Igreja?


Sergio Torres – A história da Igreja na América Latina depois do Concílio Vaticano II está marcada por períodos de profunda renovação e vitalidade e por momentos de dificuldades, recolhimento e frustração. No momento do Concílio Vaticano II havia na América Latina um grupo muito valioso de bispos comprometidos espalhados por todo o continente. Alguns nomes são lembrados para sempre, por exemplo: D. Hélder Câmara, do Brasil, e D. Manuel Larraín, do Chile. O teólogo José Comblin, recentemente falecido, propôs a chamar esses bispos de "pais da Igreja latino-americana". Esses bispos, com a ajuda de teólogos e agentes pastorais de base, contribuíram para ler o Concílio a partir da perspectiva da América Latina na Conferência de Medellín, em 1968.


A partir de então e durante quase 20 anos, a Igreja do subcontinente experimentou um grande crescimento e vitalidade no povo, adquirindo uma nova identidade. Seguindo Jesus Cristo e com uma profunda fidelidade à tradição eclesial, ela assumiu um novo papel junto aos pobres, deixando de lado a sua posição anterior de legitimar as classes dominantes da sociedade. Junto com isso houve uma profunda renovação da liturgia, da catequese, da teologia, da organização eclesial e da evangelização em seu conjunto, levando em conta as orientações de Medellín e da Evangelii Nuntiandi e, posteriormente, da Conferência de Puebla.


Lamentavelmente, a partir da década de 1980, aconteceu algo inesperado nessa renovada Igreja latino-americana. Produziu-se uma divisão em seu interior entre alguns setores da hierarquia e alguns teólogos com relação à interpretação de Medellín e de Puebla, em particular, quanto à maneira de entender a opção pelos pobres. Algumas pessoas acreditaram que a opção pelos pobres poderia ser interpretada como uma expressão marxista. Essa discussão interna levou alguns setores da Cúria Vaticana a tomar partido e, a partir desse momento, produziu-se um grande distanciamento e desconfiança entre essas instâncias romanas e os setores progressistas do continente.


Um momento importante dessa história foram as duas instruções da Congregação para a Doutrina da Fé, de 1984 e 1986, condenando algumas formas da teologia da libertação. Apesar de as instruções dizerem que se tratava de "algumas formas", os setores mais conservadores consideraram que toda a teologia da libertação estava submetida a suspeitas e, finalmente, condenada. Esse mal-entendido tem estado presente até agora e criou as distâncias e diferenças de opinião e de atitude que impediram uma resposta comum da Igreja aos novos desafios dos tempos presentes. Uma dificuldade séria foi escutar quase exclusivamente a instrução de 1984 e o silenciamento que não permitiu acolher com o mesmo interesse a carta de João Paulo II aos bispos do Brasil, de maio de 1986, em que, depois da primeira instrução, dizia-lhes claramente que "nós e vocês consideramos que a teologia da libertação é útil e necessária".


IHU On-Line – Em 2012, comemoraremos o 50º aniversário da convocação do Concílio Vaticano II, aniversário que também inspira a promoção do Congresso Continental de Teologia. Como essa data pode iluminar a Igreja no contexto atual?


Sergio Torres – A Igreja da América Latina e do Caribe acolheu com grande entusiasmo o Concílio. Inclusive, estava preparada para fazê-lo. Mais ainda, não só leu e aplicou o Concílio, mas também o reinterpretou a partir da nossa realidade social, econômica e cultural. O conceito de Igreja como Povo de Deus foi acolhido com grande naturalidade, pois, nessa época, estava se desenvolvendo a consciência do povo como um ator importante que assumia o seu papel protagônico e propunha grandes mudanças na estrutura da sociedade. A cultura latino-americana, solidária e fraterna, viveu com alegria e entusiasmo a identidade de uma Igreja comunitária, em que bispos e fiéis, na linguagem da época, se sentiam parte de um projeto comum e horizontal de Igreja missionária e renovada.


A história também mostra que, tanto na Europa quanto na América, depois dos primeiros anos de entusiasmo pelo Concílio, surgiram diversas interpretações sobre o verdadeiro significado de seus documentos com as orientações e conclusões pastorais. Na América Latina, também houve um processo de involução e de restauração. Alguns setores consideraram que o Concílio, em alguns aspectos, havia ido longe demais e que era necessário retomar uma linha mais tradicional em vários níveis.


O 50º aniversário do início do Vaticano II é um momento muito oportuno para reler o Concílio. Os grandes documentos, especialmente a Lumen Gentium e a Gaudium et Spes, têm intuições permanentes que são muito pertinentes para a situação atual. O espírito democrático e o desejo de participação exigem uma Igreja comunitária, participativa e solidária. A abertura ao mundo hoje em dia adquire novos aspectos e enfrenta grandes desafios. Há problemas novos que não foram considerados no Concílio, mas temos as ferramentas que tornam possível enfrentá-los. Tanto a teologia da libertação, por si mesma, como o próximo Congresso de 2012 podem contribuir muito para abordar de uma maneira nova esses novos desafios.


IHU On-Line – Em 2012, também comemoramos os 40 anos da publicação do livro de Gustavo Gutiérrez. A partir dessa obra inaugural, quais foram e são as principais contribuições da teologia da libertação no contexto da América Latina? Qual é o significado da "libertação" hoje?


