Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Obra de seis dias. Como surgiu o Relato Bíblico da Criação?


Para prosseguir com a reflexão sobre o Relato Bíblico da Criação, apresento, abaixo, mais um trecho do livro de Ferdinand Krenzer¹.  O autor desenvolve a reflexão explicando com muita clareza o esquema usado para compor o relato bíblico: a obra de seis dias. Também é fundamental entender como surgiu esse relato; o que tem em comum com os outros antigos relatos dos outros povos daquela  época e perceber com  nitidez o que o diferencia deles. O tema é amplo, mas aqui o autor consegue abordar esses tópicos em poucas frases. É muito bom.

Para acompanhar com facilidade o raciocínio do autor e aproveitar ao máximo as explicações, é aconselhável  ler desde o início todas as postagens sobre este assunto (começo no dia 01 de maio de 2012). Quem procura entender mais profundamente a sua fé e esclarecer as dúvidas, aqui terá uma grande ajuda.
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Obra de seis dias

Vamos abrir o Livro de Gênesis e começar pelo primeiro capítulo. Notemos logo uma certa ordem, uma clara divisão do relato. Esse mesmo esquema repete-se seis vezes quase do mesmo jeito: Deus disse... e houve... era bom... Deus chamou..., houve uma tarde e uma manhã – primeiro dia... sexto dia.

Entrando mais profundamente no texto descobrimos, que Deus em três primeiros dias criou três grandes esferas através de separação de diversos elementos: esfera da luz – separando a luz das trevas; esfera do ar – separando as águas que estão sub e sobre o firmamento; esfera da terra – separando a terra do mar. Nos três dias seguintes essas esferas foram preenchidas com os seres vivos.  As estrelas foram subordinadas à esfera da luz. O sol foi destinado para governar o dia, e a lua para governar a noite. Peixes e pássaros animaram a esfera do ar. A terceira esfera, a superfície da terra, foi entregue aos animais terrestres e ao homem.

O autor do relato da criação elabora isso de tal maneira que Deus criou o mundo  em dois períodos, cada qual de três dias. Como ele chegou a esse número três? Seria coincidência ou realmente o autor do relato da criação orienta-se seguindo algum plano na construção desse relato? Para os israelitas daqueles tempos o mundo constituía-se de três camadas, uma se sobrepondo em cima da outra, de três andares: mundo subterrâneo, terra e céu. Esse esquema espacial - para o autor do relato da criação - tornou-se um esquema cronológico, o esquema de construção do mundo com suas três camadas,  tornou-se “planilha de construção”  do relato da criação. Duas vezes sucederam-se três seguintes unidades e assim  toda obra foi executada durante seis dias.

Como surgiu o relato bíblico de criação?

O israelita  pergunta  sobre o sofrimento e  a infelicidade no mundo.  Sua convicção religiosa  traz para ele a certeza de que isso não vêm de Deus. Essas coisas são consequência do  pecado do homem. Aqui também acrescenta-se mais uma coisa que o israelita crente experimentou através da história: Javé  não é – como deuses dos povos vizinhos – algum “EL”, algum deus protetor. Ele é Dono, Soberano de todos os homens, é Criador do mundo. Comparando com Ele, todos os outros deuses são insignificantes. Esse pensamento está presente em todo relato da criação,  e emerge do conhecimento religioso, da experiência de Deus, que  o povo de Deus tinha.  De onde, no entanto, surgem essas impressionantes  imaginações, que aparecem no relato bíblico da criação?  Elas foram tiradas dos relatos sobre surgimento do mundo, que existiam nos países vizinhos.

1. O relato fenício da criação


              Os deuses fenícios

No início do surgimento do mundo, segundo Fenícios, existia  caos primário.  Constituía-se ele de dois pré-elementos: agitado e tenebroso ar e  barroso e escuro caos. Esses pré-elementos eram misturados  e  penetravam-se mutuamente. Desses pré-elementos, via sexual, foi gerada a divindade Mot. Nela se encontram todas as outras coisas. Essa divindade tem  forma de um ovo que está se partindo. Da  sua metade superior forma-se o céu, da metade inferior forma-se terra. E depois, do Kolpia - vento,  elemento masculino, e da Baau - sua esposa, noite, foi gerado o homem. Os primeiros homens chamavam-se Aion e  Protogonos.
2.  O relato babilônio da criação
 O Enuma Elish - um poema épico da antiga Babilônia sobre o mito da criação

Assim como na versão fenícia da criação do mundo, também na versão babilônico o início do mundo provinha dos pré-elementos masculino e feminino. Esse par formam Mummu-Tiamat (mar salgado) como elemento feminino e Apsu (oceano de água doce) como elemento masculino.  Esses dois pré-elementos  geraram sobretudo  toda geração de deuses.  A primeira  tábua do relato babilônio da criação assim apresenta pré-início:

Quando em cima o céu ainda não foi chamado,
embaixo a terra não era chamada pelo nome,
e Apsu , seu excelente criador,
Mummu e Tiamat,  genitora de tudo,
suas águas  levavam juntos –
e ainda não se formaram raízes de  caniços, nem arbustos foram vistos, 
quando não existia nenhum deus,
nem o seu nome foi pronunciado, e destinos não foram traçados –
foram criados entre eles os deuses.

(Jozef Bromski. Enuma êlis, Warszawa 1925,   p.19-21.)

Dos dois pré-elementos, Apsu e Tiamat, surgiram os pares de deuses. Assim como os seus genitores, são eles  somente  personificações dos  elementos do mundo: Lachmu (luz) -  Lachamu (escuridão, a mãe da luz), Anszur (universo celeste) – Kiszar (universo terrestre) , Anu (o céu) – Nidymund (terra).
Junto com a criação dos deuses se estabeleceu a paz na terra. Pré-deuses  reclamavam da geração mais nova e decidiram destruí-lo.

Resumindo: o relato da criação apresentado na Bíblia, considerando-se a forma, sem dúvida é parentesco com os relatos fenício e babilônico sobre a criação, mas, quanto ao conteúdo, diferencia-se deles completamente.

Poderemos ver isso analisando o texto bíblico do relato da criação.  (...)

(KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris,  Éditions Du Dialogue, 1981, p. 202-204)²

Continua...
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¹ Ferdinand Krenzer  é um teólogo católico alemão, pastor, aposentado e escritor.
² Obs.: As reflexões do Ferdinand Krenzer fascinam pelo seu jeito simples e direto, e agradam o leitor, ajudando-o a entender melhor o caminho da fé cristã e compreender os temas mais difíceis desta doutrina.
Os textos publicados neste blog são tomados do livro Taka jest nasza wiara, desse autor; uma edição no idioma polonês, do qual faço uma tradução livre (para o português).  O título original: “Morgen wird man wieder Glauben”.

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