"O que está acontecendo no Iraque ofende gravemente a Deus e à humanidade. Não se porta o ódio em nome de Deus! Não se faz a guerra em nome de Deus!"
Papa Francisco
Mais
um artigo muito importante no momento atual, do monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, em relação à atual situação dos
cristãos no Iraque e na Síria. O artigo foi publicado recentemente também no site do
Instituto Humanitas Unisinos (IHU).
Diante
desse mar de sofrimento e morte de tantas pessoas que ‘banha’ muitos cantos do
nosso planeta ainda hoje, as indagações deveriam estar assaltando-nos em nossa
conciência: Por que isso tudo acontece? Por que o homem faz isso? Por que o ser
humano é tão louco (isso mesmo, louco!) que desperdiça assim a sua vida (que já
é tão frágil e curta) e destroe a vida dos seus irmãos, invés vivê-la em paz,
harmonia e felicidade? ...
Penso
que é muito importante ler esse artigo abaixo (e outros deste tipo) para tomarmos
conhecimento do que realmente está acontecendo
no mundo de hoje, em pleno século XXI. Urge sair do silêncio (sobretudo
pessoas, organizações e governos que representam autoridade e poder) e exigir o fim desses atos e atitudes absurdos, que trazem
tanto sofrimento e morte às pessoas. Nada pode justificar essa verdadeira loucura! Se não for assim, seremos apenas
hipócritas acomodados e egoístas.
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IHU - Notícias
Quinta, 14 de agosto de 2014
O grito dos cristãos e o nosso silêncio.
"Se os cristãos do Iraque se
interrogam, ansiosos, apenas sobre a duração da tormenta que se abateu sobre
eles, nós, cidadãos e cristãos do Ocidente, podemos e devemos fazer algumas
interrogações a mais. Não só sobre o urgente "o que fazer agora?",
mas também e principalmente sobre "como é que isso foi possível?",
pergunta o monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo
publicado no jornal La Stampa, 12-08-2014. A tradução é
de Moisés Sbardelotto.
Segundo ele, "como cidadãos do mundo, aos detentores
de poder político e financeiro, devemos pedir contas de quem e como fornece
dinheiro ou armamentos – ou ambas as coisas – a grupos de fanáticos religiosos,
que, embora lisonjeados no início, invariavelmente acabam se tornando
incontroláveis; podemos exigir explicações dos seus fins estratégicos que não
souberam prever que a pretensão de encontrar e desarmar armas de destruição em
massa usando instrumentos de morte faria surgir instintos destruidores em
massa, mesmo onde estavam em silêncio..."
Eis o texto.
"Aqui todos se perguntam apenas isto: até
quando?" Assim nos dizia por telefone há dois dias o nosso amigo Wisam, monge iraquiano, fugido de Qaraqosh
e refugiado nos arredores de Erbil. Nós, com ele, perguntamos:
"Até onde?". Até quando durará essa tragédia, até que ponto chegará a
barbárie humana perpetrada em nome de um fanatismo religioso?
Depois do massacre de homens, mulheres e crianças
yazidi, alguns deles
enterrados vivos, depois da aventurosa fuga de 20 mil deles das montanhas onde
eram perseguidos, torna-se cada vez mais tragicamente evidente que todas as
minorias religiosas, não apenas os cristãos, correm o risco da eliminação total
na planície de Nínive.
Uma região que, ao longo dos séculos, tinha conhecido a
convivência de etnias e religiões diferentes vê agora sepultada a humanidade
junto com crianças indefesas, depois de ver explodir em uma nuvem de fumaça a
mesquita dedicada ao profeta Jonas, figura venerada por judeus,
cristãos e muçulmanos, lugar de peregrinações sagradas que reuniam crentes de
diversas filiações...
Porém, ali, onde a humanidade parece aniquilada, não
faltam palavras, silêncios e gestos que dizem que ainda existem homens e
mulheres dignos de tal nome: a ajuda recíproca na busca de caminhos de escape
da loucura destruidora e na sobrevivência em condições extremas, a renúncia a
palavras de ódio contra aqueles que dá vazão ao ódio com massacres...
