Temas diversos. Observar, pensar, sentir, fazer crítica construtiva e refletir sobre tudo que o mundo e a própria vida nos traz - é o meu propósito. Um pequeno espaço para uma visão subjetiva, talvez impregnada de utopia, mas, certamente, repleta de perguntas, questionamentos, dúvidas e buscas, que norteiam a vida de muitas pessoas nos dias de hoje.

As perguntas sobre a existência e a vida humana, sobre a fé, a Bíblia, a religião, a Igreja (sobretudo a Igreja Católica) e sobre a sociedade em que vivemos – me ajudam a buscar uma compreensão melhor desses assuntos, com a qual eu me identifico. Nessa busca, encontrando as melhores interpretações, análises e colocações – faço questão para compartilhá-las com os visitantes desta página.

Dedico este Blog de modo especial a todos os adolescentes e jovens cuja vida está cheia de indagações.
"Navegar em mar aberto, vivendo em graça ou não, inteiramente no poder de Deus..." (Soren Kierkegaard)

terça-feira, 1 de maio de 2012

Relato Bíblico da Criação. Indagações para compreender.


As  postagens (publicações) do blog  INDAGAÇÕES, entre 10 a 27 de abril de 2012, trataram do tema “A grandeza e a miséria do homem”, trazendo algumas importantes reflexões, esclarecendo algumas dúvidas e ajudando na compreensão de alguns pontos mais difíceis da fé cristã. Sobretudo a questão do pecado original (abordada na postagem do dia 18 de abril) apresenta, para muitos cristãos, não poucas dificuldades.  Acredito, que os textos publicados trazem uma preciosa ajuda para quem   busca  compreender melhor as questões citadas acima. 

Mas, as indagações continuam e são muitas!  Por exemplo, uma das grandes dificuldades para muitas pessoas, sobretudo para  adolescentes e jovens que estão estudando as teorias científicas na escola e na universidade, é aceitar o que está escrito na Bíblia sobre a criação do mundo e do homem, sem entrar em contradição com a ciência.  Será que isso é possível?  E os outros quadros, como o pecado de Adão e Eva no paraíso?  Uma interpretação correta ajudará muito em entender a questão do pecado original e o que realmente a Bíblia quer nos dizer.  Então, como  interpretar corretamente esses  textos  bíblicos?

Para dar  continuidade às reflexões trago mais alguns textos de autoria de Ferdinand Krenzer¹, que abordam com maravilhosa simplicidade e competência os temas mencionados acima.

Quem quiser entender melhor os três primeiros capítulos do livro de Gêneses da Bíblia, o que considero da maior importância, encontrará aqui uma grande ajuda. Não deixe de ler.
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Relato Bíblico da Criação

Perguntas iniciais

Podemo-nos perguntar: dispondo do conhecimento científico sobre a origem do universo, daria ainda para acreditar no relato bíblico da criação? Ele fala da criação do mundo e de todos os seres vivos em seis dias. Porém, hoje, para nós não há dúvida de que a criação do universo e do mundo durou milhões e milhões de anos. A idade da Terra é de 5 a 10 bilhões de anos. Os seres humanos apareceram no nosso planeta entre 400 a 500 mil anos atrás. Vários cientistas em suas investigações encontram ainda muitas imprecisões, mas uma coisa está certa: a idade da Terra e da humanidade tem realmente esse mesmo tempo. O que, então, ainda podemos preservar do relato bíblico da criação?

B. Pascal, cientista e filósofo francês do século XVII, diz: “O fim das coisas e a sua origem estão definitivamente ocultos no insondável mistério”.

A realidade do ser é tão profunda que as ciências naturais não têm condições para chegar à sua causa última e fundamental.

Perguntas: De onde vem o mundo? – Para onde vai? ultrapassam o domínio e a competência das ciências naturais. Essas perguntas encaminham a busca de respostas para as ciências humanas, a filosofia ou teologia. O relato da criação e da queda do homem no pecado constituem justamente uma tal resposta filosófica e teológica às eternas perguntas da humanidade: Como e de onde surgiu o mundo? De onde veio o mal no mundo? São perguntas que interessam também a cada um de nós. E quando as fazemos será que simultaneamente não perguntamos também pelo sentido do nosso sofrimento, nossa doença, enfermidade, e até pelo sentido da nossa vida? A Bíblia nos oferece as respostas para essas perguntas, mas somente quando estamos abertos e sem preconceitos, quando queremos escutar e entender.

No entanto, aqui surge algo mais. O relato da criação foi redigido em torno de 2,5 mil anos atrás. Os autores bíblicos pertenciam a outro círculo cultural. Tiveram a visão do mundo basicamente diferente da nossa. Se quisermos entender as suas colocações, precisamos necessariamente entrar em sua situação.

O que nós, homens “contemporâneos”, encontramos, acima de tudo, é uma imagem do mundo “primitiva”. Uma imagem do mundo das culturas mediterrâneas de aproximadamente 600 anos antes de Cristo, surgidas na base de aparências. Naquela época pensava-se que a Terra era um círculo apoiado nas colunas, submergido das águas, que o cercavam de todos os lados. Acima dessas águas e terra estendia-se o firmamento celeste, sobre o qual pensava-se que fosse como um muro permanente. Pois ele precisava “segurar”, acima dele, as águas do céu. Nesse firmamento estavam afixadas o sol, a lua e as estrelas como lâmpadas. Quando abriam-se as barreiras do céu, chovia para a terra. Pensava-se em tudo. Entre a terra o mar e o firmamento celeste encontrava-se o espaço aéreo. Essa concepção do mundo constitui o ‘fundo’ para o relato de criação.

O relato de criação – história ou quadros poéticos ?