Sergio Torres – O surgimento da teologia da libertação significou um momento importante na história da teologia em geral. Antes disso, considerava-se que havia apenas uma única teologia universal, de acordo com o que diz São Paulo: "Um só Senhor, uma só fé, um só batismo". Sem negar de forma alguma esse princípio fundamental, a teologia da libertação abriu a perspectiva contextual. Cremos em um só Senhor, mas fazemos isso a partir dos nossos contextos e das nossas situações sociais e culturais próprias e diferentes. O contexto permite aprofundar alguns aspectos da única mensagem e torná-la mais credível para pessoas de diferentes culturas. Nascida na América Latina, a teologia da libertação se estendeu para a África e Ásia e, além disso, existem experiências de teologia contextual na América do Norte e Europa.


A teologia libertadora contribuiu com outros elementos para a reflexão teológica tradicional. A teologia refletia sobre o mistério de Deus descobrindo-o nos "lugares teológicos" permanentes como a Bíblia, a Tradição, a Liturgia, o Magistério, o ensinamento dos teólogos etc. A teologia da libertação agregou outro "lugar teológico": descobrir a presença de Deus na "fé que atua pela caridade", especialmente entre os pobres que, iluminados pela sua fé e pelo seguimento de Jesus, lutam pela sua libertação.

O conceito de libertação ampliou-se e enriqueceu-se. Em um primeiro momento, falou-se da libertação dos pobres entendidos como os operários das indústrias e das fábricas das grandes cidades do continente. Posteriormente, o conceito de pobre também foi se aprofundando. Os pobres são os excluídos, os marginalizados, os que não têm voz, os que são discriminados ou, como se diz hoje, "o outro". Atualmente, o conceito de liberação expressa a salvação e a libertação que Jesus nos traz com muitos termos que se referem à salvação de setores postergados e oprimidos, na atual situação cultural e social.


Hoje em dia, não existe uma única teologia da libertação. Há um pluralismo teológico, aberto, mas fiel a algumas intuições e princípios básicos da primeira teologia da libertação. Essa teologia ainda tem muito a dar de si mesma. Por exemplo, deve continuar articulando a contribuição própria e complementar dos teólogos acadêmicos e dos teólogos de base. Além disso, também se pede que os profissionais não falem somente para os pobres, mas a partir e com os pobres.


IHU On-Line – Em um momento histórico de maior democracia e desenvolvimento na América Latina, como o senhor vê a Igreja regional?


Sergio Torres – A história econômica, social e política tem sido marcada por grandes etapas que incluem os processos de desenvolvimentismo dos anos 1950 e 1960, as ditaduras dos anos 1970 e 1980 e a recuperação da democracia no novo contexto da globalização neoliberal. A Igreja hierárquica e a Igreja de base têm estado presentes de formas diferentes nesses processos históricos. Atualmente, dá a impressão de que não temos respostas muito definidas frente aos novos desafios. O que aprendemos com as etapas anteriores não é suficiente para atuar no momento presente. Há desafios novos como os que provêm do crescimento da população mundial, das mudanças climáticas globais e do esgotamento dos recursos naturais que ameaçam a própria sobrevivência da vida no planeta.


A teologia da libertação e a ação social da Igreja se baseiam no protagonismo do povo e em uma teoria social crítica que permita interpretar as causas da pobreza e propor estratégias viáveis de desenvolvimento e de libertação. Ambas as coisas hoje em dia são insuficientes. A mobilização popular é fraca e inorgânica, e não há uma teoria social comum que permita enfrentar o neoliberalismo.


No entanto, há um elemento positivo. A teologia da libertação está mais bem preparada do que outras instituições e ideologias para interpretar o que está acontecendo atualmente com o mal-estar global e os protestos dos "indignados". Esse mal-estar se deve à crise de um paradigma de civilização e exige um novo modelo de sociedade com participação cidadã, regulação e controle da economia financeira. Além disso, seria preciso chegar a ter novos modelos e critérios de governança mundial. Para isso seria necessária uma reforma da organização interna das Nações Unidas.


O Fórum Social Mundial, em suas diversas versões, proporcionou novas ferramentas para animar os movimentos sociais e criar um novo estilo de fazer política. Mas essas inspirações não foram suficientes para criar uma força transformadora e renovadora. Por enquanto, nós, cristãos, estamos chamados a viver o Evangelho em pequenas comunidades e a participar dos movimentos sociais atuais e de outras iniciativas que permitam progressivamente ir abordando os problemas mais globais, tais como as redes sociais da internet.


[...]
_______________________________
¹ O Instituto Humanitas Unisinos – IHU é um órgão transdisciplinar da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS, que visa a apontar novas questões e buscar respostas para os grandes desafios de nossa época, a partir da visão do humanismo social cristão, participando, ativa e ousadamente, do debate cultural em que se configura a sociedade do futuro.
Fundado em setembro de 2001, por ocasião do Simpósio Internacional O Ensino Social da Igreja e a Globalização, o IHU desenvolve sua reflexão e ação a partir de cinco grandes eixos orientadores:
• Ética
• Trabalho
• Sociedade Sustentável
• Mulheres: sujeito sociocultural
• Teologia Pública.


 (Por Moisés Sbardelotto)
  
***********************************





Nenhum comentário:

Postar um comentário