Acho interessante e muito
oportuna a matéria sobre a comemoração do Dia do Índio neste ano (em abril de
2015). É a reportagem de Paulo Victor Chagas, que – na ocasião - foi publicada
pela Agencia Brasil.
Ao meu ver, as opiniões dos
próprios indígenas a respeito da situação dos seus povos e da causa indígena,
como tal, no Brasil, deveriam ser ouvidas por toda a sociedade brasileira. Isso é importante na construção de
uma consciência coletíva baseada nos princípios da verdade histórica, da
justiça e do direito. Só assim será possível reconhecer a necessidade de proteger,
reparar os danos onde isso for possível (por exemplo, na forma de demarcação e
homologação de terras indígenas) e de devolver
o merecido respeito a todos esses povos que foram e são primeiros e legítimos habitantes deste país.
Vale a pena ler!
WCejnóg
19/04/2015
Brasília
Paulo Victor Chagas* –
Repórter da Agência Brasil
Brasil precisa
recuperar orgulho de sua origem, dizem indígenas
Abertura das comemorações do Dia do Índio no
Memorial dos Povos Indígenas
Elza Fiuza / Agência Brasil
Demarcação das terras
indígenas e reconhecimento dos brasileiros sobre a importância dos índios para
o país ainda continuam sendo os desafios principais do Dia do Índio, comemorado
hoje (19).
Representantes dos povos
indígenas que costumam viajar a Brasília para mobilizações e protestos
ressaltam a importância que a data tem para a conscientização da sociedade, mas
alertam que o tema não deve ficar restrito à celebração de hoje.
O cacique Piracuman, da etnia
Yawalapiti, mora no Parque Indígena do Xingu, no norte de Mato Grosso, e
costuma representar os povos do Alto Xingu nos eventos que ocorrem no Brasil e
no exterior. Ele afirma que embora o branco comemore a data no dia 19 de abril,
para o índio as comemorações ocorrem diariamente, a cada trabalho de plantio,
pescaria ou outra atividade, como construção de uma oca (habitação indígena
brasileira).
Apesar de classificar a
comemoração como importante para afastar espíritos ruins e doenças, o irmão do
cacique Aritana, o líder mais importante dos povos do Xingu, explica por que
mais de mil pessoas, representando 200 etnias, vieram a Brasília na última
semana. “Aquele pessoal que estava apontando flechas para a Casa [Palácio do
Planalto] lá era para [todo mundo] entender que o índio está preocupado, que o
Congresso não está olhando para índio. Aquela Casa só está olhando para
progresso, só para desmatamento, plantação, construção de hidrelétrica nos
rios. E os índios, que estão há muito tempo aqui, estão sendo ameaçados”, diz.
Piracuman afirma que as
mudanças do clima já estão afetando as próprias terras indígenas, como a
chegada da chuva fora de época, a devastação de áreas próximas a rios. Segundo
ele, em 2014 um tornado atingiu a região pela primeira vez, danificando casas e
derrubando árvores. “A demarcação é importante não só para nós, é para todos.
Nós conhecemos a floresta muito bem. Ela é para nós um filtro, tem oxigênio,
muitas ervas medicinais. Hoje, os produtores não estão mais respeitando a
nascente. O desmatamento chega até lá. Não deixa nem um pezinho de árvore ali.
Quando seca, começa a faltar água. Gostaria de pedir para os produtores
fazeremr reflorestamento no lugar que eles estragaram”, diz o cacique,
lembrando que há muita soja no estado onde vive.
Álvaro Tukano mora em
Brasília e assumiu simbolicamente neste domingo (19) a direção do Memorial dos
Povos Indígenas. Pertencente aos povos Tukano, no interior do Amazonas, ele
acredita que a homologação de três terras indígenas anunciada pelo governo
federal para esta segunda-feira (20), é um dever do Estado.
“As terras indígenas, ou de
toda a Amazônia, é que produzem evaporação, que distribuem água por todo Brasil
e a América do Sul. Por isso que o papel da [presidenta] Dilma [Rousseff] é
demarcar, homologar, combater a violência. É cumprir as leis internacionais,
não construir as hidrelétricas. É essa a sabedoria que ela tem que preservar”,
defendeu.
Duas terras indígenas serão
homologadas no estado do Amazonas: vão atender a reivindicações dos povos
Kaixana e Mura. Os Arara e Juruna receberão a terra indígena Arara da Volta
Grande do Xingu, localizada no município Senador José Porfírio (PA),
homologação que faz parte do licenciamento para a construção da Usina
Hidrelétrica de Belo Monte. Para Piracuman, o motivo é que parte dos
territórios ocupados atualmente pelos índios será alagada com a ativação da
usina.
“Nós, índios, não esquecemos
onde é nosso lugar tradicional. Os índios não vão esquecer aquilo ali. Eles
podem mudar para onde vai ser homologada, mas um dia ele vai querer voltar pra
lá, onde tem parentes enterrados. A gente nunca esquece”, afirmou o cacique,
que também pede que os profissionais a serem contratados para trabalhar na
Fundação Nacional do Índio (Funai) tenham experiência para lidar com os povos
indígenas e ligação com o meio ambiente.
Daiara Tukano, professora da rede pública do
DF
Elza Fiuza / Agência Brasil
Daiara Tukano, empossada
recentemente como professora da rede pública do Distrito Federal, disse que os
brasileiros precisam se orgulhar da sua origem indígena. Ela é formada em artes
visuais pela Universidade de Brasília e foi admitida em concurso público da
Secretaria de Educação. De acordo com Daiara, há um problema histórico de
legitimidade dos povos indígenas.
Segundo a indígena, os povos
originários do Continente Americano sofrem hoje uma espécie de “apagamento
social”.
E acrescentou: “O indígena é
reconhecido apenas quando mora na aldeia. [Só que] estamos em todos os espaços,
nas universidades, trabalhando nas cidades e também no campo. É importante que
o Brasil recupere o respeito e o orgulho [pelo índio]”, disse.
Após a publicação da
reportagem, o consórcio Norte Energia, responsável pela Usina Hidrelétrica Belo
Monte, contestou a afirmação do cacique Piracuman, afirmando que as
compensações da construção da usina não estão ocorrendo por conta de
alagamentos de territórios indígenas.
“Nenhum centímetro de terra
indígena na região será alagado em decorrência das obras da UHE Belo Monte.
Isso é corroborado pela Funai [Fundação Nacional do Índio] e pelo Ibama [Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis]. Há inclusive
terras que ficam abaixo da barragem, portanto em trecho de alagamento
impossível, conforme documento aprovado pelo Ibama - é o caso dos Arara, da
Volta Grande do Xingu”, esclareceu a assessoria de imprensa da Norte Energia,
por meio de nota enviada à Agência Brasil.