Falando aqui sobre o relato, não podemos pensar de que trata-se da descrição do acontecimento, que muito tempo atrás justamente assim transcorreu. O relato de criação não é, portanto, nenhum relatório tipo aquele, que um repórter usa para transmitir  algum evento ou acontecimento. Um leitor superficial  poderia  pensar que o Antigo Testamento é um livro histórico, de acordo com a verdade, que relata os reais acontecimentos. Porém, os pesquisadores contemporâneos  chegaram à conclusão  de que por trás da “história”  encontram-se ocultos outros tipos de conteúdo.

O Antigo Testamento, obviamente, contém também a história no sentido como nós entendemos.  Apresenta, evidentemente, os destinos do povo de  Deus  ou – dizendo melhor – a atuação de Deus em relação ao seu povo durante milênios. A história de Israel propriamente dita começa com a escolha de Abraão, então no  capítulo 12  de Gêneses. Se quiséssemos  dar alguma data, seria aproximadamente no ano 1750 antes de Cristo. Abraão  era, então, o contemporâneo  do Hamurabi – um grande rei de Mesopotâmia  e legislador da região entre dois rios². O autor da história dos Patriarcas, escrevendo aproximadamente  entre ano 500 e 600 antes de Cristo,  podia se basear  nas fontes que chegam, no máximo,  até aqueles tempos.

Ao contrário disso, os 11 primeiros capítulos do Livro de Gêneses não pretendem ser  tidos como história.  Como então, diante disso, precisam ser entendidos?  A obra da criação  foi elaborada servindo-se da forma de relato, para assim expressar as afirmações teológicas.

As perguntas ardentes do povo de Deus

Vamos nos colocar em situação dos Israelitas. Vivem eles – tendo uma forte fé em Deus único  – como um pequeno povo no meio dos povos grandes e poderosos. Esses povos têm cultos maravilhosos, suas religiões constituem  sistemas fechados, oferecendo uma visão completa do mundo. Respondem às perguntas que a vida coloca. O israelita precisa fortalecer a sua posição dentro desse mundo pagão. Também ele tem que  dar respostas para essas perguntas.

1. Pergunta pelo Deus e eleição de um povo

O israelita crente confessa que Deus, Javé, é  o Dono do mundo inteiro. Por que Ele escolheu para si particularmente um  só povo?  O Livro de Gênesis 12,1-3  fala da escolha desse povo pela vocação do Abraão: conforme essa narrativa Israel é um povo de Deus porque o próprio Deus o prepara para si, revela-se para ele e o conduz de maneira singular. Através dele Deus quer  abençoar todos os outros povos. Deus quer preparar a salvação para a humanidade.

Logo, em seguida, surge a próxima pergunta: “Por que Deus precisa, e quer, preparar a salvação aos homens? Será que nós nos encontramos em estado de infelicidade?  Essa infelicidade  veio de Deus, ou entrou no mundo por outra razão?” (Haag).

2. De onde veio o mal que existe no mundo?

De onde veio o sofrimento, a dor, a angústia?  É uma pergunta, que surge em cada pessoa, sobretudo  quando ela mesma experimenta a infelicidade. Para um israelita crente era óbvio que o mal não pode  proceder de Deus. O que procede de Deus, é bom, e tudo que é bom procede de Deus. Esta afirmação revela-se  no, assim chamado, RELATO DA CRIAÇÃO.  O relato da criação  tem como objetivo convencer o homem de uma coisa: Deus é bom. O mal não pode proceder de Deus!  A luz e estrelas, terra e mar, plantas e animais, e também o homem – tudo isso procede de Deus. Tudo  isso é bom, sublinha, vez por vez, o autor do relato da criação. Desse jeito Deus fica livre de suspeita de trazer para o mundo  sofrimento e infelicidade,  morte e dor. Essas coisas têm outra fonte. Elas vêm do homem. Têm origem na revolta do homem contra Deus, vêm do pecado.

3. De onde veio o mundo?

Querendo totalmente livrar Deus da acusação de ter trazido o mal para o mundo, o autor do Livro de Gênesis nos capítulos 1-3  responde ao mesmo tempo à pergunta: de onde veio o mundo.  Como diz o grande naturalista  B. Pascal, as ciências naturais não podem fornecer aqui nenhuma resposta, mas somente a filosofia ou teologia.

Baseando-se no conhecimento religioso do povo de Deus o autor do Livro de Gênesis dá a resposta: tudo veio de Deus. O relato de criação constitui uma ponte entre a época dos Patriarcas, isto é, aproximadamente, no ano 1750 antes de Cristo, e entre o pré-início do mundo e do homem. Se a Sagrada Escritura começasse da vocação de Abraão seria muito insatisfatório. Qualquer indivíduo que pensa poderia perguntar: O que era antes?  O relato da criação e da queda do homem tenta ligar esse tempo com o surgimento do mundo.  (...)
(KRENZER, F. Taka jest nasza wiara, Paris,  Éditions Du Dialogue, 1981, p. 197-202)³.

Continua...
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¹ Ferdinand Krenzer  é um teólogo católico alemão, pastor, aposentado e escritor.

² A palavra mesopotâmia tem origem grega e significa " terra entre rios". Essa região localiza-se entre os rios Tigre e Eufrates no Oriente Médio, onde atualmente é o Iraque. Esta civilização é considerada uma das mais antigas da história.

³ Obs.: As reflexões do Ferdinand Krenzer fascinam pelo seu jeito simples e direto, e agradam o leitor, ajudando-o a entender melhor o caminho da fé cristã e compreender os temas mais difíceis desta doutrina.
Os textos publicados neste blog são tomados do livro Taka jest nasza wiara, desse autor; uma edição no idioma polonês, do qual faço uma tradução livre (para o português).  O título original: “Morgen wird man wieder Glauben”.

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