A delegação episcopal francesa que se dirigiu a Erbil
na semana passada ficou atônita diante da emergência humanitária, mas ainda
mais diante do fato de não ter ouvido dos cristãos iraquianos uma única palavra
de ódio contra os muçulmanos: o autêntico crente sabe que abominações cometidas
contra os seres humanos não são e nunca serão gestos admitidos, muito menos
exigidos pela religião.
Mas, se os cristãos do Iraque se
interrogam, ansiosos, apenas sobre a duração da tormenta que se abateu sobre
eles, nós, cidadãos e cristãos do Ocidente, podemos e devemos fazer algumas
interrogações a mais. Não só sobre o urgente "o que fazer agora?",
mas também e principalmente sobre "como é que isso foi possível?".
Não podemos nos esconder atrás da desgastada e covarde pergunta
que muitos fazem sempre aos pacifistas em circunstâncias semelhantes: como é
possível não intervir militarmente contra crimes desse porte? Não importa se
nada foi feito antes para alimentar uma cultura de paz, de diálogo e de
respeito, se foram alimentados os piores instintos, se confiamos em um utópico
equilíbrio do terror: quando a situação fica fora de controle, a guerra parece
a única solução do problema, enquanto quase sempre é a sua causa principal,
mais ou menos remota.
Como cidadãos do mundo, aos detentores de poder político
e financeiro, devemos mesmo pedir contas de quem e como fornece dinheiro ou
armamentos – ou ambas as coisas – a grupos de fanáticos religiosos, que, embora
lisonjeados no início, invariavelmente acabam se tornando incontroláveis;
podemos exigir explicações dos seus fins estratégicos que não souberam prever
que a pretensão de encontrar e desarmar armas de destruição em massa usando
instrumentos de morte faria surgir instintos destruidores em massa, mesmo onde
estavam em silêncio...
E, como cidadãos italianos, devemos perguntar aos nossos
governantes por que a inação do seu agir nessas semanas, assim como nos meses
anteriores, em uma área geográfica crucial não só para os interesses nacionais,
mas também para os equilíbrios geopolíticos mundiais.
Mas a atitude impregnada pelo espírito das
bem-aventuranças evangélicas de que muitos cristãos no Oriente
Médio estão dando testemunho levanta interrogações
especialmente a nós, cristãos: como foi possível que, apesar dos incessantes
esforços já feitos pelo Papa João Paulo II e desde o ataque às Torres
Gêmeas, se alimentou a identificação entre interesses do Ocidente
e interesses da Igreja?
Como é que no início da segunda guerra no Iraque
– depois que uma voz profética e lúcida como a do Pe.
Giuseppe Dossetti já havia alertado em 1990 que, "mesmo
que Saddam Hussein fosse eliminado, o Ocidente
se encontrara diante de um islamismo radical mais difícil de combater e
ideologicamente mais inextirpável" – prelados da Igreja italiana discordaram
abertamente dos sinceros apelos do papa pela paz e preferiram usar tons mais
consoantes com a propaganda em favor da intervenção armada?
E por que nos lembramos das Igrejas perseguidas e dos
crentes de todas as religiões que sofrem com a falta de liberdade religiosa só
quando os horrores superam um limite de não retorno?
Por que não os ouvimos no seu cotidiano, cansativo
confronto com um mundo e uma cultura que não são as do Ocidente
que se autodefine como "avançado"?
Nessas horas dramáticas, urgem ajudas às populações que
veem ameaçada a sua própria sobrevivência, urgem intervenções humanitárias in loco
e a ativação de canais de acolhida e de apoio nos nossos países, mas também
urge a reafirmação de uma cultura da paz, a firme rejeição de qualquer "lado
religioso" que todo fanatismo persegue: como lembrava o Papa
Francisco no dia 11 passado, o que está acontecendo no Iraque
"ofende gravemente a Deus e à humanidade. Não se porta o ódio em nome de
Deus! Não se faz a guerra em nome de Deus!".
Sim, devemos reencontrar a consciência de que, quando se
pisoteia a dignidade humana, se ofende a Deus; quando se invoca a Deus para
fazer a guerra, blasfema-se contra Ele!
Fonte: IHU-Notícias
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